Nada Além de Mim

Eu Não Conheço Você

Benjamin.

Em um dia eu havia descoberto que a mulher que eu amava nunca me perdoou, que eu tinha uma filha de cinco anos e que as duas estavam em uma família com o meu melhor amigo.

Eu queria sumir. Queria fechar os olhos e nunca ter voltado. Talvez fosse melhor viver na dúvida do que enfrentar aquela realidade. Mas o motivo de tudo aquilo valer a pena estava sentado com as perninhas cruzadas, os grandes olhos azuis me encarando e o cabelo castanho na altura do ombro balançando com o vento que entrava pela porta que eu havia encontrado aberta.

Por mais que meu primeiro instinto fosse perder o controle, eu tinha jogado para segundo plano, involuntariamente, a visão de Alex e Cora.

Me aproximei devagar e me abaixei na altura dela.

-Clara.

Ela puxou um fio de cabelo meu enquanto eu tentava não chorar. Aquela era minha filha. Minha. Eu tinha uma filha e ela era tão linda...

O sentimento que me tomou quando eu a vi foi de uma paz que não existe em nenhum outro lugar. Finalmente eu entendi o que meus pais queriam dizer com "um amor como nenhum outro".

Eu amava Cora, mas eu consegui ir em busca de um objetivo maior do que esse amor. Só que eu jamais poderia ir embora de novo. Se eu soubesse, eu teria mesmo abandonado tudo para ficar com elas.

Eu trocaria tudo, da viagem até o diploma, o emprego e o dinheiro, tudo! Tudo para ter visto minha filha nascer. Tudo para não ter perdido os últimos cinco anos.

-Papai.

Se me restava algum autocontrole, ali ele foi embora. Escorreu da chuva que meus olhos insistiam em evitar, sem sucesso.

-Hey.

Encarei ela por alguns segundos infinitos.

-Você puxou os olhos da sua mãe.

-Mas tenho o seu cabelo. – Argumentou.

Ela puxou novamente um fio de cabelo meu. Clara estava certa. Nossos cabelos tinham exatamente o mesmo tom.

-Nós vamos sair?

Eu olhei para Cora e Alex atrás de mim.

-Vamos, vamos sim, filha.

A palavra ainda soava estranha. Filha. Era doce de dizer, mas era estranho. A boca formigava, mas eu não hesitava. Em segundos meu mundo se transformou e essa era uma nova característica minha. Eu era pai.

-Mas antes eu preciso falar com a sua mãe e...

Quem era ele agora? Há cinco anos Alex era meu irmão, agora ele seria padrasto da minha filha? Como foi que isso aconteceu?

-Alex. Esse é o Alex, papai.

-Alex.

-Eu vou pegar um casaco.

Clara subiu as escadas com a agilidade de uma criança de cinco anos. Esperei que ela fechasse a porta do quarto.

-É por isso que você não queria que eu entrasse.

-Ben, eu não menti para você.

-E eu estou cansado de você dizer isso! Qual vai ser a próxima surpresa? Vocês dois tem outro filho? Querem que eu seja padrinho de casamento?

-Ben... – Começou Alex.

-Você cale a boca! Clara é minha filha e você não tinha o direito de me esconder isso.

-Eu sinto muito, Ben, não era uma decisão minha.

-Mas foi uma decisão sua quando você parou de ligar? Foi por isso, não foi? Você não queria correr o risco de dizer ao cara que te chamava de irmão que não só você estava com a namorada dele como também criaria a filha dele.

-Ex-namorada! – Argumentou Cora. – Você me deixou, Ben.

-Não quer dizer que eu não te amava.

-Isso não importa se você não estava aqui.

-Então você decidiu que seria melhor casar com o meu melhor amigo e que ele seria um pai melhor para a minha filha do que eu.

-Não foi assim...

-Não me importa como foi, Cora. A verdade é essa. E tem mais. Eu vou ficar na cidade. Ou minha filha vai morar comigo, ou eu venho morar com ela. E eu não dou a mínima se vocês estão noivos, porque até onde eu sei, os dois são traidores, e eu não tenho compaixão por esse tipo de gente ou pelo relacionamento deles.

Ouve silêncio.

Clara sorria alegremente na porta do quarto balançando o casaco.

-Podemos ir, papai!

Sorri para sua felicidade. Mas antes de sair eu não podia deixar de dizer.

-Vocês dois se merecem.

-Eu sinto muito que as coisas tenham acontecido do jeito que aconteceram, Ben.

-Alex. Eu não conheço mais você.

Peguei minha filha no colo e deixamos a sala.