A SENSAÇÃO DE QUE ALGO FALTAVA

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Nina odiava restaurantes de shopping. Estava sempre lotado, o barulho era inacreditável e a comida sempre parecia ter sido requentada em um micro-ondas. Mas lá estava ela, Em um restaurante de shopping. 

Se perguntava se era aquele ambiente que estava lhe causando  a sensação de que que algo faltava. Tinha um buraco na mente dela, mas não sabia que diabos era aquilo

Ela caminhava em direção a uma pessoa. Talvez a única pessoa no mundo que poderia oferecer alguma ajuda. Bem, não era como se tivesse mais alguém. 

- Oi - disse Nina. - Obrigado por responder a minha mensagem, pai. 

O homem levantou os olhos com uma expressão calma. O rosto quadrado e o cabelo sem um fio fora do lugar passava a impressão de que aquela era uma pessoa comprometida com algo, embora ninguém saiba com o que. Era daqueles em que você confiaria caso te fornecesse uma receita de medicamento mesmo não sendo médico. Isso provavelmente te mataria, mas isso não importa agora. 

- A voz está mais forte. - disse o homem. 

Nina o encarou. 

- Eu preciso que você me coloque no seu plano de saúde, só isso- respondeu Ela. - Juro que não me meti mais em problemas, tô estudando, tô trabalhando e tudo mais, mas eu preciso de tratamento médico, até o seu pastor disse isso da ultima vez que me viu. 

- Isso já tem anos, não tenho mais nada com aquele homem sem fé. Eu quero que conheça meu novo guia espiritual, ele vai tirar esse demônio de você. 

A voz na mente de Nina riu. Ela sabia. A voz acha ter escutado a coisa mais idiota da terra. 

- Demônio? Gostei! Vamos Nina, vou fazer você girar a cabeça trezentos e sessenta graus e depois vomitar vitamina de abacate - disse a a voz. 

Nina respirou fundo de irritação e depois encarou aquele homem como se ele fosse a criatura mais detestável da terra. Os olhos dela ficaram molhados fazendo com que a luz do ambiente fosse refletida  neles de um jeito não muito natural. 

- Pai, eu preciso de remédios e de um médico, não quero causar problemas pra ninguém, mas eu preciso ter um plano de saúde pra isso ou ao menos dinheiro pra pagar por isso - ela respirou fundo mais uma vez. - Tô assustada pra cacete.

- Calma - disse o homem. - Vamos fazer assim, vou marcar um horário com meu guia, mas vou fazer uns telefonemas também e tentar te arranjar um médico. 

Nina fez um gesto com a cabeça de que concordava com aquilo. Não era como se tivesse outra escolha aquele momento. 

Ela limpou o rosto molhado de lágrimas com as mãos. Por alguns segundos se sentiu leve. 

- Por favor, almoce comigo, me fale do que tem feito, como anda o curso que você tá fazendo, se tem algum namorado novo ou coisa assim. Tem tanto tempo que eu não te vejo. 

- Bem, eu tenho trabalhado em um velho Sebo lá do centro, não paga tão bem, mas consigo manter a casa e a alimentação em dias e o curso tá indo bem, vai levar meses ainda para eu poder me candidatar a uma estágio, mas as coisas estão andando. - falou  

- Fico feliz em saber que você consegue se virar e quanto a namorados? Você é uma mulher adulta, já está na hora de ter um homem pra te ajudar com as coisas. 

Por um segundo Nina lembrou do homem no banheiro, mas achou melhor não mencionar aquilo ao pai, por motivos óbvios. Ela riu de leve. 

- Sem namorado, sozinha esses tempos.   

Eles dois se olhavam como se nada mais tivessem a dizer um para o outro. Todo o assunto do mundo desapareceu de uma vez só. 

Comeram em silêncio. 

Depois foram embora. 

- Você não acha que vai se livrar de mim só por tá tomando uns remédios né ? Talvez o exorcismo funcione - disse a voz 

Aquilo estava fazendo a cabeça dela tremer. Teve aquela sensação durante todo o percurso de volta para casa. A mente dela formigava em constante desagrado, mas não sabia até que ponto aquilo era a voz ou resultado do encontro com o pai, ou ainda alguma questão com Sadboy, o que ela considerava a pior opção. 

A  sensação de que algo estava faltando não ia embora, ela sentia que aquilo nunca a deixaria.  Foi com esse tipo de sentimento que ela se deitou na cama do seu quarto.  Era o meio do dia, estava de folga, mas que diferença isso faz quando você não tem um centavo para aproveitar o ócio?

Ela pegou o celular e começou a olhar as postagens que as pessoas estavam fazendo no facebook. Aquele era o principal termômetro dela para analisar o mundo. O que as pessoas estavam compartilhando em suas mídias sociais. O furor da vez era a morte de um homem. Tinha sido assassinado de forma bárbara. Uns falavam em várias facadas, outros em tortura. Aquilo não era exatamente novidade na cidade, mas o que chamou a atenção de Nina foi a foto do rapaz morto. 

Era o homem que a tinha chupado no banheiro. 

- Você se lembra dos últimos dias? Da noite do bar ao encontro com seu pai? - questionou a voz em um tom jocoso. 

Ela abraçou o travesseiro e chorou.

Não lembrava. 







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⏰ Última atualização: Jun 29, 2020 ⏰

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