Capítulo Três

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Nos dois dias que se seguiram ao resgate de Sai, Naruto foi ordenhar e colocar Asami para dentro do curral com o pensamento de que não veria o garoto subir a colina. Havia se tornado um hábito vê-lo subir pelas manhãs e descer pelas tardes. Em todo hábito interrompido há uma perturbação natural, principalmente em um lugar onde todas as tarefas eram bastante rotineiras e repetitivas.

Na verdade, contudo, o garoto não tinha certeza de que queria voltar a ver Sai. Algo nele o inquietava e não era só a aparência fantasmagórica ou o fato de que ele era inegavelmente irritante. Não, também havia o fato de que Sai era um desconhecido, não só por ser um morador novo na Colina Verde, mas porque tudo ao seu redor parecia ter uma aura de mistério. Ele ter evitado as perguntas do garoto só aumentava a latente curiosidade de Naruto.

No terceiro dia em que os olhos azuis verificavam a estrada, Sai subiu a colina.

Como da primeira vez que o viu, Naruto carregava o balde de leite para casa e, mais uma vez, algo o fez olhar para trás, para a estrada. Sai subia obstinadamente, como sempre fazia, sem desviar o olhar de seu caminho, com a mochila nas costas. Porém, diferentemente das outras vezes, o garoto usava muletas e tinha o tornozelo do pé direito enfaixado. Também diferente das outras vezes, Naruto deixou o balde cheio no meio do pasto, em um súbito ímpeto de alcançar Sai.

O garoto correu e pulou a cerca com agilidade, tantas foram as vezes que fizera isso. O ex-menino-fantasma olhou por cima do ombro antes que o outro o alcançasse, talvez pelo som dos passos. As íris negras se destacam no rosto branco e, por um momento, Naruto só conseguiu olhar para elas. Parou ao lado de Sai, com a respiração ofegante. Seu rosto era analisado tão cuidadosamente, que se sentiu nu.

— Eu pensei que você não subiria mais a colina! — apontou para o pé enfaixado, erguendo as sobrancelhas.

— É para isso que servem as muletas, para eu andar. — aquele sorriso sutil, misto de desdém e pureza apareceu em seus lábios e o semblante de Naruto se fechou.

— Você conseguiu torcer o pé quando tinha os dois pés bons, imagina com um só! — o rosto do garoto loiro já começava a ficar rosado de irritação e aquilo era mais comum do que ele gostaria.

— Agora tenho três pés funcionais e um defeituoso. Talvez eu esteja mais equipado. — a expressão de Sai era imperturbável. Naruto deu um tapa na própria testa, mas riu.

— Você realmente tem resposta para tudo. É muito irritante.

— Eu tenho perguntas para tudo também.

— Tá bom, sabichão, espera aqui! — Naruto começou a se afastar.

— O quê? Por quê?

— Não vou deixar você subir a colina sozinho de novo. Como vou explicar para os meus pais que precisamos te resgatar mais uma vez às escuras? — o loiro já estava pulando a porteira de madeira e deu um sorrisinho faceiro e aberto. Sai apenas piscou os olhos, com a expressão resignada. — Não ouse sair daí!

O mais rápido que podia, Naruto correu pelo pasto, carregando o balde de leite. Vez ou outra o leite transbordava um pouco pelas bordas, mas o menino apenas esbravejava com ninguém em específico e continuava a correr. Naruto não precisava de qualquer justificativa para estar fazendo algo por um garoto que nem conhecia. Ele apenas sentia que esse era o certo, ajudar as pessoas sem medir esforços. Se era tão importante para Sai subir a colina e era algo que ele fazia com determinação mesmo com o tornozelo torcido, Naruto sentia que deveria ajudá-lo a cumprir um objetivo tão nobre. Pessoas como Sai o inspiravam.

— Mãe, vou ajudar o Sai a subir a colina! — entrou correndo na cozinha e deixou o balde de leite sobre a mesa. A resposta da mãe veio do andar de cima.

A Última Casa da ColinaOnde histórias criam vida. Descubra agora