ARMÁRIO

1 0 0
                                    

A mão suada escorregou na maçaneta, fazendo Roberta perder alguns segundos. Ela secou a mão na calça jeans e apertou a maçaneta com as duas mãos, virou lentamente e entrou no quarto. Fechou a porta rapidamente e olhou ao redor. O quarto estava escuro, o que era bom. Ela via poucas coisas no cômodo fracamente iluminado por um feixe da luz amarelada vinda do poste da rua que invadia a casa, se quebrava na cama e se estendia pelo chão, acabando em uma ponta afiada.

Com cuidado, ela atravessou o quarto e abriu o guarda-roupas. Em cima, havia prateleiras cheias de camisas e calças. Embaixo, os cabides seguravam suas melhores e mais caras roupas. Roberta empurrou a metade dos cabides para um lado, se agachou e entrou no armário, virada para o quarto. Fechou as portas e esperou.

Pegou o celular, colocou no modo silencioso e abaixou o brilho que, mesmo no mínimo, continuava alto. Precisava ficar no escuro. Não podia ser vista por, por... aquilo. Estava ofegante, graças à fuga que acabou de fazer. Roberta sentou e percebeu que uma parte de um vestido havia ficado presa embaixo de si. Com um puxão, arrancou o tecido do cabide e o deixou sobre si, uma proteção inútil, mas mesmo assim.

Pegou o celular e digitou a senha errada cinco vezes. Teve que esperar trinta segundos e a digitou mais uma vez errada, acertando na sétima tentativa. Seus dedos deixavam marcas na tela, que dificultavam o toque. Limpou o celular e entrou nos contatos. Procurou "DANIEL" e ligou para ele. Uma mensagem gravada da operadora avisou que seu saldo estava baixo e completou a ligação depois de uns vinte segundos que pareceram uma eternidade. Daniel não atendeu e caiu na caixa postal. Roberta desligou apressadamente e ligou de novo. Enquanto chamava, Roberta abriu a porta do roupeiro com cuidado e espiou.

O quarto continuava escuro. Tudo estava como Roberta vira há alguns minutos, menos a porta. Antes, ela estava fechada, mas agora estava aberta. Roberta prendeu a respiração. Ouviu uma voz chamando seu nome e começou a suar. Engoliu com dificuldade e percebeu que Daniel havia atendido o telefone e a chamava. Roberta desligou o celular e olhou pela fresta da porta. Ainda prendendo a respiração, ela viu algo se mexer pelo espelho do banheiro. A coisa estava a apenas alguns passos dela. Fechou a porta e pela primeira vez em muitos anos, rezou.

***

oito minutos antes

Roberta estacionou o carro na frente de sua casa. Anoitecera há pouco, o clima estava bom, um pouco quente, mas bom. Roberta pegou sua pasta no banco do carona e olhou no espelho do carro. Havia olheiras, o cabelo estava bagunçado, a pele negra tinha algumas manchas, mas Roberta não se importava.

Saiu do carro e ligou o alarme. No caminho que levava para a porta da frente, Roberta viu as flores secas no chão e prometeu dar água para elas, coisa que pensava em fazer quase todos os dias e se esquecia depois. Procurou a chave no bolso do blazer e abriu a porta. Viu alguma coisa se movimentar atrás de si e se virou, mas não viu nada, apenas o carro.

Entrou na casa e trancou a porta. Tirando os desconfortáveis sapatos de salto, suspirou e passou as mãos pelo cabelo. Estava cansada após o longo dia de reuniões e palestras e toda a coisa chata do seu trabalho.

Foi para a cozinha, abriu a geladeira e pegou a jarra de água. Abriu a porta do armário dos copos e ouviu um alarme vindo da rua. Serviu-se de água e tomou tudo que havia no copo. Guardou a jarra e ligou a TV da sala. O alarme continuava tocando. Roberta espiou pela cortina da janela e viu que as luzes do seu carro estavam piscando. Pegou o chaveiro do carro e foi para fora. Apertou um botão no controle, mas o alarme não parou. Tentou mais uma vez, ainda sem sucesso. Bateu o controle na mãe algumas vezes, e finalmente conseguiu desativar o alarme. Olhou para os lados para ver se havia alguma coisa que pudesse ter ativado o som, mas não encontrou. Provavelmente foi o vento ou algum animal de rua. Ou um assassino, ela pensou, mas logo afastou essa ideia. Os livros e filmes de terror haviam plantado essas ideias bestas na sua cabeça, e ela não podia fazer nada para evitar que esse tipo de coisa viesse à sua mente quando estava sozinha em casa, o que era quase todas as noites. A porta bateu atrás dela, assustando-a. Foi estranho que a porta fechasse com tanta agressividade, visto que não havia vento. Pelo menos as flores não se sacudiram.

MonstrosDonde viven las historias. Descúbrelo ahora