Capítulo 1

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Uma semana depois eu estava atrás do balcão da cantina atendendo aos pedidos. Claro que eu não tinha necessidade de estar ali, mas eu gostava, e tio Max sempre disse que a fachada de bom comerciante era o melhor para esconder o que éramos.

Claro que tenho uma boa renda guardada, fruto do meu trabalho noturno. Tenho meu apartamento para as horas em que necessito ficar sozinha. Mas por que sair ostentando? É na simplicidade que estão as melhores coisas. Gosto de trabalhar na cantina, isso faz com que me sinta totalmente humana e uma pessoa normal. O único que não trabalha conosco é Fred, ele e tio Max sempre discutiram em relação a isso, mas Fred era um teimoso e resolveu fazer faculdade de jornalismo, hoje ele trabalha como repórter free para um famoso canal de TV, e nas horas vagas faz o serviço sujo ao meu lado.

Enfim, como ia dizendo, eu estava atrás do balcão marcando os pedidos, a cantina estava lotada.  Atrás de mim, no alto da parede estava a TV para que os clientes tivessem alguma distração enquanto aguardavam seus pedidos. Anunciava uma espécie de vírus que estava levando várias pessoas aos hospitais, segundo a repórter, era um tipo de nova gripe que poderia matar em menos de quarenta e oito horas.

Eu estava tentando prestar atenção à reportagem, quando meus olhos se voltaram para a porta giratória, e em quem acabava de passar por ela. E, em um milésimo de segundo, senti calafrios por todo meu corpo, meu estômago subiu até minha boca, e eu engoli em seco. O passado voltou com tudo em minhas lembranças.

 Tentando me recompor do susto, eu levei minhas mãos até meus cabelos extremamente pretos e lisos, tentei alisar minha franja, em seguida verifiquei meu avental xadrez em branco e verde para ver se não tinha nem uma mancha. Como se aquela peça horrível sobe meu corpo pudesse ajudar em alguma coisa.

Respirei fundo, e coloquei o meu melhor sorriso no rosto, aguardando que a parede de músculos bronzeados coberta por roupas pretas, com o emblema da polícia federal no lado direito do peito, com 1,95 de altura, cabelos castanhos cortado ao estilo militar, olhos cinzas, e a boca mais suculenta que eu já havia beijado, se aproximasse do balcão. Ele seria o homem perfeito se o nosso passado não tivesse sido um desastre. Desastre que literalmente partiu meu coração, deixando sequelas. Esse homem fez com que eu desacreditasse em relacionamentos perfeitos.

Há anos eu não o via, e ele aparecer ali de supetão, era um aviso de que problemas estavam chegando. Ao pensar nisso e junto com algumas lembranças de como ele me abandonou em um momento delicado, para ir trabalhar na embaixada Brasileira no EUA. Rapidamente tirei meu sorriso do rosto, e adotei uma postura mais séria.

 Ele se aproximou com um sorriso matreiro, como se cinco anos tivessem sido ontem, encostou o cotovelo no balcão, e eu tentei imaginar quando ele teria voltado, mas nunca perguntaria. Fiquei em silêncio.

 Estática.

 Aguardando as surpresas do destino.

— Olá Sol. — Aquela voz rouca e sedutora, me levou para um tempo em que palavras doces e quentes eram sussurradas em meus ouvidos.

— Como vai Thor? — respondi no mesmo tom, cruzando os braços, como se nosso último encontro não existisse, se ele podia ser indiferente, isso serviria para mim também. Durante anos eu imaginei esse momento, fantasiei cada gesto, cada palavra que diria nesse reencontro, mas pelo que eu estava vendo, não seria como nos meus sonhos.

— Você não mudou nada. — ele disse me dando um olhar avaliador.

— Depende o ponto de vista. — respondi pegando um pano e fingindo limpar o balcão, ele sabia que eu estava nervosa, e isso me irritava. Thor sempre foi capaz de adivinhar meu estado de espírito.

— Tenho certeza Solene! Você não mudou nada. — eu parei de esfregar o balcão e o encarei. Aquele olhar cinza, poderia ser frio como aço, mas no momento apenas me olhava com diversão. O filho da puta estava zombando de mim?

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