Capítulo I

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Minha mente atormentada compreendia que se subvertia mais uma vez as tentações daquele sonho rotineiro e aterrador, porém eu era incapaz de romper o engano de uma realidade inexistente quando a própria utopia se mostrava tão real, quase até tangível

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Minha mente atormentada compreendia que se subvertia mais uma vez as tentações daquele sonho rotineiro e aterrador, porém eu era incapaz de romper o engano de uma realidade inexistente quando a própria utopia se mostrava tão real, quase até tangível.

O denso e sombrio bosque trajava o alvo manto singelo da neve que descia serena movimentando-se livremente pelo céu noturno, pigmentando as altas árvores que engoliam minha percepção de lugar, atiçando meu pavor quando as mesmas pareciam compartilhar confidencias ao sussurrarem entre si pelos sonidos ocasionais das brisas de um inverno rigoroso em sua folhagem.

Da escuridão emergiam os mesmos selvagens, convidativos e aterrorizantes olhos azuis agressivos, cintilando enquanto sondava meus músculos retesados e feição apavorada. Nesse interstício, vindo dessa mesma direção, os rosnados faziam o ar a minha volta estremecer e com isso minha espinha acompanhava a mesma sensação. Aquela figura enigmática, inalcançável e solitária ameaçou se aproximar, contudo nesse momento eu despertava em pavor.

Naquela manhã em pleno solstício de outono suspirei pesadamente após acordar, o sonho que me acovardava se repetiu mais uma vez. Sentei-me na cama acalmando as palpitações descontroladas em meu peito, minhas mãos suadas procuravam pelo calor de Hunter, nosso cão Golden Retriever medroso e certamente um ilustre atrapalhado do qual pensei estar caçando coelhos nas fazendas aos arredores, mas apenas encontrei o livro de finanças aberto nas páginas onde adormeci.

A chegada da mais nova estação claramente sentida pelos meus pés descalços nas tábuas de carvalho geladas do piso acentuava minhas inúmeras preocupações, mais um mês havia se passado dês do dia em que minha curiosidade expusera uma realidade dolorosa para o abrigo feminino Blackmeadow que carecia de doações e devido amparo de vossa majestade.

Olhando pela janela, a névoa cobria parte da visão dos campos que vagamente se iluminavam pela claridade solar, entretanto carecia de calor pela nova estação. Percebi certa movimentação de minhas duas companheiras de quarto antes devidamente aquecidas em baixo de suas cobertas, agora se espreguiçando para mais uma das rotineiras avaliações de madame Martha Kingsley, nossa governanta.

Não tardou até ouvirmos a maçaneta da porta girar, o olhar intransigente encontrou jovens devidamente enfileiradas lateralmente em suas melhores posturas diante do esperado veredicto da mulher enquanto as mãos enrugadas das mesmas ajeitaram o colarinho preto de seu vestido recatado.

— As gêmeas se encarregarão do celeiro esta tarde. — A voz ríspida entrajava o timbre sisudo, certamente caracterizando a figura intolerante de Kingsley.

Os olhos verdes nos medindo de cima a baixo, o andar seguindo de um lado para o outro, vagarosos, instaurando certa autoridade e impaciência. Minha atenção se voltou aos passos que cessaram num átimo em minha frente interrompendo os rangidos da madeira.

— E Srta. Grace. — Levantei meu olhar em sua direção, a governanta que tinha o devido conhecimento de meu envolvimento com as questões que se destinavam a Blackmeadow, apenas advertiu-me. — É certo que não devo informa-la novamente do apreço que Sr. Wickham têm com a pontualidade em sua estalagem.

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