Capítulo 10 - Zander

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Após a amputação da minha perna — quando acordei no hospital —, eu a sentia como se ainda estivesse aqui, era como se os médicos não a tivessem tirado de mim, a sensação de sua presença era real. Eu podia mexer meus dedos, tornozelo, sentir a panturrilha mesmo que não houvesse nada abaixo do meu joelho. Os médicos me disseram que isso era normal, que meu cérebro entenderia que o membro não existia mais e logo estaria tudo bem.

Então, por que é que eu estou sentindo essa dor agora?

Sentado na cama, sem a prótese, esfrego minha perna da coxa ao coto, tentando abrandar este mal-estar, é tão desconfortável que ainda não consegui vestir a prótese e sair da cama. Quanto mais eu esfrego mais sinto a presença da perna amputada, deixando-me enfurecido por não saber o que fazer.

Isso não é parecido com o que senti no começo, não é mais aquela sensação de mexer os dedos ou um formigamento leve, é como se eu estivesse de novo debaixo daqueles escombros preso entre as vigas.

O celular toca ao meu lado, relanceio sobre a tela e vejo que é uma mensagem de Pilar, tiro as mãos da perna por um segundo para ler o recado.

Confirmado para às dez?

Volto a friccionar minha perna, sem conseguir responder.

— Merda! — esbravejo, batendo com as mãos sobre o que sobrou do meu membro.

Sinto um furor, meu peito queima tanto quanto minha perna, a cólera se espalha tomando conta de mim. Não deixando espaço para nada que não seja a fúria por não ser mais o homem que eu era, por ser alguém que não reconheço mais.

Sobrepujando meu ódio, arrasto-me para fora da cama e pulo numa perna até o banheiro. Jogo-me sobre a cadeira de banho, abro o chuveiro e deixo a água quente cair sobre o coto. Esperando que isso seja suficiente para desaparecer a dor.

— Zander? — Ouço minha tia bater à porta.

Não respondo. Ela insiste.

— Pilar acabou de me ligar para saber se você vai à fazenda. Eu disse que sim, que levaria você. Já está terminando o banho?

Fecho os olhos e procuro me acalmar.

— Zander?

— Sim, estou acabando — respondo, controlando minha respiração.

Aos poucos, a dor enfraquece e eu me sinto amortecido. Exatamente como quando me tiraram debaixo dos escombros. É um cansaço que me doma, a vontade é de me arrastar de volta para a cama e dormir pelo resto do dia, de me trancar num quarto escuro e silencioso e não ouvir ou ver ninguém.

Fecho a água e me retenho sentado na cadeira, esperando reunir a força necessária para me mover de volta para o quarto. Respiro fundo, dominando a vontade de chorar caído no chão. Logo eu, que desde a adolescência não sei como é chorar, percebo que meus olhos estão a um ponto de transbordarem.

Quando por fim estou seco, vestido e com a prótese, demoro ainda um minuto antes de abrir a porta do quarto e encarar minha tia, encarar o mundo ao meu redor.

— Você demorou — diz ela, assim que me vê. — Venha tomar café antes de sairmos.

Sento-me à mesa sem vontade de comer, mas antes que eu desperte o aguçado sentido da minha tia, resolvo tomar uma xícara de café e comer algumas torradas.

— Só vai comer isso? Acha que é suficiente para um homem da sua envergadura? Esses músculos todos não precisam de energia?

— Não tenho fome pela manhã — respondo, levando minha xícara até a pia para lavá-la. — Melhor sairmos logo, estou atrasado.

Sem DestinoOnde histórias criam vida. Descubra agora