Harry gostava de escadas. Ele se lembra de quando era criança, quando as coisas ainda pareciam um filme e ele não via nada de errado no que acontecia com ele, seu pai costumava o levar para o trabalho, em um daqueles prédios altos onde pessoas entravam e saiam a cada segundo, mas ele sempre deixava Harry na recepção sob o olhar de Adelaine, uma de suas várias secretárias. Só que claro, ela sempre se distraia com o tanto de pessoas que chegavam ou o telefone que parecia não dar nenhum descanso para ela, então enquanto ela estava ocupada demais, Harry dava um jeito de levantar da cadeira onde ele deveria ficar e correr para a escada. Ela era alta e em espiral. Perfeita para ele subir e descer, rápido demais, tropeçando às vezes, até que tudo começasse a girar e ele errasse os degraus, se apoiando no corrimão para não cair.
Ele tinha nove anos na última vez que fez isso, subir e descer a escada até que ele estivesse tonto e sentisse vontade de vomitar. Porém seu pai descobriu e disse que Harry estava grande demais para brincadeiras, disse que ele não era mais uma criança e deveria se comportar.
Foi então que as responsabilidades começaram. Seus brinquedos foram confiscados, ele teria aula de piano, violino e etiquetas seis vezes por semana, uma hora e meia para cada uma. Sem mais sobremesas ou passeios no parque, seu pai afirmava que ele tinha mais com o que se preocupar se um dia quisesse ter tudo que ele havia conquistado. E, céus, ele tinha apenas nove anos de idade, ele deveria estar brincando, tomando sorvete e assistindo desenhos, mas ao invés disso ele tinha que acompanhar seu pai nas reuniões de negócios, aparecer sorridente para a mídia e ir a jantares que sempre acabavam com seu pai bêbado demais e dizendo coisas que Harry se estremecia até de pensar.
— Se ela estivesse aqui, talvez eu fosse um pai melhor — Desmond um dia disse, suspirando antes de dar mais um gole em sua bebida. Harry nunca sentiu tanta raiva do pai quanto naquele dia.
Não era culpa dela, não era de sua mãe. Ela era uma ótima pessoa, uma mulher forte e era pelos poucos anos que Harry havia passado com ela que ele não era um completo idiota como seu pai. Anne conhecia muito bem o homem com quem havia se casado, ele já era frio, manipulador e sempre enchendo a cara pelos cantos antes mesmo do acidente. Sua mãe estando ali ou não teria nenhum efeito contrário, mesmo sendo tão jovem ele sabia que Desmond seria a mesma pessoa em qualquer circunstancias e isso não era culpa de Anne! Ele ser um homem que só pensa em dinheiro, um pai ruim e um alcoólatra não é culpa de sua mãe, ela não tinha o dever de fazer com que ele fosse um homem melhor ou muito menos um pai melhor, isso era uma obrigação dele. Ela estando morta ou não.
— Quem você pensa que é pra sequer ousar dizer isso? — Harry retrucou, mas já era tarde demais, seu pai já havia desaparecido pela porta de seu escritório.
E então ele soube sua infância nunca iria voltar atrás e talvez ele fosse perder sua adolescência também, tudo porque seu pai queria que ele amadurecesse rápido demais. Desmond sempre falava que ele só queria o bem de seu filho, mas a verdade é que ele só queria que ele seguisse o mesmo caminho que ele, sem se importar com o que Harry queria. Ele nunca teria a liberdade de ser quem ele é, de fazer amizades com quem quisesse ou até mesmo se vestir do jeito que quisesse, não, seu pai sempre controlava tudo, até os últimos detalhes. Harry sentia-se tão sufocado.
— Você está vendo o lado ruim da situação, Harry — Adelaine respondeu, na única vez em que o garoto se atreveu a reclamar. — Seu pai só quer o seu bem, você sabe o quanto ele teve de trabalhar para conquistar tudo o que ele tem? Pra te proporcionar uma vida boa? Ele só não quer que você perca tudo isso! Acredite em mim, ele só quer seu bem, querido.
Harry se esforça todo dia para acreditar, mesmo que isso soe errado em sua mente, ele continua falando para si mesmo que seu pai só quer o melhor para ele. Seu pai só quer o seu bem, Harry, ele só quer o seu maldito bem. E então ele aprendeu a calar a boca e aceitar que talvez sua vida não fosse uma das melhores, ele não era feliz e sua mãe estava morta, mas ele sabia que havia pessoas que tinham muito menos do que ele.
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He Without Sin
Romance"Se eu ouvir a palavra Aquaman saindo da sua boca, você é um homem morto para mim!" Ou a história onde Louis odeia a palavra sereias, mas Harry ama dizer ela.