Alexander

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 Poderia ser um dia pacato e banal na cidade de Nova Iorque.

 Os arranha-céus emoldurando a vista de meu mais novo apartamento, as buzinas dos carros que circulavam pela rua nobre onde residia, a breve brisa daquela manhã primaveril adentrando a pequena fresta da janela do meu quarto, as pessoas (que mais pareciam pequenas formigas e pontos disformes, pelo que meus olhos poderiam captar do décimo terceiro andar do meu loft) que circulavam pelas ruas já cheias daquela manhã com suas vidas apressadas e desinteressantes... A barulheira, a vista impecável, tudo era monótono sob meus olhos. Mas, como eu disse, poderia ser um desses dias em que eu fitaria a janela, recém tendo despertado e completamente entediado com a minha vida perfeita.

 Poderia.

 Mas não era um dia comum, não mesmo. Aquela era uma sexta-feira amena da primavera do pior ano da minha vida.

 A sexta-feira em que Alexander William Lockhart iria se casar.

 Existem coisas na minha vida que eu nunca iria duvidar: minha habilidade para desenho, meu sucesso adquirido com tal talento, minha mania de organização que talvez nunca fosse cessar, meu bom gosto para vinhos e mais uma lista infindável de atos, coisas e minhas manias que me caracterizavam. Mas existia um item, um único item na minha vida que não poderia nem sonhar em encaixar-se na minha lista de “certezas”. Se existisse uma lista de “dúvidas” na vida de Alexander Lockhart, o item “casamento” estaria no topo dela.

 Eu nunca quis me casar. Nunca sonhei em conhecer alguém que fosse bom para mim o suficiente para me arrastar para uma igreja, ou cartório, e me possuir para o resto da vida. Impossível e fora de cogitação. Desde minha adolescência, eu era simples, até mesmo sistemático, com meus relacionamentos e não pretendia mudar. Eu não pertenceria a ninguém, era o que eu sempre acreditei.

 Até conhecer Evellyn Stout, a famosa arquiteta e empreendedora de inúmeros imóveis nova-iorquinos. E também a mulher que eu não amava. Nunca amaria. Enfim.

 Assim que me levantei, afastando os lençóis de seda escuros, a calça fina de meu pijama azul escuro sendo a única peça que me recobria o corpo, e empurrei meus fios negros para trás, eu tentei ao máximo não lembrar que, ao fim do dia, eu seria um homem casado. Respirei fundo, o ar saindo, logo em seguida, por entre meus lábios em um bufar, já denotando que aquele não seria um dos meus melhores dias. Eu já estava de mau humor, eu já estava lutando para erguer-me e arrastar-me pelo meu quarto mal iluminado, quando o telefone tocou.

 Grunhi, as mãos se esfregando por minha face, enquanto aquela preguiça clara parecia não querer abandonar meu corpo e o toque estridente de meu celular me provocava ainda mais desmotivação. Visivelmente irritado, saltei da cama com fingida animação, para alcançar o aparelho no rack diante de mim, logo ao lado da prateleira de aço repleta de meus DVDs de clássicos de ficção-científica (Guilty pleasure, eu sei).

- Gustav. – Minha voz soou rouca e extremamente cansada. Não que eu estivesse esgotado, pelo contrário. Eu sempre acordava animado para mais um dia de trabalho, de criações e de uma vida monótona, que não parecia tão indiferente sob os meus olhos, até então. Como sempre, eu dormia cedo demais para um homem da minha idade (vinte oito anos, por sinal) e aquela preguiça, aquele cansaço fingido, tinham outro nome: receio.

- Alexander! – A voz animada de meu irmão ecoou do outro lado da linha e eu me segurei para não xingá-lo. Aquele telefonema possivelmente não passaria de alguma conversa fútil de meu irmão mais novo, mas, ainda que talvez eu tivesse acordado em um péssimo humor, eu ainda tinha prazer em deixar Gustav tagarelar. Ele era a única coisa que me transportava para casa, para minha família. – Alexander? Está me ouvindo?

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