Capítulo Quatro

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Nos dias que se seguiram, Naruto levou Sai ao topo da Colina Verde. O menino pálido esperava encostado na cerca, enquanto o outro levava o balde com o leite de Asami de volta para casa. Frequentemente o garoto loiro sentia os braços doloridos à noite, depois de carregar Sai no carrinho de mão. Apesar disso, não conseguia deixar de fazê-lo. Era comum que justificasse a si mesmo, deitado na cama, que apenas fazia aquilo por ser altruísta. Às vezes usava a desculpa de que a mãe o obrigava a acompanhar o garoto, porque era do feitio dela. Contudo, no fim das contas, ele simplesmente queria estar lá.

Suas manhãs nunca haviam sido tão extasiantes, por mais que passasse a maior parte do tempo deitado na grama, lendo gibis. Sai não falava muito, mas, quando falava, suas palavras não pareciam vir de alguém com apenas quinze anos. Algumas vezes eram explicações complexas sobre a comunhão dos seres vivos e a harmonia das almas. Outras eram comentários afiados que faziam Naruto paralisar, ou dizer algo bobo por não ter uma resposta. No fim do dia, refletia sobre tudo, olhando as estrelas através da janela.

Suas tardes, passadas no quarto, eram calmas e divertidas. Os assuntos transitavam por caminhos mais conhecidos a Naruto, que ria dos comentários leigos de Sai sobre super-heróis. Muitas vezes o garoto loiro se irritava quando o outro chamava seus quadrinhos de "cultura de massa", mas a irritação nunca durava muito. As pequenas discussões eram praticamente unilaterais, visto que Sai expressava tanta raiva quanto uma porta.

A pintura de Sai prosseguia com lentidão, segundo ele. Naruto ainda não tinha tido permissão para vê-la e, a cada dia passado, sua curiosidade aumentava. Perguntava-se sobre quais sentimentos teria quando a visse, se o artista iria conseguir tocá-lo mais uma vez, como havia feito na pintura do templo. Mesmo ansioso, Naruto se comportava, evitando até mesmo olhar para o garoto, a fim de não o atrapalhar.

No sexto dia que o acompanhava ao cume da colina, deitado a apenas um metro da cerejeira, Naruto olhou Sai de soslaio. As folhas da árvore projetavam sombras no rosto branco, onde, na testa, havia uma mancha azul. O cenho do garoto estava levemente franzido, concentrado no que quer que estivesse pintando. Os seus lábios contraídos nunca estiveram tão expressivos e seus olhos, tão vivos. Naruto teve a impressão de ver um relance do Eu verdadeiro de Sai, que vinha à superfície apenas quando ele estava passando suas mais profundas emoções para o papel.

Por um momento, Sai permaneceu em sua própria bolha, movendo os lábios sutilmente, sem notar os olhos azuis sobre si. Quando finalmente percebeu, sustentou o olhar como se visse através dele, como se não pesasse mais do que uma pluma. Naruto foi o primeiro a desistir, desviando os olhos para a copa da árvore, na qual alguns raios esquálidos de sol permevam as folhas. Pela primeira vez, ele sentiu o coração apertar.

— Onde você vai estudar quando as férias acabarem? — perguntou a Sai, enquanto rolava uma pedrinha entre os dedos, que havia encontrado na grama.

— O Danzou disse que iria matricular eu e Shin na escola da cidade. — o tom de voz do garoto era impassível, como sempre. Naruto sentiu-se aliviado por ele não ter notado sua inquietude ao observá-lo.

— Shin é o seu irmão, não é?

— Na verdade nós nos conhecemos no orfanato e sempre fomos muito próximos. Ele me estimulou a pintar para expressar meus sentimentos. — respondeu, voltando sua atenção para a pintura mais uma vez.

— Eu acho que você tem alguma sorte! — o garoto loiro ergueu uma das mãos, para sentir os raios sobre a palma. — quase ninguém tem a chance de escolher os membros da família, mas você encontrou um amigo que se tornou um irmão. Vocês podem até não ter os mesmos pais, mas talvez não fosse tão incrível se tivessem. — Naruto sorriu, pensando que gostaria de ter um irmão mais novo.

A Última Casa da ColinaOnde histórias criam vida. Descubra agora