Remediando Passos

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Benjamin

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Benjamin.

Ela não havia mudado. A casa em que moravam cinco anos atrás ainda era a mesma em que ela agora vivia sozinha. Ao menos era o que eu esperava.

Estacionei na esquina. Não queria causar alarde. Na mala, meu diploma, meu sonho. Eu estava pronto para voltar para casa.

Foram cinco anos em que eu a perdi dia após dia. Não nos falamos e nosso último contato foi uma briga. Não houve um dia sequer que eu não pensasse nela e questionasse se eu tinha feito a coisa certa. Não houve um dia em que eu não senti que o mundo esfriava sem que eu tivesse como voltar para o abraço dela.

Naquele dia mesmo, fazia muito frio. O sol estava lá, certamente se perguntando o que eu estava fazendo ali. E eu? Me fazia a mesma pergunta. Eu não a procurei mais. Doía muito.

Doía saber que ela não me amava mais, porque o amor que ela sentia se transformara em ódio. Não tínhamos perdido contato, porque ninguém perde algo sem intenção, e isso definitivamente fora proposital. Cora me excluiu de sua vida e de todos os meios onde eu a poderia ver a distância.

O único lugar que ela não poderia sair era da minha cabeça. Das minhas memórias com ela. Do dia em que nos conhecemos em frente a torre Eiffel. Do dia em que me mudei para a casa dela. Dos dias em que dormi ao seu lado, engalfinhado no lençol cor de rosa, acordando minutos antes do despertador, porque meu corpo sabia que eu precisava observa-la dormir antes que ela acordasse.

Meu corpo sabia que queria ficar e agora se sentia em casa. Um magnetismo impressionante emanava daquela casa, mas o medo do que me esperava me fazia recuar. Era um jogo que eu jogava comigo, de vai e não vai, e eu estava exausto do jogo.

Só que o medo... É uma fonte de energia que não sabemos como acessar. É espontânea e está lá, pronta para ser acionada sem querer. Como ela iria me receber? Qual seria sua reação? Ela estava com alguém? Outro amor morava em sua casa? Em seu coração? Ela tinha filhos?

Cinco anos muda muito as pessoas. Tinha me mudado. No primeiro ano longe dela, doeu cada vez que as nuvens brincaram de formar seu rosto e o oceano o som da sua voz. À noite, eu, que nunca tive sorte, conseguia ver pelo menos uma estrela cadente. E pedia sempre a mesma coisa.

Doía sempre que eu ouvia nossa música. Ocean – Native. Tocava em meus ouvidos todos os dias. Tocava no carro. Tocava no rádio. Ela estava em tudo, e eu não estou falando da música. Era ela. Cora estava em tudo.

"Eu prefiro ver o mar uma vez na vida e sentir falta dele pelo resto dos dias, do que nunca sentir a areia embaixo dos meus pés descalços e nunca ouvir o som das ondas quebrando".

Era o que a música falava. Irônico era pensar que era exatamente o que estávamos fazendo. Vivemos o máximo que podíamos naqueles meses, aproximadamente oito, e agora eu sentiria falta pelo resto da vida. Mas eu não podia deixar de sentir a areia e ouvir o mar. E meu mar, nessa história, era meu sonho, era um divisor de águas entre minha vida profissional medíocre naquela cidadezinha que tudo o que tinha de bom era ela, e a vida que eu sempre desejei alcançar.

No segundo ano, eu venci meu ego. No começo eu não tinha coragem de procurar saber da vida dela. Se ela estivesse namorando, o que seria de mim? Os primeiros meses foram os piores. Mas no segundo ano, já havia se passado um tempo. Eu estava melhor. Quase curado.

Mas não encontrei nada. Só a Cora que eu conhecia. A foto que eu havia tirado ainda estava em seu perfil no Instagram. Não pude deixar de pensar que ela havia me superado, já que eu conseguia achar todos os seus perfis sem problemas.

Cogitei até mandar mensagem. Mas ela havia me bloqueado em tudo, então agora que ela havia desfeito isso, eu não iria dar motivos para que ela fizesse de novo. Algo nisso me fez sentir conectado com ela de novo e foi bom. Me fez sentir vivo. Eu quase consegui sentir o calor da cama enorme que eu a fiz comprar.

No terceiro ano, eu esqueci. Eu mudei minha vida. No quarto ano, só lembrei dela algumas vezes. Mas no último ano eu não pude deixar de pensar que eu estava voltando para casa.

E apesar de todo esse tempo, eu me encontrava agora no ponto inicial da minha jornada: em frente a casa dela.

Antes que eu atravessasse a rua e batesse à sua porta, ela abriu. Cora desceu os dois degraus, pegou o jornal do chão e quando se levantou, seus olhos passaram pelos meus. Entrei em pânico. Eu sempre sabia o que fazer, mas não agora, não ali.

Eu quis correr, mas o tempo para isso havia passado. Seus olhos pararam bem nos meus e seu rosto não demonstrou nada. Nem surpresa, nem felicidade, nem raiva.

Eu não esperava amor, mas certamente não estava pronto para indiferença.

As mãos que eu enterrei nos bolsos da calça jeans estavam imóveis, os dedos congelados. Os olhos, sem piscar. Alguns carros passaram na rua, escondendo seu rosto por milésimos.

Ela tinha mudado o cabelo. Não era mais o cabelo longo e loiro que eu conheci. Ela havia cortado na altura dos ombros e pintado de castanho. Combinava mais com ela. Parecia mais madura.

Ela também não se moveu, só deixou que seus olhos azuis pousassem em mim e ali ficassem, vagando. Eu me afogava nela sem ao menos estar ao seu lado.

Cinco anos de espera e ali estávamos nós, parados, como se o relógio do universo, aquele que controla o tempo, estivesse quebrado. O mundo não girava, mas os carros cruzavam a rua que me separava.

Estávamos o mais próximo que jamais estivemos nos últimos cinco anos. E a distância de um oceano parecia menor.  

Nada Além de MimOnde histórias criam vida. Descubra agora