Era sem dúvida, o melhor dia da minha vida, estava licenciada numa das mais prestigiadas universidades do mundo (Harvard) e hoje seria a grande festa inaugurada para os finalistas do meu curso (História Antiga). Faltavam poucas horas e de entre os vários vestidos que tinha no meu armário minúsculo do dormitório só conseguia pensar num único para esta ocasião, o vestido que a minha mãe me oferecera quando fiz os meus 16 anos, e que por muito estranho que pareça, ainda me serve - acho que não cresci muito desde essa altura.
- Penélope ? - era a minha colega de quarto, chamava-se Marie e tinha um dom especial para encontrar apuros que eu nunca antes tinha visto na minha vida, num mês conseguiu partir vários equipamentos do laboratório de egiptologia, e fracturar duas vezes o pulso no mesmo sítio, há quem diga que ela sofria de mau olhado do diabo, para mim, ela simplesmente era um pouco desastrada. - Marie, então sempre compraste o vestido que vais usar esta noite ?
- Eu comprei, só que... bem, aconteceu um pequeno incidente, digamos que teve de ir de expresso para a lavandaria e vou buscá-lo daqui a umas horas, o que vale é que aquilo trabalha ao sábado!
- Ai ai, não me digas mais nada senão esse azar passa para mim, e hoje eu preciso de muita sorte.
- Lá estás tu com a sorte e o azar, já que o vestido vai demorar podemos tratar da nossa makeup e das nossas unhas, olha as minhas, parece que andei a lavrar a terra.
-Marie! Andaste a fazer o quê com essas unhas, que horror, tira-as de cima do meu nariz!
Ambas rimos, rebolámos, partimos mais uma parte do estrado da cama, e começámos a tirar as nossas paletas, e os nossos pincéis, por muito nerds que fossemos ambas gostávamos de ser "meninas" às vezes, eu mais que a Marie, que apesar de ter uma beleza divina natural, adorava usar a sua máscara para aumentar o tamanho das suas pestanas, que já não era muito pequenas, eu no entanto, apesar de muitos elogios, não me achava tão bonita assim.
No meio de tanta brincadeira, gritaria e risos, as horas voaram, e já a Marie tinha ido buscar o seu vestido azul turquesa, que combinava com o seu cabelo cor de avelã e os seus olhos azuis penetrantes e intimidadores, mesmo sendo mulher conseguia reconhecer que ela estava muito atraente para esta noite, e que sem dúvida que ia deixar uns quantos corações partidos para trás.No entanto, ao contrário da Marie, eu vesti o meu vestido preferido, com um tom de vermelho escuro vivo, quase difícil de se encontrar, e que assentava bem nas minhas curvas de 25 anos. Decidi encaracolar só as pontas dos cabelos, que eram dourados, ao contrários dos olhos azuis da Marie os meus eram diferentes, eram cinzentos, muitas vezes a minha mãe chamava-os de tempestade, porque cada vez que me irritava ou ficava zangada os mesmos transformavam-se num cinzento carregado e parecia que realmente uma tempestade vinha aí, a tempestade Penélope!
- Vamos Penélope ? Tenho a certeza que o Dylan vai se apaixonar quando te vir!
-Cala-te Marie! Ainda te ouve, que vergonha! E agora estou da cor do meu vestido, só me fazes passar vergonha, socorro!
No corredor conseguíamos ouvir os gritos desesperados das nossas colegas de curso que tentavam despachar-se para chegar a tempo da abertura, que por sua vez prometia um cocktail de boas vindas. E à porta viam-se os namorados cansados de esperar que suspiravam de descontentamento e olhavam para as horas batendo na porta e gritando para se despacharem.
O Atrium estava cheio de vida, a decoração era simples com pequenos ramos de rosas espalhados de forma a criar um cenário de um bosque encantado saído de um filme da Disney, no meio estava um pequeno palco com uma pequena orquestra que iria tocar música clássica durante a noite, e ao lado do palco encostado a uma das paredes encontrava-se uma mesa cheia de comida e de bebida, uma espécie de buffet. Os nossos olhares eram de soslaio, ambas estávamos muito contentes, não só por causa da festa, mas também porque ambas já tínhamos emprego garantido como professoras assistentes de um novo curso que iria abrir na universidade, e estávamos prontas para a nossa nova aventura.
- Penélope! Marie! Venham para aqui! - era Félix, que também tinha um dom especial para apuros como a Marie. - Félix, que maravilha conseguiste chegar com os dois pés assentes bem no chão e com uma gravata!
