74ª Edição dos Jogos Vorazes

Capítulo 3

O hino acaba e os Pacificadores nos conduzem a uma sala. Claro, a sala em que eu vou me despedir de quem eu amo. Supostamente é a hora que você se despede e fala "ah te vejo depois dos Jogos" mas como as chances não estão a meu favor nem tento me iludir com a ideia. Meus pais chegam juntos de mãos dadas, só soltam para me abraçar. Passamos um bom momento assim, abraçados, apenas o som que vem de fora da sala. Estou a ponto de chorar quando lembro que haverá câmeras lá fora, muitas câmeras, não posso me dar ao luxo de parecer fraca. Se for para morrer nos Jogos, ao menos quero morrer com alguma honra. Continuamos assim até eu conseguir engolir as lágrimas, afastá-los e dizer:
-Eu amo vocês.
Nos abraçamos de novo e ouço minha mãe chorando. Por entres as lágrimas ela consegue arfar:
-Também te amamos.
Ficamos outro momento assim até um Pacificador entrar na sala e pedir para se retirarem. Com relutância eles vão, sem desgrudar os olhos de mim até o ultimo momentos.
Imagino que eles também saibam que não tenho chances.
Um Pacificador me conduz para fora da sala e vejo o garoto que irá comigo aos Jogos. Vamos andando até a estação de trem onde repórteres com suas câmeras já nos esperavam, todas apontadas para as nossas caras. Tento parecer o mais imparcial possível mas com tantas câmeras fica mais complicado. Olho o garoto ao meu lado e percebo que ele tenta fazer o mesmo, porém uma marca de lágrima em sua bochecha o entrega. Andamos até as portas do trem e entramos. Logo após nossa entrada ser autorizada as portas se fecham atrás de nós e assim o trem já começa a andar. Claro que nunca tinha estado em um trem antes e também nunca tinha passado pela minha cabeça como seria a sensação. Parece que o chão vibra aos meus pés então sento.
Aposentos são designados a nós e entro no meu. É mais chique do que qualquer coisa que podia imaginar. Vou ao banheiro e vejo a torneira tanto com água fria quanto com água quente. Não temos esse tipo de luxo no distrito. Abro a gaveta e vejo mais roupas do que se juntasse o meu guarda roupa e da minha mãe e com certeza bem mais belas. Tomo um banho rápido e me troço, já está quase na hora da ceia
A cidadã da Capital me leva por uma série de corredores até a sala onde a ceia será servida. O garoto do meu distrito já está na mesa, ao lado está alguém que acredito que seja nosso tutor. Sua aparência não é realmente das mais agradáveis. Ele aparenta estar sóbrio, pelo menos por enquanto. Não sei se posso confiar minha sobrevivência em alguém assim.
A comida chega em partes. Em cada parte parecendo que vem mais comida do que antes. Já estou empanturrada quando ainda mais comida chega. Nunca senti essa sensação de barriga cheia como sinto agora. Quando a refeição acaba, me levanto para ir ao meu quarto mas acho que meu estômago nunca esteve acostumado com tanta comida e quase não consigo manter a comida dentro. Acho que o garoto do meu distrito também está tendo esse problema, ele comeu até mais do que eu. Nos juntamos e vamos a uma onde tem uma TV e assistimos as colheitas dos outros distritos. Distritos 1 e 2, como sempre, tendo seus voluntários Carreiristas, que treinam para os Jogos até completarem 18 anos e então se voluntariarem. Distritos 3 e 4 ninguém se sobressai. Então aparece o 5 e vejo minha reação. Realmente não consegui disfarçar o meu espanto tão bem quanto gostaria. Os distritos passam, 6, 7, 8, 9, 10. Quando chega ao 11 duas coisas me chamam a atenção. Uma garotinha que deve ter uns 12 ano foi escolhida, o distrito em completo silêncio como geralmente acontece quando alguém tão novo é escolhido. E o garoto do mesmo distrito é realmente grande e assustador. Como eu vou conseguir matar ou me proteger de alguém assim? E então chega no distrito 12. Uma voluntária. Não lembro de nenhum distrito sem ser o 1 ou o 2 ou até às vezes o 4 com algum voluntário. Mas aí vejo o que a levou a se voluntariar. Uma garotinha, não mais velha que a garotinha do 11, foi escolhida para os Jogos. Considerando a reação da voluntária aposto que são irmãs. O garoto também chama a atenção por ser grande.
Solto um longo suspiro e vejo o garoto ao meu lado fazer o mesmo.
Nenhum de nós dois tem alguma chance.