Quarto Ato, Cena II

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Atenas; um aposento na casa de Pedro Cunha.

Entram Pedro Cunha, Flauta, Chaleira e Famélico.

Cunha – Mandaram alguém à casa de Fundilho? Ele já voltou?

Famélico – Ninguém tem notícias dele. Uma coisa é certa: ele foi transportado.

Flauta – Se ele não aparecer, a peça está arruinada. Ela não poderá ser encenada, não é mesmo?

Cunha – Fica impossível. Não há um único homem em toda a Atenas capaz de interpretar Píramo como ele.

Flauta – É verdade. Ele é simplesmente a melhor cabeça dentre todos os artesãos de Atenas.

Cunha – E também o mais bem-apessoado. E tem aquela voz aveludada, perfeita, a voz de um tratante.

Flauta – Você quer dizer a voz de um amante. De um tratante, que Deus nos proteja, queremos distância.

Entra Justinho, o marceneiro.

Justinho – Mestres, o Duque vem chegando do templo, e tem mais dois ou três cavalheiros e damas casados. Se nosso divertimento tivesse sido encenado, agora estaríamos feitos.

Flauta – Ah, Fundilho amável, bom companheiro! Assim ele perde uma pensão vitalícia de seis pences por dia. Ele não escapava desta, seis pences por dia. Se o Duque não garantisse a ele seis pences por dia por representar Píramo no palco, podiam me enforcar. Ele teria feito por merecer: seis pences por dia, por Píramo, ou nada feito.

Entra Fundilho.

Fundilho – Onde está essa rapaziada? Onde estão esses corações valorosos?

Cunha – Fundilho! Ah, que dia mais cheio de bravura! Ah, que hora tão feliz!

Fundilho – Mestres, estou pronto para discursar maravilhas. Mas não me perguntem quais, pois, se eu lhes conto, não sou mais um verdadeiro ateniense. Vou contar-lhes tudo, exatamente como tudo se procedeu.

Cunha – Então vamos ouvir, amável Fundilho.

Fundilho – Nem uma palavra sobre mim. Tudo que lhes digo é que o Duque terminou de jantar. Peguem seus trajes, vejam que as barbas fiquem bem-atadas, ponham fitas novas nas sapatilhas; vamos nos reunir logo em seguida no palácio. Cada um repasse sua parte, porque a história toda é o seguinte: a nossa peça está na preferência. Em todo caso, que Tisbe tenha roupa de baixo limpa. E que não apare as unhas quem está representando o leão, pois elas precisam destacar-se, como se fossem as garras da fera. E, meus queridíssimos atores, não comam cebola nem alho, pois estaremos pronunciando dulcíssimas palavras. E não duvido que os ouviremos dizer "essa é uma doce comédia". Chega de palavrório. Embora! Vamos, embora!

[Saem.]

Sonho de uma Noite de Verão (1605)Onde histórias criam vida. Descubra agora