melodia

254 37 10
                                    

Apesar de aparentar ser um homem bruto – com sua cara enfezada, corpo robusto, barba espessa e as diversas tatuagens que serviam de agravante para um pré-julgamento – Adam era o oposto de tudo isso. Quem o conhecia intimamente sabia disso.

Foi assim com todos, mesmo com seus pais. Que tiveram de descascá-lo, atravessar cada camada até ver o seu interior. Quem Adam era de verdade. Com eles aprendeu tudo o que sabia e se tornou uma pessoa melhor. Aprendeu que não deveria ter medo, ou se envergonhar, de demonstrar o que sentia. Que guardar tudo para ele mesmo que veneno. Não fazia mal somente a ele, mas também às pessoas ao seu redor.

Naquele momento – o homem de aparência durona – se debulhava em lágrimas. Rolavam pelo grossas e constantes pelo rosto rígido. A tristeza estava entalhada em suas rugas, pelos dias de angustia. Sua esposa e filhos já haviam saído do cômodo, minutos atrás, e coube a ele sustenta o peso do último adeus.

Adam se acomodou melhor na cadeira. Fora uma desculpa para apertar os braços do objeto, uma tentativa de fazer com que suas mãos parassem de tremer. Ele olhou para a cama por um instante, para a mão ossuda que repousava perto da beirada. Esticou o braço e segurou a mão com suavidade. Passou a acariciar a pele enrugada, os nós dos dedos. Aquele aperto que sentia no peito aumentava a cada segundo. Era claustrofóbico. Ainda mais fitando a expressão sorridente do mais velho, como se aquilo não fosse nada demais.

— Pai... — Adam balbuciou. Estranhando a própria voz, que era rouca e trêmula. — Aguente firme. Resista. Não me deixe.

Ele pediu. Era uma súplica, pura e real. Não sabia ao certo o que pedia, não resistiu ao ímpeto proferir as palavras. Ia contra tudo que o médico havia falado e refalado. Parecia que estava em um barco à deriva. Remava a todo custo contra a maré.

O velho homem sorriu. Um sorriso frouxo que lhe esticava as rugas dos olhos e do canto das bocas. Os olhos estavam fixos em um ponto qualquer do cômodo, eram pálidos e vazios devido a cegueira.

Ele chamou o filho com um balançar débil de mão. Quando Adam se aproximou o suficiente ele afagou o rosto redonda do filho e enxugou suas lágrimas.

— Já briguei diversas vezes na minha vida. — Disse ao mais novo. A voz era rouca e arrastada. Frágil como seda. — essa é uma batalha que não posso vencer.

Adam fungou, beijando a mão do pai. Tentando se aproximar um pouco mais ele arrastou a cadeira, mas seu joelho bateu no beiral metálico, aquele era o limite.

— Podemos tentar. — Ele insistiu. Uma teimosia herdado do pai à sua frente.

— Porque? — o velho indagou,— Porque eu lutaria com algo que me fará bem?

Adam lhe lançou um olhar exasperado. O coração lhe espancava as costelas só por imaginar o pior.

— Que bem à na morte? — Protestou. As lágrimas tornaram a pelo seu rosto. Como se o seu pai poderia estar tão indiferente aquilo?!

— ela me levará até o seu pai. — o mais velho disse sonhador. Viajando em lembranças. Momentos felizes da sua família que o fez rir baixinho.

— E me deixar sem o outro. — Adam retrucou em lamento.

O senhor balançou a cabeça, dando tapinhas na mão do homem. Aquela conversa não levaria a lugar nenhum. Não tinha como lutar, mesmo se quisesse.

— nós te criamos bem, Adam. Você sempre foi independente. À, sim. Lembro como custou você nos chamar de pai. — Ele sorriu nostálgico.

— eu fui um idiota. — adam admitiu

— em algum momento de nossas vidas todos fomos um pouco idiota.

Você leu todos os capítulos publicados.

⏰ Última atualização: Oct 23, 2020 ⏰

Adicione esta história à sua Biblioteca e seja notificado quando novos capítulos chegarem!

Em algum lugar alémOnde histórias criam vida. Descubra agora