Conto

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O nascimento de Olívia foi um tanto incomum.

Ao ser retirada do ventre de sua mãe, no seu primeiro e único grito, a sala do hospital se encheu de Mariposas. E todas desapareceram imediatamente fora colocada no colo de sua mãe. Naquele instante todos souberam o quanto ela era extraordinária.

Sua mãe a acalmou e, ao olhar em seus olhos, a batizou. Você poderia pensar que fora pela cor de sua retina, mas estaria enganado. Olívia realmente tinha azeitonas no lugar dos olhos. Com caroços e tudo. Ninguém sabia ao certo, em seus primeiros anos de vida, se era capaz de enxergar.

Não era apenas isso que a fazia única: Olívia sorria Borboletas, chorava Mariposas e zangava Abelhas. Nenhuma gota saía de seus olhos, nenhum som saía de sua garganta. No lugar do coração batendo, havia uma pedra sendo lapidada. Imagine o susto dos médicos ao descobrirem! E todos aguardavam ansiosos para saber a cor, forma e tipo de joia que sairia de lá.

Era o TAP, TAP, TAP, no lugar do TUM, TUM, TUM.

Souberam que Olívia enxergava, e muito bem, quando, aos quatro meses, seu pai lhe fizera uma careta e o quarto lotou de Borboletas coloridas. O pai ficou tão animado, que mandou fazer um jardim em frente a casa, para as borboletas de Olívia. Misteriosamente, as Abelhas e Mariposas sumiam, mas as Borboletas não.

(TAP, TAP, TAP...)

Ao completar um ano, Olívia teve sua primeira zanga. Foi desesperador tentar conter sua ira infantil enquanto todos eram picados! Só a pequena não era atingida. Nesse episódio descobriram que Champingnon, o cachorro, era alérgico às picadas...

(TAP, TAP, TAP...)

Conforme a menina crescia, maior e mais brilhante era seu belo par de azeitonas. Algumas pessoas chegavam a desviar o olhar, já que podia se ver refletidas nelas.

Os pés de Olívia pisavam muito delicados, fazendo que poucos percebessem sua aproximação. Isso fazia com que ela pudesse escutar e ver inúmeras situações, sem atrapalhar o percurso dos eventos. Olívia guardava muitos segredos de suas espiadas.

(TAP, TAP, TAP TAP...)

Uma vez presenciou uma grande briga entre seus pais e não pôde disfarçar, pois acabou botando uma porção de lagartas para fora! O que era aquilo? Era algo novo... Algo que apenas soube em uma noite de tempestade quando um relâmpago rasgou o céu. Olívia reconheceu o sentimento.

(TAP, TAP, TAP TAP...)

Outra vez, dormiu um cochilo tão sossegado que uma andorinha saiu de seu ouvido e ficou pousada em sua testa, cantando.

A vida da Menina de Olhos de Azeitona era um mundinho praticamente sem sons, todo particular. Meio perigoso, às vezes, mas lindo de ver! Na escola, os coleguinhas faziam graça para Olívia sorrir e, acidentalmente, encher a sala de borboletas. A professora não tinha escolha, a não ser mandar todos para o pátio, até a confusão passar.
Olívia não conseguia fingir seus sentimentos. Eles saltavam dela: Formigas, Pererequinhas, até Pétalas de Rosas saíram uma vez de seu nariz.

(TAP, TAP, TAP...)

Com pouco mais de dez anos, a maior Lagarta da vida de Olívia se tornou real: em um dia de muita zanga pirracenta, milhares de abelhas infestaram a casa e atingiram fortemente seu pai, que teve o mesmo destino infeliz de Champignon.

A casa ficou lotada de Mariposas por anos, e as azeitonas reduziram o brilho. Olívia sentiu sua lapidação acelerar. E, agora, doía...

(TAP TAP, TAP TAP, TAP TAP...)

As Mariposas foram desaparecendo com o tempo, mas sempre uma ou outra escapulia sem querer, quando seu pai vinha na memória. As Borboletas retornaram com mais frequência e as lapidações pararam de doer.

(tap, tap, tap...)

Com quinze anos, Olívia colocou suas azeitonas, pela primeira vez, em César: o Garoto com Olhos de Bilocas Azuis. Sua lapidação tornou a acelerar. De um modo diferente, dessa vez.

(TAP TAP tap, TAP tap, TAP tap, tap...)

Namoraram e terminaram. Assim como foi com Álvaro, o Garoto com Cabelos de Ramos de Trigo e Ivan, com os Lábios Sabor de Mel. Perfeito para suas Abelhas, inclusive!

Mas Olívia tinha um sonho que nunca mencionara a ninguém. Uma vontade que guardara apenas para si. Aos vinte e um anos pegou suas malas e foi em sua busca. A garota desejava conhecer o mar, para que pudesse despejar nele todo tipo de criatura que poderia sair de dentro dela.

A emoção foi tamanha, que Olívia conseguiu sentir seu último e mais forte TAP! Os médicos disseram que sua pedra havia sido, enfim, completamente lapidada.

Pela primeira vez o fenômeno que pertencia apenas a ela, tomou toda a família: o cemitério encheu de Mariposas! E, em sua lápide ficou registrado:

OLÍVIA, A MENINA DOS OLHOS DE AZEITONA E DO CORAÇÃO DE AMETISTA.

Olívia, a Menina dos Olhos de AzeitonaOnde histórias criam vida. Descubra agora