Socor-!

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O Sr. vem me visitar hoje, Sr. Madison.

Me pergunto o que tanto busca com esse olhar cândido, essas perguntas insossas, sem sabor.

Mas por algum motivo sinto-me honrado com a sua presença. Você é a minha receitada salvação, meu informante mais confiável, a luz que me vem fazer companhia neste túnel pouco iluminado.

Eu mal acordei, meus pensamentos me levam a você. Você. Onde está você? Já deveria ter chegado.

O Sr. vem me visitar hoje, Sr. Madison.
Eu mal posso esperar.

Ouço passos pelo corredor, se aproximando com receio, passos pequenos como os de um rato metido a profissional.

Finalmente, aqui está você. Senti falta de uma presença viva neste quarto tão mórbido.

Infelizmente, você não parece corresponder a minha gratidão.

Não, seu olhar mudou. Seriam essas olheiras? O Sr. tem passado noites em claro? Não o culparia por estar perturbado, todos ficam. Todos questionam, todos enlouquecem.

Para o Sr. eu sou como descascar abacaxi. Você tem a faca e o queijo em mãos, o papel e a caneta. A caneta. Sua mão é ágil com a caneta. Me pergunto o que você escreve. Parece distante, perdido, o que está fazendo?
Estaria desenhando, talvez? Rotas alternativas para caso quiser fugir, para me impedir de fugir, ou simplesmente o que deseja para o jantar. Provavelmente cortará um queijo branco, se sentará no sofá e contemplará a vista de seu pequeno apartamento. Pequeno. Você é tão pequeno, Sr. Madison. Caberia na palma de minha mão como um morango. Um morango corado às maçãs do rosto.

Rio silenciosamente, você me levanta o olhar. Aquele mesmo olhar avermelhado, suave como pêssego, versátil como limão.

Você teme a minha ou a sua perda? Por que não me dirige mais palavras? Fiz algo? É porquê não me quer como paciente?

Bem, sinto pouco, querido. Se você se for, estarei logo atrás.

"Como foi o dia hoje, dileto, James?" Começa Thomas, o observando de perto "Fora um belo dia? Ensolarado, talvez?"

James arqueia uma sobrancelha. Dileto?

"Está se sentindo bem, Thomas?"

"Sentiu o aroma das flores?" Interrompe "O calor do sol acariciando-lhe a pele?"

"Jefferson?"

"Sim?"

"Ainda está de dia"

Thomas dá uma risadinha desembaraçada.
"Enquanto a luz poder iluminar, será sempre dia"

James não o conseguia decifrar. Se ajeitou no assento e virou a folha do bloco.

"..Thomas?"

"Sim, Mr.?"

"Pode chamar-me James, por favor"

"Como quiser, querido"

"James."

"Claro, James, querido"

Suspira.

"Não vou mentir, estou preocupado com o Sr."

"Jura?"

"Certamente" Aponta o estagiário, enquanto ajeita os óculos sobre a ponta do focinho "Disseram que não tem se alimentado adequadamente, somente aceitando a água..Quer me contar o que há de errado com a comida?"

O paciente hesitou por um momento, mas quis contar mesmo assim.

"..Está envenenada"

"Está envenenada?"

"Lógico. Você não vê? Eu sou o próximo, depois de tanto tempo aqui, é a minha vez. Todos me querem vivo, o que é pavoroso"

James inclina a cabeça, confuso.
"..Primeiramente, quem seriam todos?" Percebe uma tênue náusea em Thomas "Está com fome?"

Ele parece surpreso.

"..Você precisa me ajudar"

"Farei o possível, acredite"

"Pode ser desafiador"

"Gosto de desafios" Thomas o encara entusiasmado "..Sr.?"

Não pode acreditar no que ouve. A voz dócil feito mel, a que o acordou de seus pesadelos, seus devaneios. Ali estava ele. O havia encontrado.

"Eu pensei que estivesse alucinando..." Sorri com o canto dos lábios, secos "É você mesmo"

James o olha confuso, se sentindo preso a cadeira.

"...O que sou?"

Thomas, aos poucos, relaxa no assento, sentindo o corpo enfraquecer. Está caindo, mas não tem medo, isso não tardaria a ocorrer uma hora ou outra. É natural, do ser humano.
Sente o peso na mente, peso quase tão insuportável quanto o das costas.
Culpado, condenado.
Olha uma última vez para o borrão em que se tornou Mr. Madison. Solta um suspiro libertador, uma mistura de alívio e exaustão:

"..Você é o sacrifício" Sussurra Thomas, segundos antes de cair da cadeira, desmaiado.

...

"..T-Thomas?" Chama a voz trêmula, quase miúda.

Pode estar desmaiado, mas sabe que está no chão. Conhece cada um desses azulejos como eles nunca o conheceram.

James se ajoelha. Põe a mão sobre seu rosto pálido, sente medo. Sente, pode sentir.

Oh, olá, Sr. Madison.

Posso sentir sua mão por meu desfiladeiro.
Meus olhos estão fechados, mas eu o vejo. Eu o vejo sempre. Você é como um monstro paralítico, mal-ajambrado, dotado com um belo par de olhos de vidro, portas da alma. Você é perfeito.

Não entendo
Você deve pensar, novamente com aquele aspecto sensível e infante de sempre.
Foi tão de repente..Estávamos indo tão bem!
Reflete, inconformado. Pensa, pensa demais.

Vamos, antes que seja tarde, querido.
O tempo está passando e, creia quando digo, não quero ter de te machucar. 

Como posso explicar-lhe o que sinto, Dr.?
Eu só quero que você abra aquela porta.
Abra aquela porta, prisão infernal que tem me mantido engaiolado por tantos anos. Abra-a. Abra-a, como abriu o portão de entrada, como abriu a porta para a sala de impressão, da enfermaria, do banheiro de seu pequeno apartamento.

Eu o ouço. Eu o vejo.

Sr. Madison tropeça nos próprios pés, vai até a porta.
Está perto, prestes a pedir por socorro.

Tarde demais

Jeffmads (Yandere! Thomas Jefferson) Onde histórias criam vida. Descubra agora