Irish

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Aproximadamente 1 ano atrás

O voo para Dublin estava sendo um suplício para a minha sanidade. Como se não bastasse à noite sem dormir e a tensão pelas descobertas, ainda tinha a proximidade da minha amiga, sentada ao meu lado por horas. Tudo isso estava me deixando maluca. Fiquei velando o sono de Kate com medo que o pesadelo que sempre a assolava a importunasse. Arrumei as mechas de cabelo negro que caiam do seu coque, sempre bem-arrumado, sobre a sua testa. Sempre me perguntei como seriam seus cabelos na cor natural. Não tinha a mínima dúvida de que seriam lindos. Vermelhos e encaracolados. Contrastariam com a pele alva, olhos azuis e sardinhas que pipocavam em cima do nariz. Essas que, na maioria das vezes, eram cobertas por uma maquiagem leve.
A minha ideia era ficar o menor tempo possível na Irlanda. Sei que eu poderia ter feito uma videoconferência, ou até mesmo acionado algum agente da Interpol, mas precisava ver com meus próprios olhos as evidências da morte do padrasto da minha amiga. Notei uma movimentação na poltrona ao meu lado: Kate estava agitada.
– Shiii... Reddy, eu tô aqui... – A abracei acalmando-a, mas o improvável aconteceu: sua boca procurou a minha num beijo intenso e selvagem, suas unhas arranharam a minha nuca enquanto me puxavam para um maior contato. Correspondi como se a minha vida dependesse daquilo. Nem em meus sonhos eu poderia imaginar o gosto daquela boca. A realidade fora muito melhor: Que delícia de beijo! Ela gemia e murmurava coisas que eu não entendia, devido ao estado de torpor em que eu me encontrava. Completamente anestesiada. Maravilhosamente, arrebatadoramente... anestesiada.
– Jen... – Aquelas três pequenas letras foram um banho de água fria e, sem conseguir me conter, levantei correndo soltando-a dos meus braços. No pequeno lavabo da aeronave, fiquei longos minutos me olhando no espelho. Como eu consegui ir do céu ao inferno em poucos segundos. "Carajo. Culo de tu madre!". Ela estava tendo um sonho erótico com a residente. Novamente, estava feliz e triste ao mesmo tempo. Naquele banheiro minúsculo, ouvindo o barulho ensurdecedor das turbinas do avião, eu tomei a decisão: assim que terminar o caso me afastaria da minha amiga, mesmo que isso doesse demais.
Pedi para a comissária de bordo um café e me dirigi até meu assento. Kate se encontrava de olhos fechados. Sentei-me ao seu lado, suspirando.
– O que foi? – Perguntou com a voz cheia de sono enquanto aceitava o café que eu oferecia.
– Bom esse sonho, hein? Pelo jeito que você gemia e a sua expressão... deu até um calor aqui. – Comecei a rir, mesmo sem a menor vontade. Kate ficou enrubescida. – Quer falar sobre isso?
– Não. – Disse seca.
– Vamos, preciso saber... é a primeira vez que vejo a minha melhor amiga aparentando ser "normal". Conta pra mim! É a gostosa da sua residente, né? – Baixou os olhos e fez um movimento quase imperceptível confirmando. – Bem que eu vi o interesse dela por você. Toda cheia de olhares, toques... "Ai, Doutora, me possua!".
– É coisa da sua cabeça, ela não iria querer nada com alguém como eu e... eu sou hétero. Nunca me relacionei com mulheres.
– Ah, ok! Então é assim: a gente coloca uma coisa na cabeça e se aparece um sentimento não pode porque já está pré-definido que você é uma ou outra coisa? Para de bobagem, mulher! Pra que se rotular!?
– Você sabe da minha criação católica.
– Sei, e sei toda a história da sua santa mãe que deixava o escroto do seu padrasto abusar de você.
– Ash, é errado perante os olhos de Deus.
