Zayn entrou no quarto sem bater, já presumindo que Louis não levantaria do seu reino de depressão para atender a porta. O lugar cheirava à choro, álcool e provavelmente presunto podre, mas ilustrava um Louis jogado na cama como um objeto qualquer que tinha sido derrubado ali sem cuidado, com suas pernas enroladas em um cobertor de tecido quente e um travesseiro por cima da cabeça.
― Louis. Chega. Sai daí agora, levanta.
Murmúrios. Nada. Louis sequer se mexeu, se manteve imóvel às imposições do melhor amigo.
― Eu to falando sério, Lou. Chega disso, vamos. ― Zayn pendeu o travesseiro para o alto, revelando um lençol encharcado de choro constante e desenroscou a coberta entrelaçada nos pés do garoto, que rosnava.
― Eu não quero sair daqui. Me deixa em paz, Zayn.
― Você tá nesse quarto quente e fedido há semanas. Se eu te deixar aqui por mais algumas horas suas moléculas vão se juntar com esse presunto estragado que você provavelmente deixou pra comer mais tarde. ― Louis se deitou de costas, continuando calado ― Eu sei que é difícil, e eu não exigi que tudo ficasse bem desde o início, mas já se passou um mês, Lou. Um mês.
― Tanto faz, Zayn. As coisas perderam o sentido pra mim, incluindo você. Aliás, à que eu devo a honra da sua visita? Você sumiu, pensei que não fosse mais aparecer. ― Louis bufou com um sorriso irônico e sem humor nos lábios.
Ele sentia falta de Zayn. Zayn e todo o seu carinho paterno. Mas ele havia desaparecido na última semana, largando-o na mais pura solidão misturada com o maldito presunto. Por mais que o xingasse quando o garoto aparecia diariamente para o dar um banho minimamente decente ― já que Louis mal conseguia esfregar o sabonete pela perna sem se sentar e começar a juntar suas lágrimas com a água corrente ―, e gritasse para que ele fosse embora quando ele preparava sopas e chás para alimentá-lo, Louis sabia que precisava de tudo aquilo, sabia que precisava de Zayn ali, cuidando dele, e em algum canto bem profundo de si mesmo ele conseguia até mesmo admitir que adorava a atenção que recebia. Quando Zayn parou de aparecer, a última coisa que restava na sua vida parara de fazer sentido.
― Era difícil vir cuidar de você quando tudo que você fazia era me xingar, choramingar e se rebater desesperadamente nos meus braços. Sem contar as vezes que você tentava me bater. ― Louis riu, refrescando a mente com as cenas cômicas em que ele tentava avançar no amigo como uma criança birrenta de cinco anos. ― Você precisava de tempo e de espaço pra se acalmar e em algum ponto, ou alguma das vezes que você me chutou, eu entendi isso. Eu nunca te deixaria sozinho, eu sabia que você precisava dos cuidados, mas também sabia que você precisava sentir falta deles.
― Você é a porra do pior melhor amigo que existe. Quando foi que você começou a estudar psicologia?
― Eu sei que eu sou, obrigado, obrigado. ― Zayn acenava como uma miss que acabara de ganhar o concurso mundial de beleza. ― E por isso você me ama.
― Você fica mais gay a cada visita que você faz.
― Isso é transmissível? Eu estou sentindo, Louis, eu to sentindo a transformação... você tá sentindo essa energia inundando o quarto? Eu to sentindo as células gays invadindo meu corpo! Você nunca me avisou que isso era contagioso! ― O garoto berrava em falso desespero enquanto Louis gargalhava, fazendo Zayn sorrir ao ver que era a primeira demonstração de felicidade que ele arrancara do garoto em semanas. ― Como eu faço pra parar isso?
― Não tem como, é o ataque gay. Você nunca viu Crepúsculo? Todos passamos por isso. Você veio pro lado do mal, Zayn. Não tem mais volta, você tem que se aceitar como o arco-íris ambulante que você é, é o seu destino.
― Eu sempre soube que você era má influência. ― Zayn disse com o mesmo tom de voz da mãe, que sempre odiara a presença de um garoto que gostava de garotos na sua mesa de jantar, mas sempre sorria para Louis e sempre que podia tentava isolá-lo no quarto com a irmã do melhor amigo. E se o convívio com Louis tornasse Zayn gay? ― Enfim. Eu conheci um cara.
― Eu sempre esperei por esse dia. ― Louis disse, animado, colocando as mãos abaixo do queixo com curiosidade. ― Sua mãe nunca mais vai me deixar pisar em casa por ter te tornado gay.
― Não, seu babaca. Um cara pra você.
Era a milésima vez que Zayn oferecia isso. O cara que sentou ao seu lado no trem, o homem que havia catado a pipoca que ele deixara cair no chão do cinema, o novo funcionário da padaria que ele frequenta e até mesmo seu sobrinho.
Louis arrancou as mãos debaixo do queixo bruscamente, se virando de costas para Zayn carregando um beiço nos lábios.
― Eu não quero.
― Louis. ― Zayn o fitava fixamente e sua voz saia em tom sério e preocupado. ― Você vive trancado nesse quarto há um mês, se alimentando de presunto velho e ar. Nem sei há quanto tempo não toma banho. Eu sei que as coisas com o Stan foram turbulentas, mas acabaram e você não pode se prender à ele pelo resto da sua vida. Ficar aqui enjaulado não vai trazê-lo de volta pra você. Nada vai.
― Eu o amo, Zayn. Você não entende.
― Não saindo desse quarto você nunca vai parar de amar. Além do mais, ele é bonito.
― Quem?
― Seu futuro namorado.
― Puta que pariu, Zayn.
― E inteligente.
― Foda-se.
― Já disse que ele parece ser bom de cama?
― Zayn, eu não sou um desesperado. Eu não sou a porra de um usuário do Tinder e nem pretendo ser. ― Louis berrou, se levantando e catando os restos de comida espalhados por toda a casa, logo depois ligando o ar-condicionado e afofando a fronha suja e bagunçada. Eu sei que as coisas ficaram meio esquisitas depois do nosso término mas tudo vai voltar ao normal. Viu? Eu já estou arrumando tudo.
― Meio esquisitas? Você se demitiu do trabalho e se afastou de todo mundo pra se internar nesse quarto. Você não paga o aluguel e daqui a pouco vai ser despejado do apartamento e não vai ter nem uma mísera cama pra se enterrar durante o dia inteiro.... você perdeu sua vida por causa do otário do Stan. E sabe o que ele tá fazendo agora? Isso mesmo, transando com algum qualquer que ele conheceu numa esquina, porque ele não tá nem aí enquanto você chora que nem uma criancinha que deixou o picolé cair no chão. ― Louis começou a chorar. Mais uma vez.
― Sai daqui. Agora. E não precisa voltar mais. ― Zayn jogou a mão por cima dos olhos cobertos, sentindo o deja vú de que tudo começaria de novo. ― Vai embora.
Mas as coisas não começariam de novo. Não dessa vez.
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Muffins
FanfictionInternado em um quarto há meses, Louis havia largado o emprego e se afastado de todas as almas vivas que conhecera após seu último término. Seu melhor amigo, Zayn, faz de tudo para que ele reencontre um novo amor, ou, ao menos, uma companhia.