Capítulo 3

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POV - Lisa

– Você... você consegue me ver?

Eu passei a noite a admirando e andando ao seu lado, em uma posição super protetora, mesmo que nada pudesse fazer se algo acontecesse com ela de fato. A segui pelas ruas escuras até seu dormitório, corroída pelos olhares maliciosos que ela e a amiga recebiam, olhares que ambas nem notavam.

Minha irmã já havia desistido de mim por aquela noite. Ela não gostava de se apegar aos Resplandecentes, só pediu para que eu não demorasse muito, pois iriam dar falta de mim.
E ali estava eu, quase um dia depois ainda sem voltar para a vila. Não apenas observando a garota com certa obsessão, mas sendo observada de volta...

Eu nunca ouvi nenhuma história sobre isso. Os Embaçados andavam livremente, com seus corpos de névoa atravessando paredes e portas sem ao menos precisar abrir, passavam diretamente sobre os corpos dos Resplandecentes e eles nem nos notavam. E agora um deles me encarava. E falava comigo. E eu compreendia...


Sua voz era diferente dos ecos distantes do meu povo. Era clara, nítida. Me fazia querer ficar.
Eu tinha que ir embora antes que me entrelaçasse demais. Não era bom desenvolver afeição por eles dessa forma. Mais do que isso, era proibido.

Mas seus olhos grudavam em mim como uma corda bem apertada. E se ela não estivesse os movendo de forma tão frenética, podia até considerar que estava morta, já que o restante de seu corpo permanecia imóvel. 

Gradativamente, sua cabeça fez um movimento para cima e para baixo. De início, não entendi o que aquilo significava, mas logo percebi que ela estava respondendo à minha pergunta. Sim, ela me via. E sim, ela sabia que eu era diferente de qualquer coisa que ela já vira. Provável que me considerasse monstruosa, sua expressão mortificada indicava que sim.

Eu não a culpava. Mas para mim, ela a criatura mais bonita da Terra.

– Quem é você? – Ela repetiu.

– Eu me chamo Lisa. – Dei um nome. Um nome que não define em nada o horror de onde eu venho e o que eu sou, mas como explicar algo assim? Porém ela pareceu se contentar.

– Lisa... – Ela repetiu, assimilando. O som da sua voz mais claro que qualquer coisa que eu já tenha escutado. Mais nítido até do que a voz da minha irmã, com quem eu compartilhei uma existência inteira.

– E o seu nome? – Disse incerta.

– Rosé.

Percebi que ainda estava por cima dela, naquela posição estranha. O esforço para não a tocar estava indo embora. Não queria que ela percebesse ainda mais o quão eu era estranha ou a transparência do meu corpo.

Mas também tinha medo de que se eu me afastasse de seu campo de visão – o que provavelmente era a coisa mais certa a se fazer – ela parasse de me ver.

Porém antes que eu pudesse tomar qualquer decisão, ela moveu sua mão em direção ao meu rosto. Por que Rosé estava se aproximando de mim dessa forma? Ela não conseguia ver o quão horripilante eu era?

Tive tempo de me afastar, correr para longe dela. Mas eu parecia presa, só esperando a distância de sua mão encurtar até o vazio de mim. Quem sabe só aí ela se desse conta do quão errada eu era.

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⏰ Última atualização: Oct 21, 2020 ⏰

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Do Outro Lado Daqui ~ ChaelisaOnde histórias criam vida. Descubra agora