Parte II

6 1 0
                                        

No dia seguinte resolveram pôr os planos de Raposa em prática. Começando pelo clássico: o bilhetinho. Simples, direto e infalível, argumentava Raposa. A probabilidade da humilhação era bem menor do que declarar-se oralmente.

Sarah tentava escrever no papel o que precisava ser dito. Apagava e escrevia de novo. Quando finalmente terminou, Raposa pega o papel para avaliar.

O bilhete estava todo amassado devido à brutalidade com que fora feito e os constantes apagamentos. Nele havia, em letras garrafais, os dizeres:

"Raíza, namora cmg?
Sim: dá um sorrisinho
Não: morde as costa"

Como se não bastasse a coloquialidade do texto e a escrita torta e tremida feita com extrema ansiedade, havia uma incoerência ainda maior: Sarah nunca viu Raíza dar um sorrisinho pra alguém que não fosse de cunho sarcástico, por que seria agora? Talvez a alternativa de que ela mordesse as próprias costas não estivesse tão iimpossível quanto Sarah pensava.

Raposa analisava todo corpo do papel em silêncio. Quando finalmente dá sua nota:

-Ridículo.

-Foda-se, vai assim mesmo. - respondeu Sarah, não se importando tanto assim com a avaliação da amiga.

Não podiam perder tempo, já que o intervalo tinha acabado de começar e precisavam arrumar um jeito de fazer o bilhete chegar nas mãos de Raíza.

Resolveram se esconder dentro da salinha de serviço. Com a luz apagada, Sarah estava agachada perto da fresta da porta de prontidão para receber o sinal de Raposa, que estava de pé olhando o corredor pela janelinha da porta. O plano parecia simples: Raíza passaria, Raposa faria o sinal, Sarah empurraria o bilhete dobrado pela fresta inferior da porta, Raíza pegaria o papel e estaria tudo resolvido.

Depois de alguns poucos minutos de tocaia, Raposa finalmente vê Raíza passando lindamente pelo corredor. Ela avisa para Sarah, que no mesmo momento dá um peteleco no papel.

Ao perceber aquele pedaço branco dobrado perto de seus pés, Raíza para de repente. O encara. E, sem pisar nele, passa por cima, retomando seu curso.

Sarah e Raposa saem irritadas após ter o plano A fracassado diante de seus olhos. Se questionavam o porquê de um papel que é jogado em sua frente de forma totalmente aleatória não gerou nem um pingo de curiosidade em Raíza. Talvez tivesse pensado que era apenas lixo? Ou talvez que a situação pareceu estranha demais? Tudo isso passava pela cabeça de Sarah, enquanto Raposa tentava bolar um plano B.

Entenderam que talvez fosse mais inteligente aproximar o papel ainda mais de Raíza. Antes de Raíza voltar para a sala, Sarah vai sorrateiramente em direção a carteira da garota, enfia o bilhete na contracapa de seu caderno e o coloca novamente na mesa.

Alguns minutos depois, Raíza retorna. A aula já havia começado. Ela abre o caderno e vê aquele estranho papel de novo ali. Aquele mesmo papel que havia brotado na sua frente no corredor minutos atrás.

Sarah e Raposa a tudo assistiam apreensivas, ansiando pela reação de Raíza.

Seus olhos fuzilam aquela folha de caderno rasgada pensando como ele poderia ter ido parar ali. Raíza pega o papel e comete o descuido segurar o papel no alto, na altura do seu olhar.

Descuido pois, quando estava prestes a descobrir finalmente o que diabos havia de tão importante dentro daquela folha dobrada, a professora vê a situação e intervém.

-Trocando bilhetes na aula?

-Não! Eu não estava... - Raíza tentou se defender do mal entendido, mas foi interrompida.

-Me dê isto. - a professora estende a mão para que Raíza a entregasse o papel.

Mais uma investida fracassada. Extremamente desiludida, Sarah leva as mãos ao rosto com tamanha força que parecia querer arrancar a cara fora. Puta da vida,  Raposa chuta a primeira coisa que vê pela frente. Coitada da parede, nela agora está carimbada o padrão da sola do sapato de Raposa.

SystemáticaOnde histórias criam vida. Descubra agora