O MONSTRO DA MEIA NOITE

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Augusto Silva nem ouviu a chegada dele. Acordou de um sono profundo. Acordou porque um dedo estava fazendo cócegas embaixo do seu nariz. Acordou e viu o que parecia ser o monstro de um pesadelo acima da cama. Um olho brilhou com suavidade à luz do banheiro, à luz que ele sempre deixava acesa quando estava em lugar estranho.

Quando Augusto abriu a boca para gritar, o monstro fechou as narinas dele com os dedos de uma das mãos e cobriu sua boca com a outra. Augusto começou a se debater.

— Shhh — sussurrou o monstro, com a mesma indulgência satisfeita da mãe que fala com o bebê na hora de trocar a fralda.

Augusto se debateu ainda mais.

— Se você quiser viver, fique parado e em silêncio — disse o monstro.

Augusto olhou para ele, arquejou uma vez e ficou parado.

— Você vai ficar em silêncio?

Augusto assentiu. Seu rosto estava ficando muito vermelho.

O monstro afastou a mão, e Augusto começou a ofegar compulsivamente. Um filete de sangue escorreu de uma narina.

Os olhos de Augusto eram enormes na escuridão. Sua língua saiu da boca e lambeu os lábios. Deitado na cama, com o lençol na altura dos tornozelos ossudos, ele parecia a criança mais velha do mundo.

— Eu tenho dinheiro — sussurrou ele, apressadamente.

— Não é o seu dinheiro que eu quero, Augusto — explicou o monstro. — Se quiser estar vivo quando o sol nascer, você vai falar comigo, dr. Silva. Vai me ensinar. Serei sua plateia de um. Vou prestar atenção e ser um bom aluno. E recompensar essa aula poupando sua vida. Entendeu bem?

— Sim... mas o quê...?

O monstro levou os dedos aos lábios, e o médico parou de falar no mesmo instante. Seu peito magrelo subia e descia rapidamente.

— Vou contar algumas histórias e a aula vai começar. Você deve falar sobre tudo. Tudo o que souber, tudo o que desconfiar, tudo o que supor — orientou o monstro. — Está pronto para essas histórias, dr. Silva?

— Estou — respondeu o médico.

Trecho de "A incendiária", de Stephen King.

Os nomes e algumas frases foram mudadas para evitar spoilers e se adequar à minha história.

— Irma era uma mulher bonita, nos seus quarenta e poucos anos. Desejo de qualquer homem e invejada por quase todas as mulheres do vilarejo Estrela, ela atraía olhares de todos quando passava — começou o monstro. — Desde muito jovem aprendeu a viver. Ia e voltava sozinha da escola; era a menina de quem todos queriam ser amigos; nunca sentava sozinha para almoçar e sempre ajudava quem pedia: ela tentava mesmo sabendo ser impossível. Todos os dias ela tinha um sorriso estampado no rosto, com seus dentes perfeitamente alinhados e brancos. Mas esse sorriso muitas vezes era forçado. Estava ali para ninguém a atormentar procurando saber o que acontecia em sua vida. Estava ali para que ela pudesse fingir que tudo estava bem, que nada do que acontecia de fato acontecia. Às vezes é melhor fingir um sorriso do que contar a verdade.

"Ela ia o mais cedo possível para a escola e caminhava rápido. Na volta, saía o mais tarde possível e caminhava lentamente, quase parando; observava a paisagem, os pássaros, as pessoas, as casas, os sons. Tentava demorar o máximo para voltar para casa. Fazia o trajeto que poderia ser feito em vinte minutos em quase uma hora (às vezes passava disso, se realmente não quisesse voltar). Cheirava as flores, entrava nas lojas para ver as mercadorias, conversava com quem quer que puxasse assunto e não tinha pressa para acabar o papo, sentava no meio da rua para descansar. Caminhava a passos curtos e lentos, observava o céu e as nuvens (dava formas à elas: um cachorro, um tanque de guerra, uma cozinheira, uma pá, três ursos embolados, um saco de lixo com restos de comida apodrecendo) e apreciava o vento que batia em seu rosto. Nos dias mais frios, queria se esquentar no fogão à lenha da sala da sua casa, mas, ao lembrar do que acontecera na última vez, preferia se encolher em suas roupas, colocar as mãos nos bolsos e pegar um resfriado. Mas não voltava cedo para casa.

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