Frágil

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Aquela garota estava começando a me assustar. O que realmente ela queria? “Pare de ser frouxo!” eu repetia para mim mesmo, embora meu desejo fosse de largar a hipótese de lutar por ela. Eu sabia que iria me magoar, sabia que nada iria terminar bem, mas só o fato de estar com ela e sentir o seu corpo encostando-se ao meu, fazia-me esquecer do que racionalmente precisava ser feito e do que sentimentalmente eu queria fazer.

Fiquei ali na cama deitado por horas pensando em mim mesmo e nela, até ficar com sede e ter que ir para a cozinha beber alguma coisa. Chegando lá, abri a porta da geladeira e, ninguém merece, não havia nem uma garrafa d’agua. Na verdade não havia nada, somente um maldito bilhete de Jim. “Caro melhor amigo Carl. Como você pode perceber, não tem mais comida porque o pessoal da obra ficou com fome (você sabe, maconha dá larica) e acho que você vai ter que repor isso, mas tudo bem já que somos melhores amigos, não é? :D Ps. Não tem nada no armário também.”

Era só o que me faltava: Repor toda a comida. Sabia que não devia o ter agradecido pela arrumação. Quando fechei a porta da geladeira e olhei para trás levei um susto enorme. Audrey estava atrás de mim em silêncio e em pé esperando por mim:

- Tudo bem aí com o senhor? – Disse ela rindo, percebendo que levei um susto com sua presença.

- Claro, está tudo bem. Ainda mais quando viramos para trás e vemos alguém que invade nossa casa sem avisar. – Disse estressado, meu dia só piorava. Audrey era minha única verdadeira amizade. Dava-me conselhos e sempre me guiava nos momentos difíceis da minha vida. Ela era um tanto problemática por seus pais terem se divorciado quando tinha 13 anos. Entrou em depressão e começou a se prostituir para arranjar um dinheiro, pois não suportava a ideia de morar junto aos pais, que mesmo divorciados permaneciam na mesma casa e brigavam todo santo dia. Seus pais descobriram sobre o que ela andava fazendo e então decidiram manda-la embora. Felizmente Audrey já tinha juntado o suficiente para se manter em uma quitinete perto da minha casa. Várias vezes já ofereci minha casa para ela morar, inclusive com a permissão dos meus pais. Porém ela sempre recusava. Ah sim, esqueci de mencionar que ela já teve um caso com Jim, quem ela também odeia.

- Ah, deixa de ser chato. – Retrucou ela me dando língua. – Mas enfim, o que você tá fazendo? Soube que deu uma festa.

- Eu? Estou pensando em como vou fazer para repor toda a comida que o idiota do Jim deu para os homens da obra. E sim, dei uma festa ontem, mas prefiro não entrar em detalhes. Aliás, mais tarde eu te conto, preciso ir agora ao mercado.

- Hm, então aconteceu alguma coisa. Conheceu alguém? Bebeu de mais e fez merda?  Matou alguém? Tirou a virgindade de uma garota sem usar camisinha e agora acha que ela está grávida?

- Sim, não, não e... A última pergunta nem faz sentido!

- Acredite, faz sim. – Respondeu ela com um sorriso malicioso em sua boca, pondo de canto o cabo do pirulito que chupava. Audrey era linda, tinha o cabelo longo e vermelho, olhos imaculados e um corpo de ocultante menina, mas nunca consegui sentir nada por ela, não pelo fato dela ter vivido experiências exóticas, e sim porque achei que ela nunca iria me corresponder, então deixei qualquer pensamento besta de lado e levei nossa amizade muito a sério.

- Tá, tá bom. Então... Quer ir ao mercado comigo?

- Éh, fazer o que! Eu vim te ver e você vai sair. Vou contigo sim.

Saímos de casa e fomos direto ao mercado. O mercado era perto de minha casa e todos na vizinhança o frequentavam. Ninguém que eu conheça não conhece o mercado, afinal é o maior de nossa cidade “pacata”, Millenville. E sim, pacata entre aspas, porque de pacata esta cidade só tem escrito na placa de bem vindo. Estávamos andando lentamente para aproveitar o tempo e conversar:

Decifra-meOnde histórias criam vida. Descubra agora