– Sério, Kate? Sério que você acha que o velhinho maluco lá em cima me vê como algo abominável? Ou pior, você me vê como uma aberração? – Comecei a me desesperar por nunca haver pensado em tal possibilidade.
– Não, não... nada disso. Não pra você... pra mim... Gosh... Eu... tô tão confusa. Não sei mais no que pensar. – Cobriu o rosto com as mãos e percebi o quanto ela estava mexida com aquilo tudo.
– Reddy... olha pra mim. Veja bem, você mesmo me confidenciou que se sentia frígida e assexual. Que depois dos abusos e do cárcere você nunca mais sentiu desejo por ninguém. Foram 14 anos, Kate! E não tô falando apenas do teor sexual, me refiro a 14 anos sem um toque, sem se deixar abraçar, sem beijos, sem se sentir amada...
– Eu acho que nunca me senti amada na vida. – Ai, Carajo, que vontade de gritar para ela o quanto eu a amava.
– Então, por que se prender a convenções? Por que normatizar tudo? Daqui há alguns anos vamos discutir se é correto relacionamento com aliens... – Ela gargalhou lindamente e as covinhas do rosto apareceram. – Sério, você vai ver. Sociólogos de todo o mundo já falam que será muito mais comum as pessoas se apaixonarem por indivíduos, independente do gênero e que a sociedade está evoluindo, mesmo que lentamente, para mudar o conceito do que é "moralmente aceitável, ou não". Kate, "All we need is love, love is all we need". Simples assim. Agora me conta... o que você sente de verdade por ela?
– Não sei ao certo. – Mordeu o lábio, o que era um tique nervoso quando ficava confusa, mas que eu achava extremamente sexy – Quando estou perto dela, eu fico completamente perdida. Não sei como me portar, o que falar, o que fazer. Seu perfume inebria meus sentidos, você entende? – "Nossa, e como!" - E me vejo desejando estar sempre ao seu lado.
– E "tesão", você sente? – Agora a minha Reddy ficou da cor da bandeira da China e concordou sorrindo timidamente. Engoli em seco e fingi transbordar de felicidade. – Essa é minha garota! Vai fundo, mulher! Não perca tempo. Ela vai ser a sua cura. E pelo que eu vejo, a loira está completamente encantada por você. – Não consegui falar mais nada. Novamente fui ao lavabo dando uma desculpa. Um nó gigantesco se formara na minha garganta e a vontade de chorar era maior que tudo. Quando enfim me acalmei já estávamos prontas para pousar.
Depois do café da manhã tipicamente irlandês, que mais parecia uma arma química, porque feijão logo cedo não é de Deus, nos dirigimos ao Departamento de Polícia para encontrar os responsáveis pelo caso. O Detetive Murphy nos mostrou as provas e Kate não encontrou nenhuma evidência de fraude nos exames realizados. O DNA realmente era o mesmo do seu padrasto.
Não pude me encontrar com a garota que o denunciou, pois essa havia se casado e fora morar na América do Sul. O irmão e a mãe de Kate também estavam morando no exterior, sem endereço conhecido. A mulher havia se casado novamente logo após a morte do marido.
– Só estou triste por não ter encontrado Dylan. – Estávamos sentadas no bar de um pub almoçando Fish & Chips e bebendo Guinness. – O meu irmão era a única coisa boa da minha vida, me seguia para todos os lugares... eu o amava como a um filho. Na verdade, toda a responsabilidade para mantê-lo alimentado e limpo era minha porque dona Gemma só sabia dos seus compromissos com o Country Club e o comissário de polícia. Os filhos não eram importantes.
– Eu pedi uma busca na base de dados da Interpool e acredito que até amanhã terei o endereço deles. – Segurei a sua mão. – Se você quiser colocar uma pedra no passado e reencontrá-los eu estarei ao seu lado.
– Eu sei... obrigada, Ash... você e o Mark são a minha única família. Você é uma irmã para mim. – "Ok. Bem-vinda a friendzone novamente, Ashley!".

