Daniel Carter
Estava frio do lado de fora, minhas mãos tremiam nos bolsos do casaco enquanto esperava que ele atendesse a porta. Encarei o céu, atento aos tons de pêssego com o sol se pondo, era uma das minhas cores favoritas. Quando a porta se abriu, Sam me encarou com um olhar meio surpreso e meio assustado.
— Aconteceu alguma coisa? — Ele perguntou.
— Eu contei pros meus pais que sou bissexual. — Respondi.
Pude ver a tensão se instalar por todo seu corpo, sua mão tremeu quando se entrelaçou com a minha.
— O que eles fizeram? — Sam perguntou, sem tirar seus olhos escuros de mim.
— Ah, — Deixei uma risada sem vida escapar. — Eles já desconfiavam. Me expulsaram de casa, disseram que eu não devia ter nascido, eles nunca quiseram ter gêmeos de qualquer forma.
Sam não disse nada, só me puxou para dentro, fechou a porta e me abraçou. Eu queria chorar nos braços quentes dele, mas não sentia nada.
— Pelo menos agora posso cuidar de você todos os dias, — Sam segurou meu rosto com ambas as mãos e me deu um beijo suave na testa. — Sabe o que mais, tenho um pote do seu sorvete favorito no freezer, podemos ver algumas de suas animações favoritas do século XXI até amanhecer. O que acha?
Olhei para ele por um instante, sua pele escura e seus olhos carinhosos me fizeram por um momento ser grato por estar vivo.
— Okay, vou escolher os filmes enquanto você pega o sorvete, — Respondi. — Não esquece o vinho também.
Foi isso que fizemos por horas, assistimos juntos na TV holográfica até Sam adormecer. O álcool tinha diminuído o vazio que sentia em todo meu corpo, estava prestes a ir tomar um banho antes de ir dormir quando senti meu bracelete vibrar.
Me sentei na cama e ativei a pequena tela holográfica, era uma mensagem de voz do Dylan, meu irmão gêmeo hétero. Tinha o mesmo cabelo dourado palha seca, a mesma pele bronzeada, os mesmos olhos castanhos. Acho que já é claro a única diferença entre nós dóis.
— Danny, preciso falar com você, — Ele dizia. — Se me ignorar, vou na casa do Sam. Agora.
Tinha acabado de colocar meu casaco azul quando senti os braços do Sam ao meu redor.
— Precisa que eu vá com você? — Ele perguntou.
— Não, é só meu irmão. — Acariciei suas mãos antes de levantar e sair.
Depois de pegar uma cabine até o endereço que Dylan havia mandado, subi até a cobertura no vigésimo andar de um prédio velho e ele já estava lá esperando.
— O que você quer? — Questionei.
— Pedir desculpas, — Ele hesitou. — por não dizer nada quando nossos pais disseram toda aquela baboseira. Eu devia ter te defendido.
Encarei Dylan por um tempo, sem saber se estava com raiva dele, dos meus pais ou do mundo.
— Dy, você podia ter dito isso na mensagem de voz. — Foi tudo que consegui dizer.
— Tem outra coisa, — Dylan balançou os braços, como se tentasse espantar o nervosismo. — eu sou gay.
Gargalhei, incrédulo. Não acreditava no que estava acontecendo.
— E só pensou em me dizer agora? — O vazio dentro de mim se transformou em raiva. — Sabe, você foi a primeira pessoa pra quem eu me assumi. E agora, depois de me ver sendo expulso de casa por nossos pais e não fazer nada, você decide me contar?
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Glitch 001
Science FictionNo ano de 2140, o mundo foi atingido por uma fonte de energia desconhecida. Enquanto milhares morreram na catástrofe, centenas que tiveram contato com a energia entraram em coma. Daniel Carter é um deles. Acordando de um coma com dois anos de duraçã...