No total, Aaron dormiu três horas seguidas antes de se revirar na cama e seus olhos se recusarem a fechar. Toda a conversa que tivera com o irmão no laboratório era repassada diversas vezes em sua mente, deixando seu peito pesado e os músculos tensos.
Não gostava de mentir para Nathan, o fazia sentir-se como sua mãe. Infelizmente, a necessidade de fazer algo certo às vezes lhe forçava a seguir por caminhos que não costumavam agradá-lo, mas que seguia mesmo assim. Algumas coisas simplesmente eram maiores que outras.
– Eileen, desbloqueia meu celular – resmungou com a voz rouca do sono mal dormido.
A IA não respondeu nada. O quarto apenas foi preenchido pelo barulho quase silencioso do celular reiniciando. Sem nenhuma pressa, ignorou todas as mensagens enviadas nas últimas horas e aperto o nome de Scott. Escreveu algo como "Venha para minha casa" sem grandes especificações, sabendo que ele entenderia, e largou o celular ao seu lado, na cama.
Dava para ouvir do outro lado da parede o irmão esbarrando em alguns objetos e dando alguns pulos que certamente eram mais engraçados vistos do lado de fora. Ele estava jogando.
Nathan era meio frustrado por nunca ter sido deixado instalar o chip de realidade virtual. Pedira um em seu aniversário de 16 anos e recebeu um "não" nem um pouco ressentido. Aaron detestava ser o irmão chato, então prometeu que até pagaria pela cirurgia quando completasse 21 anos. Estava apenas esperando pelo momento em que o garoto se tornasse mais adulto e não o quisesse mais.
A cirurgia era simples. No máximo uma hora para colocar um chip no pulso da mão não dominante, para evitar desconfortos. Uma pequena parte do aço ficava para fora, tão lisa quanto a própria pele, para que pudesse ser codificado no jogo e assim o introduzisse na realidade deste. Antes de liberar o paciente, o médico passava um tipo de verniz que impedia de ficar grudando em qualquer ímã por aí. Aaron nunca quis saber o nome daquilo. Gastara uma fortuna, na época, para cinco anos depois resolver tirar o chip.
– Peça pro Scott me encontrar no laboratório. Ele sabe qual.
Aaron desligou o celular novamente antes de pôr os tênis. Não queria ser interrompido.
Ele estava esperando-o no sofá de couro preto sintético enquanto uma pílula de cafeína dissolvia na boca. O tempo todo perguntava se o irmão continuava no quarto; a resposta era sempre a mesma.
Um barulho agudo e monótono anunciou que o reconhecimento facial identificara Scott e já o deixava entrar, com seus passos pesados e assobiando uma música qualquer.
Seu amigo era uma figura interessante. Um homem grande em todos os sentidos e se assemelhava a um saco de músculos bastante simpático. O braço esquerdo era fechado com tatuagens e o outro... não existia. O perdeu entre as engrenagens de uma máquina com defeito. Então, Aaron lhe fez um braço biônico de pasta nuclear, e alguns filamentos de ouro e titânio para permitir certa flexibilidade. No fim, Scott não quis colocar o revestimento de pele por cima.
– O que vamos aprontar hoje? – perguntou, deslizando a mão pela cabeça raspada. O que não tinha de cabelo em cima, tinha no bigode cheio e estranhamente modelado.
– Quero iniciar o teste experimental – Scott continuou calado, sem entender exatamente. – Comigo.
As sobrancelhas se arquearam à medida que a boca se abria.
– Não vai ser um experimento, idiota. Vai ser pra valer!
Não houve resposta. Aaron se levantou e seguiu para o elevador, esperando que Scott estivesse atrás. Não era um assunto para qualquer ouvido. Quando viu Nathan em seu escritório, percebeu que, se continuassem naquele ritmo, seu irmão descobriria que Aaron não estava ignorando os papéis de Eileen de fato.
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Todos os Nossos Tempos
Science FictionUma cientista sem o reconhecimento devido cria uma máquina do tempo de acordo com os estudos de Albert Einstein. Mas havia um motivo para ele nunca ter feito uma. Afinal, ilusão ou não, o tempo não é algo com o qual se deva brincar. Pode ser caótico...