II

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Entrou em seu Jeep Renegade, deixando a mochila e a pasta no banco do carona, seguiu o endereço indicado na papelada enquanto ouvia sua playlist e vez ou outra cantava junto. Seu destino não era muito longe dali e o caminho estava tranquilo, após estacionar em frente a casa de muros altos e um portão fechado, se encostou no carro, degustando o resto do seu chá gelado – Bom... – disse para si mesma – É hora do show - completou, antes de se dirigir a entrada e tocar a campainha.

Não demorou muito para que uma senhorinha simpática de cabelos cor de ferrugem lhe atendeu. – Senhorita Helena? Sim? - disse a governanta com um sorriso amigável – O Senhor Pablo está a sua espera – continuou com o sorriso, enquanto abria espaço para que Helena adentrasse pelo portão. Quando o fez, não hesitou em fazer uma cara de surpresa ao ver o amplo jardim, com muitas flores e uma casa clichê com muitas janelas de vidro e moldura branca, sem dúvidas parecia uma casa de filme.

Helena abaixou a cabeça, esperando ser guiada pelo caminho pela senhorinha simpática – Então... – começou a garota – a senhora trabalha há muito tempo aqui? – perguntou enquanto subiam a escadaria para a varanda da casa. – Há 25 anos – respondeu a mulher – Desde que o Senhor Pablo mudou para cidade- Helena assentiu com a cabeça, com um sorriso de lado e assim que adentraram a sala, como uma sombra a senhora sumiu, após dizer que iria informar o dono da casa sua chegada.

Ficou alguns minutos sozinha ali, apesar da aparência alegre da casa por fora, por dentro era fria e mal iluminada, caminhou um pouco pelo recinto, olhando os inúmeros porta-retratos que havia ali. A sala era recheada de móveis antigos, novamente lhe dava a ideia de que havia saído de um filme, começava a ficar impaciente quando ouviu passos pesados, quase arrastados e se virou para a porta onde a governanta havia entrado, e ali estava um homem grisalho que sem duvidas não aparentava ter a idade que tinha, conservado, usava calças confortáveis e uma blusa de manga longa branca dobrada até os cotovelos, olhou de baixo a cima para Helena com uma certa desconfiança. A garota estava acostumada com esse tipo de julgamento, já havia sido alertada diversas vezes por Betina pela aparência moleca que transparecia por ai. Nesse dia estava com seus all star surrados, um jeans desbotado, regata branca e uma blusa xadrez de vermelho e preto, os longos cabelos presos em um coque bagunçado, e só após ver o homem a jovem tirou os óculos escuros, deixando aparecer seu delineado de gatinho, Se não fosse pelo distintivo oficial dependurado em seu pescoço, qualquer um a confundiria com uma adolescente rebelde.

Bom dia Senhor Pablo, sou a investigadora Helena – disse em um tom confiante ao homem – ainda demorou um pouco a análise do homem e com um sorriso aberto, respondeu a jovem estendendo a mão – Satisfação em conhecê-la Dra. Helena, sou Pablo, dono da rede de postos de gasolina Vale-Verde. – Após apertarem as mãos, fez sinal para que a moça se sentasse, e se sentou de frente para ela, separados apenas pela mesa de centro. – O senhor poderia me relatar novamente o que aconteceu? – Ela perguntou, enquanto repousava as mãos em seus joelhos, e fitava a mesa, como se estivesse se preparando para ouvir atentamente todas as informações. – Ela era irresistivelmente linda... – ele começou a falar em um tom constrangido e baixo – Estávamos em uma reunião particular, porque o Doutor Agnaldo lançará sua candidatura em breve, ano politico, sabe como é né ? – Helena sentiu o olhar do senhor pesar sob ela, como se perguntasse se ela estava ouvindo e ela assentiu com a cabeça, como se pedisse para ele prosseguir – Pois bem, ela chegou acompanhada de um casal, mas logo começou a me rodear, tem olhinhos verdes curiosos como um gatinho – era notável que o homem apesar do desfalque sofrido, acabou se deixando nutrir sentimentos pela desconhecida – Sou homem né? A gente sente quando a mulher quer algo a mais, mas fui burro... – disse com pesar – Onde uma garota nova daquela iria querer um velho viúvo como eu?- o homem se levantou, indo até o barzinho que ali havia e se servindo de uma dose de uísque – a senhorita acredita em amor a primeira vista ? – perguntou enquanto voltava para onde estavam sentados, Helena levantou o olhar para o senhor com os lábios levemente abertos em O, automaticamente se lembrou de Betina, mas também se lembrou dela negando a existência de amor à primeira vista, então rapidamente fez não com a cabeça – Não.- disse em quase um miado, talvez a garota não mentisse tão bem sob pressão, Senhor Pablo deu uma risada gostosa e uma bebericada no uísque. – Para senhorita... agua? suco ? – perguntou se referindo a bebida, - água por favor – ela pediu em um tom sem jeito, não estava gostando muito do rumo que a conversa estava levando. Após ele tocar um pequeno sininho que repousava na mesa, uma outra empregada apareceu no local, e ele murmurou que a moça desejava água. – Então ... o que mais aconteceu? – Helena perguntou, dessa vez olhando para o senhor, não podia mais titubear e deixar transparecer nenhum tipo de insegurança.

