Capítulo Único

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A melodia calma e perfeita de um piano saía do notebook em cima da mesinha de vidro bagunçada. Aquela mesa aguentou muito, Bright achava. Tantos papéis com letras de músicas incompletas, lápis pequenos de tanto que foram usados, um mini teclado quase caindo no chão. Só de pensar que um dia, naquela mesa, Bright trocava a frauda de Man, dava um certo aperto no coração e uma ardência nos olhos. O músico não se lembrava exatamente quando ou como a sua vida ficou tão agitada. Talvez por ter assinado com uma gravadora e a paixão pelo seu trabalho em compor músicas tivesse ajudado. O que Bright sabia era que não tinha mais como sair daquilo. O trabalho o engolia, e ele se sentia mais distante do filho e dos amigos, e da vida que sempre sonhou.

Bright queria sair daquele redemoinho o puxando para baixo. Sem apoio, porém, era impossível. O filho o afastava e os seus amigos nem ao menos lembravam da existência da amizade, e a ideia de conseguir alguém para namorar para ajudá-lo na vida pessoal não passava pela sua cabeça.

Todos os dias, ele se perguntava como sairia daquela confusão.

🎶

Man precisava ir para a escola, mas a preguiça de se levantar era maior que tudo. Tinha a consciência de que precisava se arrumar ou chegaria atrasado para a aula, mas fazer um drama para que o seu pai fosse chamar a sua atenção só para mostrar que existia um filho e não só trabalho na vida de Bright, parecia a melhor ideia.

Como o esperado, Bright com a sua roupa escura amassada e a carinha de quem tinha ficado a noite toda acordado, abriu a porta do quarto de Man e estreitou os olhos.

— Posso saber o motivo do rapazinho ainda estar deitado? — Nenhuma resposta. — Não quer que eu pegue você no colo, quer? Vamos, Man, tenho que sair pro trabalho.

Man se sentou na cama, sentindo-se irritado como o adolescente de dezessete anos que era, então olhou o pai e fez uma careta.

— Tá preocupado comigo ou com o seu trabalho?

Bright revirou os olhos. Sabia que tinha mimado o filho na infância e agora ele havia se tornado um adolescente carente demais. No entanto, às vezes, Man conseguia exagerar.

— Com os dois. — O pai ficou sem graça. Desviou o olhar e se aproximou de Man, passando a mão pelos cabelos do garoto, sorrindo pequeno, já sentindo vontade de chorar. Era uma manteiga derretida desde quando soube que seria pai, e desde então, com tudo o que havia acontecendo em sua vida nos últimos anos, era difícil segurar as lágrimas. — Agora vai tomar banho.

— Sempre fugindo do assunto. Você não gosta de conversar comigo, pai?

— Esse drama já está chato, sabia?

Antes que Man se levantasse seguindo para o banheiro, ele disse:

— Não é drama, é a realidade, pai.

🎶

Man estava devidamente arrumado para a escola, com o seu uniforme bem passado e um cabelo bem penteado. O garoto sentou-se na mesa pronto para comer algumas frutas quando Bright passou direto, sem nem ao menos perceber a presença do filho na mesa. Bright parecia apressado com o notebook fechado embaixo do braço e o lábio inferior sendo mordido, a cabeça cheia de pensamentos junto com a ansiedade com o dia que só estava começando.

— Não vai comer, pai?

Bright parou no meio do caminho e encarou Man por um tempo.

O músico tentava negar para si mesmo, mas ele tinha perdido ver o seu filho crescer por causa do trabalho, e olhando para ele tão arrumado e tão adulto, fazia o seu coraçãozinho mole doer. Não devia ter trocado a vida dos sonhos pelo trabalho, mas precisou sustentar ele e o filho sozinho depois da morte de quem amava.

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