VOCÊ NÃO É UM LIXO

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Nina olhava para o celular com cara de desânimo. Aquela expressão desoladora vinha do fato de que ela  não conseguia apertar o botão verde enorme na tela do telefone. Uma ligação que precisava ser feita. De qualquer forma não havia tempo para aquilo, os clientes a esperavam, entre eles, Sadboy e sua namorada de cabelo rosa. 

Sadboy demonstrava estar  apaixonado por aquela mulher com olhares e carícias, nem parecia que a havia traído aceitando um boquete de Nina no estacionamento da faculdade semanas antes. 

- Não sei por qual motivo você quer dar para esse otário, mas você devia fazer isso logo e parar de se torturar - reclamou a voz. Aquela coisa na cabeça de Nina realmente parecia irritada com aquilo. Era como se ambos sofressem com aquilo juntos. 

Atrás do balcão, Nina caminhou até o computador. Queria colocar uma playlist no spotify para usar como música ambiente na loja. Ela clicou no link que dizia "Músicas de Anime" e imediatamente começou a tocar Unravel. 

- Eu sei o que você está pensando, sempre sei, então vou ser direto, você não é um lixo - disse a voz com um tom gentil. 

Sadboy e  sua namorada de cabelo rosa se aproximaram do balcão. Nas mãos, a menina tinha um livro. "Somos Todos Feministas" , era o que estava escrito na capa.  

- Bom dia! Custa cinquenta e cinco reais - disse Nina com um sorriso no rosto e depois completou. - Como vai a vida, Sadboy?   

- Eu vou bem - respondeu. A garota que estava ao lado dele apenas riu enquanto pegava o dinheiro da mochila e entregava a Nina. 

Após o fim da transação  o casal foi embora sem dizer qualquer coisa a mais. 

Nina passou o resto do dia se revezando entre olhar para o celular, criar coragem para realiza um telefonema e atender os clientes.  Era dia de movimento  alto. Isso era comum em início de ano. Os universitários vão aos sebos em busca de livros mofados usados que custem mais barato. Eles simplesmente ignoravam o fato de que muitos desses livros comprados em sebos estão com informações desatualizadas. 

Ela sentiu uma ponta de felicidade ao observar o relógio da loja e perceber que estava na hora de abaixar as portas e sair de trás daquele balcão. Havia apenas um destino ao qual ela estava interessada após seu encontro com Sadboy: 

O Bar. 

O lugar em que Nina costumava beber tinha uma cara suspeita. O chão com um piso de cimento batido e um mostrador de alimentos com salgados e doces de cores que não soavam comestíveis, mas as pessoas comiam mesmo assim. Ela foi até o balcão e comprou uma carteira de cigarros, dessa vez decidiu investir um dinheiro a mais em uma marca cujo gosto não lembrasse infecção por ebola. Também pediu uma cerveja que  veio quente, mas ela não se importou. 

 Já devidamente sentada em sua mesa, ela acendeu um cigarro,  algo que era possível pois uma das vantagens de frequentar locais vagabundos é poder fumar dentro do estabelecimento sem que qualquer pessoa reclame. Mais uma vez repetindo o gesto que realizou durante todo o dia ela tirou o celular do bolso, mas não conseguiu ligar. Ela encarava aquele número como se fosse a coisa mais assustadora do mundo enquanto esvaziava a garrafa de cerveja que estava diante dela. 

Depois de uma hora e três garrafas vazias depois, enviou uma mensagem. 

"Oi! Preciso de ajuda. É urgente, a voz está mais forte" dizia. 

Ela apertou o botão de enviar. Nas mãos havia um tremor de nervosismo e medo no que estava fazendo, mas ela precisava agir. Temia se perder. Não saber mais diferenciar ilusão de realidade. E se ela perdesse o juízo de vez e começasse a vagar pelas ruas como uma mendiga? E se ela deixasse de ser ela mesma? E se ela machucasse alguém? Eram tantos medos que não cabiam em uma mensagem de texto.  

Precisava de ajuda.

- Eu não estou aqui para fazer nada de ruim a você - falou a voz com tom de mágoa. - Embora ache que a gente deveria dar um fim nesse desgraçado do Sadboy que tá fazendo você sofrer. 

Nina levantou e caminhou até o corredor escuro que levava até os. Embora bêbada, estava lúcida. Ela parou diante da porta do banheiro, que estava ocupado e esperou até sair um homem  de dentro. 

- Esse vai servir - ela disse para si. Empurrou o homem para dentro do banheiro e o beijou. 

- Ao menos faça esse cara te chupar! - disse a voz. 










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