New Jersey. Tarde da noite. Outono de 1960.- Não me diga - falou Madeline Elliot, fechando a porta do quarto atrás de si - que você está mais uma vez olhando para esse card do Capitão América.
Paedra Coulson, sua melhor amiga, lançou-lhe um olhar aridez por cima do objeto.
- Como sabe que é dele? Pode muito bem ser de outra pessoa.
- Seus olhos estão cintilados. E você está sorrindo feito uma pateta.
Paedra soltou um risinho furtivo, virando-se para a amiga que deitava-se ao seu lado na cama de casal.
- Viu só? - Madeline cutucou seu braço. - Eu tenho razão. Você sempre fica assim quando vê algo sobre ele.
Apesar de seu tom repreendedor, percebera que Maddie estava sorrindo. Sabia que não havia nada de que a amiga gostasse mais do que implicar com ela. Com gentileza, é claro.
- Você acredita....- Paedra fez uma pequena pausa, e Madeline soube, pelo seu olhar embargado, que a amiga não estava mais no mesmo quarto que ela, mas num dia distante de meses atrás, vendo uma matéria sobre o Super Soldado pela primeira vez - que existe amor à primeira vista?
- Não. - disse enfaticamente, arrancando-lhe um olhar mau-humorado. - Mas mesmo se acreditasse, você nunca sequer viu o cara de verdade.
- Ah, Maddie... tem coisas que o coração simplesmente sabe. - deu de ombros, distante.
- Você está parecendo as fãs do Elvis Presley.
Paedra batera nela com uma almofada rosa.
- Não seja cruel.
- Eu não sou! - protestou, mas ambas estavam rindo.
De fato não era. Para falar a verdade, tentava ser gentil quando os sentimentos da melhor amiga estavam em jogo.
Mas...Paedra podia ser a garota mais astuta, corajosa e valente da sua idade, e, Deus sabe o quanto Madeline a amava, mas aos 13 anos (quase 14, na verdade) estava um pouquinho velha demais para sucumbir-se a devaneios tão néscios e patéticos.
Como Paedra havia crescido em uma família repleta de personalidades intransigentes, era de se supor que herdasse uma aura mais rígida e cínica. Talvez puxar os nervos de aços da mãe, ou a postura exigente e coerciva do pai adquirida após anos no exército - e recentemente na S.H.I.E.L.D - entretanto, ela não podia ser mais doce, divertida e absurdamente romântica. Tão teimosamente fiel à sua própria natureza em meio a uma família dominante.
Madeline suspirou, enfiando-se embaixo dos cobertores.- Você sabe que eu te amo...
- Nunca vem coisa boa depois disso - fez uma careta.
-... mas não acha que não é hora de abandonar esses sentimentos... impossíveis? - um lampejo zombeteiro perpassou pelos olhos amendoados - Não me olhe assim! O homem está morto! Se quisesse se apaixonar realmente, teria notado alguns caras vivos.
Paedra lançou-lhe um olhar vagamente irônico. Desviou a atenção para a janela aberta de seu quarto em frente a cama, desfrutando do frescor da brisa noturna que repercutiu no cômodo.
Não era que não quisesse se apaixonar. Na verdade, suas amigas falavam com tanto fervor sobre suas paqueras, que a ideia a agradava tanto que soava terrivelmente injusto ainda não ter sentido nada por alguém. Bem, pelo menos por alguém vivo.
Também fora observado - além de ter uma tendência a cativar-se por figuras falecidas - que passava tempo demais com seus livros e arrancando do pai histórias repletas de perigos e bravura.
Se lhe permitissem, ela desfrutaria a maior parte do tempo lendo e sonhando com as aventuras do pai.Paedra não podia se importar menos com as explicações de sua mãe sobre como administrar uma casa, com o quanto de delicadeza aplicava-se ao passar roupas, ou quanto de comida a despensa necessitava para abastecer um marido e filhos. Interessava-se muito mais por aventuras, romances e história.
Tudo isso a embarcava em longos voos da imaginação, durante os quais ela passava horas diante de uma janela sem ver o mundo real. Vivendo aventuras exóticas, lutando contra alienígenas, navegando por oceanos longínquos e procurando tesouros em ilhas tropicais.
E havia cavalheiros atraentes nos sonhos de Paedra, inspirados por histórias de grandes heroísmos e objetivos nobres.
Esses homens imaginários - ou mortos - eram tão mais interessantes que os comuns. Falavam palavras bonitas, eram ótimos em lutas, duelos, e faziam as mulheres desmaiarem com seus beijos arrebatadores.Em seu mundo perfeito, o Capitão América apareceria em seu socorro quando ela estivesse em apuros. Lhe pegaria nos braços, carregaria-a para longe dos malfeitores em uma postura heróica, viril, inabalável. Nisso, ele olharia em seus olhos, e, com uma ensurdecera explosão atroz ao fundo, lhe tomaria em um beijo sôfrego e avassalador. Como um amante ávido.
É claro que Paedra não era tão sonsa ao ponto de pensar que algo remotamente parecido sequer aconteceria com ela. Mas, tivera de admitir, que com todas essas imagens românticas na cabeça, os homens reais pareciam terrivelmente... insípidos.
Suspirou, voltando-se para amiga. Já era uma tradição Madeline dormir, pelo menos uma vez na semana, em sua casa. Ambas perdiam-se em conversas triviais até altas horas da madrugada, movidas pelos assuntos que só a vida de adolescentes poderia trazer.
Mas, naquela noite em questão, Paedra se sentia... diferente.
Ela queria mais. Queria mais do que fofocar sobre Patricia Mends estar ficando com mais um garoto do colégio, em como o professor Sr.Sfild ficava péssimo com aquela grava borboleta, ou qual novo sabor de milkshake elas iriam experimentar no dia seguinte.
Ali, vendo-se refletida nas íris da sua amiga de infância, na casa na qual fora criada, Paedra temera pelo seu destino. Temera por ter de seguir os passos das mulheres que conhecia. Por ter de torna-se esposa, dona de casa e mãe. Por seus assuntos com suas amigas reduzirem-se a qual novo tecido comprariam para os filhos, qual novo bolo preparariam para o marido, reclamar em como o cachorro fazia sujeira e quão exorbitantes eram os preços do açougue.Ela não queria nada aquilo. Queria ser heroína igual aos livros que lia. Queria viver aventuras perigosas e poder sobreviver para contar histórias. Queria se apaixonar perdidamente por um herói e viver um amor causticante.
E ali, desviando o olhar para o teto, Paedra jurou que faria tudo àquilo e muito mais.
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Timeless - Capitão América
RomancePaedra Coulson sempre preferiu aventuras e perigos a qualquer destino de uma mulher dos anos 70. Liberal para sua época, não se deixa abater pelos tabus impostos pela sociedade - e muito menos pelas regras incabíveis de ter de ser uma dona de casa...