- Que piadinha Penélope, o Dylan está atrasado, não consegue fazer o nó da gravata dele, já lhe expliquei inúmeras vezes, mas parece que sempre que tenta seguir as minhas instruções faz uma borboleta, não entendo...
- Oh Félix, deixa, ninguém nos entende, hoje tive uma aventura e pêras com o meu vestido, tenho que contar, vais te rir!
Pisquei o olho à Marie e afastei-me para a mesa das bebidas, desde o início da licenciatura que aqueles dois tinham uma pequena paixoneta um pelo outro, mas que recusavam-se a admitir, e com sorte hoje seria a noite em que uma de nós iria sair licenciada e com um namorado como bónus.
Fui andando pela mesa analisando as opções que haviam e quando cheguei à parte dos cocktails servi-me de uma Pina Colada que estava tão fresquinha que deu-me um arrepio pela espinha acima, ou será que terá sido da mão do Dylan que me assustou.
- Ei! Finalmente consegui pôr a gravata bem, tive de seguir um tutorial no Wikihow, o que achas?
Por muito desastrado que fosse, conseguia sempre ter um brilho diferente no seu olhar, um olhar malandro. O passatempo preferido do Dylan era assustar-me, uma vez bateu o recorde de quinze vezes num único dia, não é preciso dizer que na mesma tarde apercebeu-se da razão do meu nickname: Storm. Ele era a minha perdição, poucos faziam-me sentir como ele, quase que preenchia a lacuna que existia dentro de mim... quase... e talvez é por essa razão que nunca fomos namorados, faltava ali qualquer coisa, ou será que faltava qualquer coisa em mim...
- Um pouco torta, deixa-me ajeitar, não tens jeitinho nenhum para estas coisas, nunca tiveste. - pude sentir o bater do coração acelerado do Dylan, será impressão minha, ou estarei eu já um pouco embriagada, mas por muito que quisesse focar-me naquele pequeno detalhe fui interrompida por algo mais frustrante, por algo maior e por algo extremamente invulgar.
- BAIXEM-SE!
- AHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHH! VAMOS TODOS MORRER!
- CALA-TE FÉLIX!
- PENÉLOPE, DEITA-TE!
- ALUNOS PARA O CHÃO! IMEDIATAMENTE
E antes de desmaiar, pude vislumbrar...um furacão... a vir na minha direção... O meu corpo não reagia, estava petrificada a olhar para aquele cenário, para a destruição que aos poucos ia ganhando terreno e que vinha na minha direção... os meus colegas gritavam e atropelavam-se uns aos outros para as saídas de emergência, outros seguiriam as ordens e encontravam-se estendidos no chão... será que deveria mexer-me, mas não conseguia, por muito que tentava nenhum músculo respondia, seria aquilo a minha morte, mas não, Dylan agarrou-me e atirou-me para o chão, mas eu bati com tanta força com a cabeça contra o mármore que acabei por fechar os olhos sentindo um líquido quente a escorrer-me pela bochecha...e de repente estava a sonhar... sonhei tão alto que parecia que estava a voar, já não sentia o meu corpo, já não sentia o líquido quente, mas o sentimento que me preenchia era de felicidade, pura felicidade e quase que podia tocar no céu, quase que podia tocar nas nuvens, era só voar um pouco mais alto, estava quase... quase... quase...
- Senhora! Acorde! Ai meu deus! Chamem a Polly por favor! - céu? abri lentamente os olhos, a sensação era como se tivesse passado anos em coma e finalmente tivesse despertado de um sono profundo. A luz queimava os meus olhos, doíam-me os braços, as pernas, os joelhos, oh e a cabeça, essa era a estrela principal daquele teatro que se tinha reunido ao meu redor, e se era um teatro, até as roupas pertenciam a uma peça de 1920 - Não se preocupe vamos levá-la para o hospital mais próximo, consegue andar?
- Onde eu estou ? - ignorei a pergunta do senhor que aparentava ter uma certa idade, queria saber onde estava, queria saber como estavam os meus amigos, como estava a Marie, o Félix, e o Dylan... oh Dylan onde poderás estar? - Onde ?
- Minha senhora, está em Birmingham.
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My Dear Thomas
RomanceUma história um pouco invulgar de duas pessoas que se encontram por mero acaso, e que aos poucos se apaixonam. Penélope é uma estudante de história antiga de Harvard que é transportada para o passado durante uma tempestade que ocorre na sua festa de...