- Começamos a conversar, tomamos umas bebidas, e marcamos de nos ver, ela me disse que seu nome era Natasha, e que era estudante de medicina... nos vimos mais duas ou três vezes. Antes de permitir que ela viesse à minha casa...e foi quando tudo aconteceu. – ele dizia entre bebericadas e gesticulava bastante com as mãos, sua voz era tristonha como se doesse lembrar de tudo aquilo, sim, era um homem de coração partido. – Quando o senhor percebeu o desfalque? – a jovem perguntou com uma certa curiosidade. – Alguns dias depois da primeira vez que ela dormiu aqui, comecei a dar falta de alguns pertences, mas coisas pequenas... uma pulseira de ouro aqui, um broche ali... anéis, dinheiro em espécie da minha carteira- após um suspiro pesado, observou a empregada entregar a água para Helena – No inicio – começou a falar depois da mulher sair da sala – Eu desconfiei de alguma empregada, mas confio demais em meus empregados, todas as vezes que nos víamos eu lhe dava presentes, vestidos, sapatos, brincos... não é me gabando, sabe ? mas sei como agradar uma mulher. – A vontade de Helena dar uma resposta malcriada para o homem foi suspensa com um gole longo da água que lhe fora servida – Ela não tinha necessidade de me roubar... era só ela me pedir que eu dava... era so ela me pedir com sua boquinha de coração e seus olhinhos... – e então...? – a jovem bastou-se a dizer isso. – E então... na ultima noite que ela dormiu aqui, ela me esperou dormir, me agradou de todos os jeitos possíveis... se é que me entende, e eu dormi... e ela roubou todas as joias de minha falecida esposa, estavam em um mostruário no meu cofre, e foi embora em um de meus carros... acordei com meu quarto revirado, apenas meu quarto, e o restante da casa impecável, ela soube exatamente onde mexer. – A mulher deu um suspiro leve e esperou que o senhor continuasse a historia, mas aparentemente havia terminado ali mesmo, assentiu novamente com a cabeça – Ela te disse onde morava ? idade ? telefone ? – Nada- ele respondeu – todas as vezes que nos encontrávamos ela chegava de uber, quando eu lhe indagava sua idade ela me respondia que era meu bebê, e suas ligações sempre em restrito... eu deveria ter desconfiado que as coisas estavam indo bem demais- disse enquanto virava o restante do uísque de vez. – Bem...- Helena começou a dizer – não se sinta culpado... existem pessoas por ai que sabem exatamente onde nos tocar para conseguirem o que querem, é uma pena isso ter acontecido com o senhor, e espero que consiga achar a golpista – ela disse com um sorriso de canto, se levantou após terminar sua água e prosseguiu – Hoje a tarde mandarei uma equipe vir conversar com seus empregados e também dar uma olhada no quarto do senhor, de primeira queria ter essa conversa leve apenas para saber mais dos fatos, além do que o senhor já havia narrado quando foi à delegacia.- ela apalpou seus bolsos e pegou um cartão preto com rosa, onde havia seu nome e seu telefone – Caso lembre de mais alguma coisa, não hesite em me ligar, independente do horário, qualquer informação é de suma importância – estendeu o cartão para o homem e após ele pegar, ambos começaram a caminhar em passos lentos para a porta. – Agradeço toda a sua ajuda Doutora. – Dessa vez ele mesmo levou a jovem até o portão, com silencio no caminho, e direito a um tchauzinho quando ela adentrou seu carro para seguir de volta à delegacia. 

PONDO A RAZÃO DE LADOOnde histórias criam vida. Descubra agora