O dia fora longo e no voo da volta, dormimos assim que decolamos. Acordei algumas vezes durante a noite. Percebi que a minha melhor amiga havia levantado o encosto do banco e se aconchegado a mim. O ar frio da cabine deixava suas faces coradas. Puxei seu corpo contra o meu com cuidado e notei que ela estava gelada. Solicitei a comissária de bordo uma manta a mais e coloquei em cima dela tentando maximizar o seu conforto.
– Vocês são muito fofas, há quanto tempo estão casadas? – Me perguntou uma garota sentada no acento do outro lado do corredor.
– Nós somos apenas amigas. – Respondi sem jeito.
– Mesmo? – Sorriu mordendo os lábios. – Vou te dar meu número então pra gente tomar um drink quando você quiser... – Segurei o cartão com um meio sorriso malicioso e acenei concordando.
Kate me abraçou suspirando. "Ok, isso tá ficando muito estranho.". Aproveitei a oportunidade rara e inspirei o perfume cítrico dos seus cabelos. Lógico que eu morria de tesão por ela, desde o primeiro dia, mas o que mais me encantava nela era a sua força e ao mesmo tempo sua fragilidade. Sua inteligência e empatia. Quem nos olha de fora pode achar que o cuidado todo é só meu. Mas ledo engano. A minha amiga sempre estava ao meu lado em todos os meus momentos difíceis, dos mais simples, como me cuidar depois de um porre, ou no dia mais terrível da minha vida: quando minha abuelita morreu.
Aconcheguei-a mais a mim imaginando se aquela seria a última vez que teria essa oportunidade. Kate me confidenciara que chamaria a residente para um encontro. "Amo você, chiquitita, e quero que seja feliz! Sempre!".
Deixei a minha amiga no seu apartamento e me dirigi para o Departamento de Polícia. As coisas na minha cabeça não se encaixavam. Algo me dizia que o padrasto da minha amiga tinha um comparsa. Mas quem? Algum ex-companheiro de farda?
Conferi se havia um policial fazendo a segurança da minha amiga e comecei a verificar os arquivos que haviam chegado. Todos os anos, sempre no dia 13 de agosto, um corpo de mulher era encontrado com o mesmo modus operandi em diferentes cidades do mundo. Quando Daniel era vivo, se restringia a Grã-Bretanha, mas, após a sua morte, iniciou-se por toda Europa e agora Estados Unidos.
– Agente Especial Rodriguez, aqui estão os dados que a senhora solicitou. – Um dos policiais me entregou uma folha. Notei que era o endereço da mãe e do irmão da Kate.
O novo marido de Gemma era diplomata e, devido a isso, se mudaram muito durante todos esses anos. Agora estão morando em... CARAJO... FUCKING NEW YORK! Iniciei uma corrida frenética contra o tempo verificando as datas das mortes e as cidades e BINGO! Match! Combinava!
Agora tinha três suspeitos: Gemma, Dylan e Scott, o marido. Segundo os arquivos, nunca fora encontrado DNA nas amostras coletadas nos órgãos sexuais das vítimas. Houve abuso sexual sim, mas poderia ter sido realizado com um objeto e não com um pênis. "Se realmente for isso, coitada da minha Reddy. A mãe ser omissa é uma coisa, mas isso... ser esse monstro... nossa, já é demais!" O marido diplomata era o suspeito menos provável pois, segundo os dados, em algumas datas ele estava viajando. Dylan... Dylan era o que encaixava melhor no perfil. "Meu Deus, Kate vai ficar arrasada!".
– Kimberlly, redija um mandado de busca para a residência de Dylan O'Brien. Vou te enviar o arquivo agora!
– Sim, senhora.
Liguei para o celular da Kate e ela não atendia. Nada. Continuei a tentar e nada.
– Kim, liga para a central e pede pra entrar em contato com o policial que faz a segurança da Kate. Tô preocupada. - Pedi enquanto tentava o celular da Jennifer e também não tinha resposta.
– Ash... – Minha assistente, pálida, me chama depois de alguns minutos ainda segurando o telefone no ouvido. – Fica calma... Kate foi baleada e está em cirurgia.

————
Oieee então!
Voltei.
Desculpe a demora mas eu tava editando o My Sunshine 2.
A noticia é que vai rolar ate outubro!!! Fisico no meu site e ebook Amazon!
Tuts tuts!
Beijocasssa

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