nós cegamos os vagalumes.

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A luz da cidade
Cegou os vagalumes
Ou os vagalumes
Que nos cegaram?

"Ser ou não ser, eis a questão." Releu a frase impressa novamente. As mãos ossudas seguravam firmemente o papel branco, em frente ao espelho, ensaiando as falas de Hamlet.

Enquanto os monólogos eram proferidos, encarava seu próprio reflexo. Se perguntava muitas vezes se aquilo era realmente necessário, e em todas as indagações a resposta era a mesma.

Não. Não era necessário, mas mesmo assim se submetia àquela vergonha. A cada palavra que escapava dos lábios rachados, um sentimento de sufoco recaia sobre seu peito. Não queria aquilo, mas por questões familiares, tinha que o fazer.

Desde quando era pequeno, lembrava da senhora Jeon contando sobre seu sonho de se tornar uma atriz famosa. As histórias que eram contadas por si para que o filho dormisse durante as noites sempre tinham-na como protagonista indiretamente. Eram utopias em que ela era uma atriz renomada, entregava autógrafos, aparecia na TV e se estressava com paparazzis intrometidos. Lembrava-se perfeitamente do sorriso absorto que ela soltava antes que fechasse os olhos e se entregasse para o mundo dos sonhos.

Sempre esteve explícito que aquele era um desejo que não havia morrido. Quando assistiam doramas, Jeon Nabi mostrava-se sentimental com as atrizes que atuavam. Seu olhar era frequentemente banhado pela melancolia da adolescente que teve os testes negados. Em um desses dias, havia contado para Jungkook sua trajetória no mundo do cinema. Enquanto via o filho brincar com legos no tapete da sala, expunhava toda a linha temporal de quando fazia curtos comerciais até o momento em que não agradava mais os gostos intelectuais dos diretores. Estava velha demais, e a beleza invejável havia de assolado juntamente das oportunidades.

Apesar de tudo, a ambição não havia se esvaído. Havia prometido para si mesma que seu primeiro e único filho realizaria seu sonho. E foi aí que Jungkook nasceu.

Quando o pequeno garoto de olhos redondos tinha três anos, afirmava com convicção que quando crescesse se tornaria um herói, daqueles que vestem máscaras e saem por aí batendo em bandidos. De início Nabi apoiou, naquela época ainda considerava a opinião do filho. Alimentava seus desejos comprando fantasias e vários DVDs de super-heróis, achava extremamente bonitinho o minúsculo homem-aranha que corria pela casa batendo nos móveis. Fingia que eram seus rivais.

Entretanto, com cinco anos seu conceito de herói mudou. Queria ser bombeiro. Salvar vidas e ter uma profissão real.

Em seu aniversário havia ganhado vários carrinhos de acordo com o tema, era extremamente mimado pelos pais. E, talvez, esta tenha sido a profissão que mais pendurou em seus planos, pois pensou em outra somente quando completou quatorze anos.

Mangaká. Desejava ser um criador de desenhos em quadrinhos e se tornar um artista visual. A ideia e inspiração havia aparecido enquanto assistia um dos seus animes favoritos, era apaixonado pelo gráfico. Quando falou para os pais, Nabi não se mostrou feliz com a decisão, já não achava mais adorável os sonhos utópicos do filho e desaprovava qualquer insinuação de carreira longe da atuação cinematográfica. Já haviam perdido tempo demais na brincadeira de profissões, e as chances de Jungkook estavam passando.

O adolescente tentou ir contra, lutando pela vontade efêmera. Gastou todo o dinheiro arrecadado para o novo vídeo-game, fazendo de um novo uso para ele. Comprou os materiais necessários para o novo caminho em sua vida. Lápis, sketchbook, borrachas, lapiseira. Tudo o que foi capaz de comprar com o dinheiro guardado.

Se inscreveu em alguns concursos e frequentemente ia para eventos, e a cada dia que passava tinha a confirmação de que era o que queria. E foi em um desses eventos que a mãe percebeu que estava levando a sério demais o plano de ser desenhista. E como prova que estava contra, jogou todos os materiais de Jungkook fora.

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⏰ Última atualização: Dec 28, 2020 ⏰

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