Prólogo

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          A entrada

     O corretor de imóveis esperava na entrada principal da grande mansão. O pretende à compra já ia chegar. Era um homem simples, pelo carro que dirigia já se podia imaginar que não seria um pretendente à altura. Pouco importa. O corretor urgia a venda da mansão o quanto antes, e foi pensando distraidamente que não se deu conta da chegada do homem. Assis, nome do corretor de meia idade, cabelos pretos castanhos ficando já grisalho nos flancos da cabeça, observava o sol renascer triunfantemente atrás de si. E pela maneira como esquadrinhava o arranhar solar da manha, percebia o quanto a mansão estava deteriorada pela severidade do tempo. 

     O pretendente chegou. Estacionou o carro com cuidado, olhou o relógio para constatar a sandice de horário preterido pelo corretor para aquela visitação: 6h da manhã. Um descalabro marcar horário tão cedo justamente num domingo para visitação de um imóvel.  Mas Eduardo honrou a palavra, até porque disse à sua esposa que a casa estava em plenas condições de habitação, tendo, possivelmente, a necessidade apenas de um reparo futuro. 

       Eduardo Braga, um simples técnico de informática admitido inicialmente na empresa do próprio pai: a JJ TECWORDS, que realizava serviços de eletrônica e informática. Foi cedo que começou a trabalhar, inclusive porque foi pai aos 21, engravidando sua primeira namoradinha. Não era tanta novidade acordar cedo desde que Júlio César nasceu. A vida mudou, as coisas mudaram. 

       O senhor Assis estava aguardando pacientemente. Portava óculos escuros preso ao nariz romano que obteve de herança da modesta família. 

      - Óculos escuros às seis horas da manha? - disse sozinho dentro do carro ao estacionar. 

      ─ Senhor Eduardo - chamou ao estender um dos braços.

     Eduardo saiu do veículo, suspendeu os vidros manualmente com cuidado; o elevador do vidro estava enguiçado e ele não queria passar vergonha na frente do corretor se o vidro despen
casse novamente. Depois de ajustar os vidros, fechou a porta. O corretor mantinha o molho de chaves na mão. Elas cintilavam e tilintavam sinistramente. 

    ─ Um prazer, senhor ... - faltou lhe a  memória o nome do corretor. Que vergonha!

     ─ Assis - disse prontamente o corretor - chamo-me Assis, senhor Eduardo.

     ─ Mas não aceito ser chamado de Dudu - respondeu sorrindo Eduardo. A piada saiu e não brotou, caindo de podre no chão. Assis mantinha o semblante sóbrio, inerte. Não teve graça.

     Só o tempo e a conversação recomporiam a piada sem efeito e o mal estar. Mas Assis não tinha tempo, precisava mostrar a casa o quanto antes. E vendo o corretor parado na entrada, de forma preguiçosa e acomodada, convenceu-se de que exprimia uma pressa disfarçada. 

     Passado sutilmente e parcialmente o mal estar do cumprimento inicial, Assis virou de costas pra rua espetando a chave no buraco da fechadura da enorme porta de madeira.  Ela se abriu, um ruído incrustado de ferrugem pôde ser ouvido de bem longe. Era sibilante, se estendendo, as engrenagens padecendo manutenção há séculos. Ao adentrarem, depois disso, Eduardo constatou como a ferrugem estava capturando todo metro quadrado da grande mansão. Enquanto isso, pensava Eduardo que toda mansão é como uma mulher bonita que ficou velha, porque se pode ver o quanto radiante foi um dia. Mas diferente de uma bela mulher - pensava Eduardo com  mais certeza - uma mansão pode voltar a ser encantadoramente bela, basta um pouco de injeção de dinheiro, capricho e bom gosto.

     ─ Desculpe-me pelo horário tão cedo, senhor Eduardo - disse sobriamente Assis - tenho outros imóveis para negociar ainda hoje. Isso explica a necessidade de marcar tão cedo.

A mansão da rua ao ladoOnde histórias criam vida. Descubra agora