Capítulo 2: Os Restos de um Homem

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Era o fim do inverno, a primavera anunciava sua chegada com a mudança repentina na paisagem de uma densa floresta localizada no fundo de um vale, na pequena ilha do Japão, suas folhas antes secas e mortas, agora voltavam a nascer, fortes e coloridas, esbanjando os mais diferentes tons e formatos, porém a vida animal não voltara a habitar aquela floresta, pois algo ali assustava até mesmo o maior dos predadores.

Estava ali a um bom tempo, incansavelmente realizando a mesma tarefa repetidamente, cavando próximo à vila que ali existia, furtiva em meio a densidade da floresta, antes habitada por muitos, agora apenas um conjunto de casas vazias. Naquele dia Aquilo finalmente terminara seu trabalho, 74 era o número de buracos que cavara, todos adornados com flores de cerejeira recentemente colhidas, uma dádiva dos primeiros dias de primavera, porém não havia felicidade ao concluir sua tarefa, pois não eram buracos quaisquer, eram túmulos. O último corpo que enterrou era pequeno, provavelmente de uma criança com não mais que cinco anos, Aquilo não sentia mais tristeza em sua tarefa, já havia visto todo o terror que seu povo havia sofrido, e após adornar o último dos túmulos, fez uma prece antiga e poderosa pedindo pela paz daquelas almas, um pedido que não poderia ser feito para si mesmo. Aquilo já fora humano, porém não poderia mais ser chamado de tal, não sabia como havia voltado a vida, porém sabia o porque, o fardo de vingar cada uma daquelas almas era seu, e somente seu.

Andar novamente pelas ruas de sua antiga vila era doloroso, um complexo de casas tradicionais da região, feitas com madeira resistente, com portas de correr pintadas com os nomes das famílias que ali viviam, com jardins muito bem cuidados, muitos deles com exemplares das árvores de cerejeira, que davam um toque rosado ao ambiente que sua esposa tanto amava, na parte leste da vila, junto ao rio, encontrava-se os barcos que eram utilizados para a pesca, atividade esta que provinha tanto alimento como mercadorias para serem comercializadas com as cidades que ficavam fora da floresta, tudo isto estava em ruínas, manchas de sangue e destruição estavam por todo o lado, e a beleza de outrora estava apenas em suas memórias. Conhecera cada uma das pessoas que ali viveram, desde o mais simples pescador até seus irmãos Shirai Ryu, e ao lembrar deles, olhou para o dojo, que ficava ao final da rua principal. Esta vila fora fundada por seu avô, Kirin, um grande mestre do Ninjutsu, a arte de matar furtivamente tão antiga quanto o próprio Japão, Kirin era membro da organização conhecida como Lin Kuei, o mais antigo e poderoso clã de shinobis, mas ao ver que a honra e princípios do clã haviam sido manchados, Kirin fugiu e criou sua própria ramificação, os Shirai Ryu. Este ato de traição nunca fora esquecido, e esta rivalidade que levou ao ataque brutal sofrido em sua vila, mas aquilo não era justo, poucos ali eram de fato guerreiros Shirai Ryu, muitos dos mortos eram inocentes, pessoas de coração bom que não mereciam aquele destino, o ódio queimava dentro de si como chamas em uma floresta.

Não aguentava mais apenas olhar e remoer memórias de tempos melhores, na noite passada tivera um sonho, recebera um chamado o convidando para uma ilha distante, sabia onde deveria estar para ser levado até ela, e sabia que lá encontraria o homem que busca, aquele com olhos de cadáver, que era conhecido como Sub Zero. Adentrou o antigo dojo, conhecia cada pedaço de tatame ali, pois fora criado e treinado a vida toda sob aquele teto, uma memória o perfurou como uma lâmina naquele momento, lembrou-se dos primeiros treinos de seu filho e como se sentia feliz e orgulhoso de poder repassar os seus ensinamentos para o garoto. Atravessou o salão principal, subiu as escadas até a sala do grão mestre e ao fundo dela destrancou uma porta adornada com pinturas escarlate, e lá estava pendurado diante de si o traje cerimonial de batalha de sua família, uma roupa shinobi com proteções e malha maleável de cor amarela, sua katana dupla cujo fio era capaz de cortar aço e principalmente sua corrente cuja ponta era feita de uma lâmina igualmente mortal, com um formato que imitava o ferrão de um escorpião.

Da última vez havia sido pego desprevenido pelo ataque, mal pudera se defender, pior, não pudera proteger sua família, sua amada esposa e filho, mas Aquilo não era mais o mesmo, naquela noite Hanzo Hasashi fora assassinado pelas mãos do homem com olhos de cadáver, o espectro que hoje se prepara para vingá-los se chama apenas Scorpion.

Mortal Kombat: O Despertar do DragãoOnde histórias criam vida. Descubra agora