I | Vermelho e azul

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"I'll drop and speak a charm
Take the weather from your heart
And the weight from on your toes
And theres nothing to your side
For you to recognise
It tarnished long ago"
Wheatear – Novo amor


Dou uma última tragada em meu cigarro antes de o jogar no chão e o amassar com o pé. Já era noite, e a rua estava molhada e com poças d'água preenchendo os buracos depois daquela chuva forte durante a tarde. As luzes alaranjadas dos postes refletiam na água, trazendo uma sensação extremamente melancólica e nostálgica enquanto caminho vagarosamente em direção a ponte da cidade. Não é um lugar silencioso para se pensar, mas ao menos é um pouco distante daquela casa insuportável que eu moro por tempo delimitado.

Me sento na beira da ponte, jogando minhas pernas em direção oposta a avenida atrás de mim e fecho os olhos, deixando a brisa noturna do Outono adentrar em meu corpo. O cheiro que vem com a onda do vento é uma mistura dos Pinheiros das montanhas e das plantas aquáticas do lago que se encontra bem abaixo do meu nariz. Meu celular apita, mostrando uma mensagem inconveniente de um dos meus amigos, na qual resolvo ignorar enquanto pego um último cigarro no maço dentro do meu bolso interno da jaqueta de couro. Antes que o esqueiro o acenda, uma ambulância passa por mim de forma veloz e zumbindo com sua sirene de emergência. Os reflexos na água que anteriormente eram amarelos, agora são vermelhos e azuis. Grito um palavrão quando meu cigarro voa por entre meus dedos em direção ao chão. Porra!

Volto para o hotel extremamente irritado com o ocorrido. Não que fosse grande coisa, mas por alguma razão qualquer acontecimento fora do planejado vinha me irritando. Passo pelo recepcionista do saguão que me cumprimenta mas sigo sem o olhar, como de costume. Entro no elevador e aperto o botão em direção a cobertura.

— Achei que você tinha se jogado daquela ponte. — quem diz essa estupidez é Gabriel. Eu nem sei porque esse idiota está aqui. Eu não sei porque toda vez que entro nesse apartamento, ele está aqui — Trouxe o que eu pedi pelo menos?

— Não. E sai de cima da mesa. — murmuro com a voz agarrada na garganta por estar com muita raiva nesse momento — Porque ainda está aqui?

— Melhora esse humor, seu puto. Eu chamei uma galera pra cá. — dá dois tampinhas em meu ombro e vai em direção ao bar — Espero que não se importe.

— Não estou no clima. — começo a puxar algumas peles do dedo na tentativa de conter minha frustração — E sua presença está cada dia mais difícil de suportar. Todo dia você fica aqui, porra.

— Eu chamei a Olívia, e ela confirmou que vem. — ignora o que eu disse e eu o encaro interessado — E ainda vai trazer uma prima gata junto com ela, pra mim. — rolo os olhos com seu com seu comentário malicioso e me levanto da poltrona indo em direção ao meu quarto no andar de cima.

Conheci Olívia em uma festa a uns quatro anos atrás. Ela era extremamente bonita, e seu jeito sensual enquanto dançava na festa me chamou a atenção desda primeira vez que a vi. Nós bebemos bastante naquela noite e no outro dia acordei com a visão de suas costas nua em meio ao lençol branco em eu apartamento. Desde então nós temos uma relação puramente física e casual, e ambos acordaram de que não passaria disso.

Depois de tomar um banho rápido e me arrumar, verifico meu celular para checar se minha avó não havia mandado alguma mensagem importante do hospital, e por coincidência, havia.

Minha avó tem câncer cerebral, e está a quase um ano e meio recebendo tratamento de quimioterapia no hospital. Foi muito doloroso ver todo o processo de tratamento, e como isso afetou não apenas o físico mas também a auto estima da pessoa a qual mais estabeleci relação de afeto. Ela dividia o quarto com uma outra senhora que tinha Alzheimer em fase terminal, e as duas estabeleceram uma amizade muito importante para o conforto durante os dias que passaram lá, mas infelizmente a senhora Alana faleceu a dois meses atrás, deixando minha avó extremamente magoada no hospital. Sua mensagem dizia que uma nova paciente seria coloca amanhã no lugar da senhora Nana após a cirurgia que, a propósito, estava em andamento naquele exato momento. Respondi dizendo que iria visitá-la amanhã, e desliguei o celular o colocando encima da escrivaninha.

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⏰ Última atualização: Jul 07, 2020 ⏰

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