Primeira Mente: John Mergout, Primeiro Sinal.

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  Mais um dia monótono de trabalho, a noite começa a cair, os papéis da minha mesa começaram a diminuir e finalmente chegou o fim do turno. Desligo meu computador, levanto da cadeira e sigo para fora do prédio. 

  Minha sala fica no canto direito do andar 17, onde tem várias pessoas em cubículos mexendo com relatórios e números, no meio disso tudo tem eu cuidando do setor, sou John Mergout, supervisor do departamento de finanças da Aikor Enterprise, cuidamos da área agrícola e de alguns problemas que vêm com dividas e coisas assim. 

  Dia 31 de outubro, fim do expediente, pego o elevador e desço até o térreo do prédio, passo pela recepção e quando vou passar pela porta, seu Jorge o guarda que cuida dessa área olha para mim e diz:

  - Que noite não senhor Mergout, o céu está tão limpo, acho que hoje não cai mais nenhuma gota de chuva, de qualquer modo, uma boa noite senhor.

  - Sim seu Jorge, a noite finalmente chegou ao fim, chegar em casa e descansar um pouco, tenha uma boa sorte hoje, boa noite.

  Ele confirma com a cabeça e eu vou saindo do prédio, ando algumas ruas e nisso noto as fantasias e crianças andando pela cidade, finalmente Halloween, me sinto encantado por essa época, é a única onde eu realmente consigo aproveitar, que me tira da rotina, dar doces para crianças, comer alguns chocolates e ter aquela nostalgia. 

  Na rua do estacionamento vejo passando um homem alto, obviamente não é um adolescente e se for tem uma maquiagem excelente, ele vêm passando enquanto olha para mim. O homem tem 2,05m de altura, olhos cinzas como se fosse cego, grandes olheiras, pés de galinhas, cabelo liso e branco, corpulento, usa um sobretudo preto que trás a sensação de um pirata, blusa branca por baixo, uma calça moletom e apoiado nos ombros uma âncora quase que da sua altura. Ele chega mais perto e para na minha frente:

  - Boa noite meu senhor.

  Ele faz uma reverência e volta a andar.

  Fiquei desconcertado obviamente, mas após alguns segundos de reflexão comecei a subir em direção ao meu carro. Parado no terceiro andar um Jeep Renegade, aperto na chave e ele destrava e nisso um vento forte bate, as grades balançam e eu ouço algo quase como um assovio no meu ouvido como se me chamasse:

  - Mergout...  

  O vento fica cada vez mais agressivo, um temporal começa a se formar, por mais estranho que seja vou andando até o carro e de novo uma rajada de vento sopra e dessa vez consigo ouvir melhor, a voz de uma mulher misturada ao vento me dizendo:

  - Mergout, sinto... sua voz...  

  O clima só piora, o vento bate cada vez mais forte, o tempo de chuva que estava se formando veio com tudo, relâmpagos começam a cair, os trovões reverberam o ambiente, as gotas da chuva engrossam conforme vou correndo até o carro e quando chego para abrir sua porta um clarão aparece e o som estrondoso entra em meu ouvidos, tudo fica em silêncio por alguns momentos e a voz da mulher dessa vez soa muito mais limpa em minha mente:

  - Mergout, sinto seu corpo, sua voz, sua mente grita em desespero por socorro, como não consegue ouvi-la? - Algumas palavras são ouvidas como se fossem borrões em uma tela ou palavras rabiscadas em um papel -

  Minha visão fica meio embaçada e depois de alguns segundos volta ao normal, aquela voz, ela me chamava ou é só um delírio da minha mente cansada? 

Eu não sei dizer o que houve, mas com toda a certeza eu preciso chegar em casa e descansar, meu dia foi cheio demais para tudo isso. Abro a  porta do carro, entro e o ligo.

  ******

  Seguindo pelas ruas da cidade, vejo mais uma vez as pessoas fantasiadas de diversos monstros e criaturas da cultura do terror, desde clássicos como Jason e Freddy Krueger, até criaturas de H.P Lovecraft, eles realmente se esforçaram esse ano. Eu ainda me lembro um pouco da infância, todos me falavam que eu era muito desanimado e quieto para minha idade, mas sempre achei normal a prática da leitura e o que eu não sabia na época, a valorização do silêncio.

  (Mergout segue até seu apartamento enquanto lembra da infância e dos seus livros bobos, ele estaciona na garagem, sobe o elevador e entra em seu lar.)

  A casa está organizada como sempre, vou até o banheiro, tomo um banho, escovo os dentes enquanto observo no espelho meus olhos vazios e negros, eu sempre fui assim, travado, silencioso e monótono, o famoso sem sal, antipático ou excluído do grupo. Suspiro e vou até meu quarto.

  Eu abro a porta do quarto e fico parado o encarando e ao piscar me deparo cara a cara com uma árvore antiga nativa brasileira, um grande jatobá e no meio dele há um buraco, atrás de mim algo pega em meus ombros e sussurra no meu ouvido:

  - Pegue meu rei e me ajude a trazer novamente igualdade aos seres que jazem no vazio eterno, peço por perdão se eu errei, mas por favor, aceite ser por mais uma vez o meu rei que protegerá nossas posses e súditos.

  A voz doce e penetrante de uma mulher é ouvida, e não uma mulher qualquer, minha rainha, aquela que por mais de uma vez jurei andar junto e proteger, aquela nostalgia e melancolia que sempre senti começam a se esvair, lentamente vou andando até o circulo aberto no centro do grande jatobá e vou me lembrando do seu longo vestido branco, olhos cinzas, cabelos cobertos por um grande véu e em cima de sua cabeça uma grande coroa branca que em sua ponta possui uma pedra preciosa vermelha escarlate que grita para os conscientes e sãos o quanto esse mundo é louco e vazio para nossas vontades. Chego cada vez mais perto e de lá de dentro existe uma escuridão imensa que é perturbada por uma pedra negra quase roxa que brilha de vez enquanto minha rainha diz novamente:

  - Mergout, sinto seu corpo, sua voz, sua mente grita em desespero para que todas essas sensações se esvaiam logo, como não conseguia ouvir  meu chamado? Eu quero muito lhe proteger desse seu desespero, a minha coroa grita por você e a sua mente me responde de volta mesmo que não perceba Mergout, sempre estive a te esperar, a esperar por uma fagulha onde eu pudesse me apoiar e te trazer de novo a mim.

  E então finalmente peguei minha coroa, virei e olhei nos olhos de minha rainha, minha deusa caída, quem eu mais amei durante meu curto tempo do outro lado e que fez de tudo apenas para estar junto a mim. Fui andando até ela, me ajoelhei e a entreguei minha coroa e com ela em mão ela diz:

  - John Mergout, como sempre houve de ser, você retorna e mais uma vez declara sua benevolência a mim, de agora em diante você ganha seu titulo de Rei Brando Da Monotonia.

  Ela coloca a coroa em minha cabeça, anunciando assim o reerguimento de seu império na terra e me consagrando como seu maior guardião e amor.

  - Minha rainha, lhe prometo a sua tão desejada volta e de que tomarei o cuidado que deixei de tomar na ultima grande guerra.

  E enfim me levanto vendo que a adorável rainha me aguarda, para um caloroso abraço antes da tempestade começar.

  "Nos tornemos um com nossa monotonia insana e finalmente nos veremos completos."

 - John Mergout, Rei Brando Da Monotonia.

Contos de uma mente insana.  Primeiro capitulo: RessureiçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora