CAPITULO II

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Adentremos então, nos pormenores. Naquilo que a partir de agora passarei a lhes informar sobre esta trajetória de vida. Recheada dos mais variados sentimentos e revelando o coração inexperiente e receoso de Emanuel. Um menino pobre e simples, que fora abandonado pela mãe, quando ainda nem havia completado seus três anos de vida.

A partir daí, fora criado por sua tia, Raimunda – irmã de sangue de sua mãe. Sua mãe o deixara, assim mesmo, desprotegido e incapaz ainda de pronunciar as palavras corretamente nos lábios – principalmente, porque lhe faltaram a alimentação minimamente necessária a qualquer criança em fase de crescimento. E isto, havia limitado o seu pleno desenvolvimento, físico e também cognitivo.

Se comparado com garotos de sua idade, era notável sua fragilidade. A debilidade era evidente, uma vez que seu porte físico era demasiadamente débil. Como não possuía condições financeiras de sustentá-lo, sua mãe resolveu deixá-lo aos cuidados de sua irmã – a bela jovem chamada Raimunda, que possuía uma vida financeira bem mais tranquila. Digamos que ela soube tirar a "sorte" grande na vida.

"E como soube..." – Raimunda sempre se vangloriava aos risos.

Contudo, a mãe do menino não avisou a própria irmã do que havia pretendido, sobre si mesma e sobre o destino de seu filho, Manoel.

E, estando determinada, deixou a criança um dia aos cuidados da irmã e nunca mais fora vista. Resolvera procurar vida melhor em outro lugar. Afastou-se de todos que a amavam, e, como já se sentia culpada pela única vida miserável que podia dar ao próprio filho, fugir, em sua mente, e deixá-lo com a irmã rica, era sua melhor opção – pelo menos naquele momento – ainda que este não fosse o desejo sincero de seu coração.

"É um sacrifício necessário que preciso realizar. Sou forçada a fazer isto. Mas, meu coração dói, sangra" – refletia a jovem mãe angustiada.

Ademais, não seria fácil abandonar seu filho que tanto amava. No entanto, pelo menos diante daquela situação esta seria a melhor coisa a ser feita. Certamente partiria seu coração, mas acalentaria sua alma. Acreditava em dias melhores. Tinha esperança, possuía fé.

"Quem sabe um dia, as coisas mudem e poderei voltar e tentar recuperar o tempo que será perdido com esta minha decisão hoje" – ponderava e tentava consolar a si mesma com estes argumentos.

Mas, talvez, só ela e Deus saberiam explicar como começara a fragmentar seu coração quando começou o pender para esta decisão. Era imensa a tristeza e também a dor pela separação, tendo de abandonar seu filho, fruto de suas entranhas e ser que alimentara até os dois anos com o néctar da vida – o leite materno.

"Sinto como se estivessem arrancando uma parte de mim, de meu próprio corpo" – e chorava.

No entanto, o que ainda a confortava era o fato de que, se de todo, não melhorasse de vida e nem pudesse um dia regressar, ao menos a criança poderia ter um futuro melhor, crescendo num lar que o acomodasse e lhe proporcionasse uma vida mais digna, pois seria criado por sua irmã – o que, de certa forma, lhe transmitia segurança, paz.

Sentia-se diante de sua realidade, extremamente incapaz de ser sua provedora.

"Seria minha missão trazer à luz uma vida inocente para sofrer e padecer de fome? – repetia ela. "Não, definitivamente não".

Este não era o futuro que sonhara nem para si, quanto mais para aquela criança que veio assim, meio sem planejamento, mas, totalmente inocente.

"O pecado não é seu, então, porque teria ele, meu filho, de pagar pelos erros dos de nós, adultos – retrucava condenando-se por se deixar enganar por um malandro, um aproveitador.

O abandonoOnde histórias criam vida. Descubra agora