Capítulo 002

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Emilly Volk

— Obrigada. — Me encostei na parede, ainda tentando estabilizar minha respiração.

— Não é nada, acontece o tempo todo comigo. — Ele respondeu. — Meu nome é Daniel, aliás.

— Jonathan, vizinho distante de vocês! — Gritou uma voz masculina.

— É, você já se apresentou mais vezes do que posso contar. — Respondi.

— O que porras está acontecendo? — Daniel perguntou.

— Algum tipo de energia atingiu o planeta. Causou destruição em massa, cidades inteiras foram completamente destruídas. — Disse em voz alta.

Daniel abriu a boca para dizer algo, mas passou as mãos pelo cabelo dourado e soltou um longo suspiro.

— Eu ouvi alguns dos cientistas conversarem, — Tentei relembrar o máximo possível.— A energia trouxe um vírus e estamos infectados, deve ser por isso que todos usam aqueles trajes estranhos.

— Ainda assim, o que caralhos estão fazendo com a gente e a quanto tempo estamos aqui? — Daniel perguntou, me encarando em total confusão.

— O conceito de tempo não existe aqui dentro, estão fazendo alguma porra com nosso cérebro! — Gritou Jonathan.

Ouvi o som familiar das botas militares vindo pelo corredor, provavelmente era nossa refeição diária, que consistia em uma pasta sebosa que diziam ser comestível, além de um copo descartável de água e pílulas tranquilizantes.

— Eres un hijo de puta! — Jonathan começou a gritar, presumi que ele jogou a bandeja de comida nas grades da cela, o que foi seguido de grunhidos de dor e mais xingamentos em espanhol.

Me forcei a comer a pasta rosa quando deslizaram minha bandeja por debaixo das grades. Daniel usou todo xingamento que conhecia enquanto vomitava no vaso sanitário de sua cela.

— Você se acostuma. — Disse em forma de consolo.

Não demorou muito para os guardas voltarem, esperei minha cela abrir e usei toda minha força para bater na cara de um deles com a bandeja, sua máscara caiu longe. Levei um soco no estômago e caí de joelhos, um deles apontou sua arma na minha cara enquanto o outro aplicou o sedativo no meu pescoço.

— Vá direto para esterilização, eu levo ela. — Foi uma das poucas coisas que ouvi além dos gritos de Daniel, antes do sedativo começar a fazer efeito.

Estava de volta na Rússia, olhando pela janela do táxi o show de fogos de artifício holográficos quando meu bracelete vibrou.

Atendi a ligação e a cara do meu pai se materializou na tela holográfica.

— Onde você estava que não atendeu nenhuma das minhas ligações? — Ele soava irritado como sempre.

— Acabei de sair da aula de Muay Thai, — Revirei os olhos.— tenho terapia agora.

Desliguei antes que ele pudesse dizer qualquer coisa e pareceu uma eternidade até chegar na clínica infernal.

— Srta. Volk, tenho que lhe informar que seu progresso está caindo.— Disse Dr. Jonah, meu terapeuta pé no saco.

— É meio óbvio, eu tentei me matar semana passada caso não tenha anotado isso na sua transcrição. — Eu já podia sentir a raiva borbulhando dentro de mim, o nó na garganta já era forte demais para respirar normalmente.

— Srta. Volk, tudo que você precisa fazer é tomar sua medicação, não é tão complicado. — Disse Jonah, tirando seu óculos em frustração.

Eu queria dizer tanta coisa, queria gritar na cara dele que a medicação fazia com que eu sentisse como se estivesse me afogando constantemente. Queria dizer que meu pai me odiava por minha mãe ter morrido durante o parto e que eu não conseguia entender nem a porra da minha própria sexualidade, mas tudo que fiz foi levantar e sair correndo.

Eu corria no meio da estrada o mais rápido que pudia, carros buzinavam e só podia pensar que queria que o mundo acabasse naquele mesmo momento.

Foi então que veio o clarão dourado, seguido de uma gigantesca explosão.

***

Eles nos deixavam quase sempre sedados, então o tempo já não existia pra nenhum de nós, uma hora e um dia não podia mais ser medido, já que não sabíamos quando íamos acordar novamente.

Despertei quando me jogaram debaixo de um chuveiro e a água gelada escorreu pelo meu corpo nu. Meu cabelo curto ainda estava encharcado quando me vestiram em uma calça e blusa de algodão branca, me levaram até uma sala e me amarraram em uma cadeira de dentista, o que me deixava com a visão apenas do teto branco e vazio.

Ainda estava atordoada com a última dose de tranquilizante quando ouvi uma voz feminina falar no auto falante.

— A candidata é mais resistente do que esperava, a compatibilidade subiu para 78%, então vamos aumentar o nível de dosagem.

Assim que o líquido da injeção começou a se espalhar pelas minhas veias, meu interior queimou como se houvesse um incêndio lá dentro. Perdi a consciência diversas enquanto gritava de dor, me debatendo contra as amarras.

Foi só quando meus olhos e nariz começaram a sangrar que aplicaram outra coisa no meu sistema, em alguns minutos o queimor se reduziu a quase nada. Eu estava quase inerte quando colocaram uma máquina estranha no meu rosto.

— Iniciando mapeamento encefálico.— Disse a voz robótica.

Luzes coloridas explodiram na minha visão e mergulhei mais uma vez no mar de escuridão que era a inconsciência.

Consegui abrir os olhos quando já estava sendo carregada pelos guardas em um corredor cheio de câmeras de segurança. De um corredor conectado, saiu um garoto jovem, parecia ter uns dezessete anos, mas era alto, tinha pele bronzeada e cabelo castanho escuro.

Ele empurrou um dos guardas contra a parede e cuspiu na cara dele, mas o segundo guarda o rendeu no chão enquanto ele xingava em espanhol.

— Ainda lembra de mim? — Perguntou ele, com os dentes sujos de sangue.

Os guardas que me arrastavam me levaram antes que pudesse responder, mas eu não lembrava. Nunca o tinha visto e não reconhecia sua voz de lugar nenhum, o que causou um zumbido infernal no meu cérebro quando tentei relembrar alguma memória.

Fui jogada em uma cela, e me assustei quando um garoto de cabelo dourado na cela afrente da minha me chamou pelo nome.

— Sinto muito, Emilly. — Ele continuou.

Foi só quando vi que o garoto tinha umas seis pílulas na mão, que estava tremendo enquanto tentava se aproximar de sua boca, que entendi o que estava acontecendo.

— Não faça isso, — Disse com um suspiro. — Não vale a pena.

Ele jogou as pílulas para fora da cela, gritando e chutando tudo que via pela frente. Esperei um tempo antes de perguntar.

— Desculpa, mas como é que você sabe meu nome?

Glitch 001Onde histórias criam vida. Descubra agora