Capítulo 2

28 4 0
                                    


— Então, como está se sentindo hoje?

Me perdi outra vez em algum ponto da sala, pisquei algumas vezes e olhei a psicóloga que me encarava com seus pequenos olhos por detrás do óculos.

— Bem.

Foi rápido, rápido demais para ter saído com alguma verdade. Acho que pecamos muito nisso, "tudo bem?" virou uma forma de cumprimento. É reflexo, você já sabe que é de bom tom responder que sim. Parei de novo e deixei minha visão desfocar no fio branco da perna dela. Provavelmente ela deve ter um gato em casa. Você tinha um Turkish Van, o Fred.

Será que dos tantos "tudo bem?" que eu já te disse, algum "sim" seu foi verdade? Será que eu perguntei realmente querendo saber? Não, claro que eu queria saber, mas será que eu mostrei que eu realmente estava ali pra te ouvir? É, acho que não...

Ela pigarreou alto, assustei, tinha feito de novo.

— Diego, nossa relação só pode ser firmada se você me possibilitar entrar na sua vida. Você consegue reconhecer o motivo de estar aqui?

Concordei com a cabeça. É óbvio que sim.

— Bom, tive uma conversa com você por telefone e imagino pelo o que está passando. Ter a vida completamente revirada de um dia para o outro não é fácil, temos que concordar.

Ficamos em silêncio, observei os prédios e os carros tão pequenos pela beirada da janela. Do lado do sofá havia uma mesinha com lenços. Pensei em como alguém conseguia chorar aqui, a sala abrigava algumas plantas e uns livros. Acho que o objetivo era dar um aspecto de "lar", não sei se é só pra mim, mas tudo parece tão clínico. Definitivamente não era um lugar para se chorar. Tudo era tão sólido, tão vazio. Se eu te contasse você ia querer vir só para chorar e assoar o nariz como se estivesse num filme. Sorri.

— Preciso que seja totalmente franco comigo, leve o tempo que levar. Vou respeitar os seus limites e suas escolhas... Acha que está pronto pra falar da Grande Noite?

Ela deu ênfase no "grande noite". E sinceramente? Por mais poético que pareça, só a menção me enrijeceu completamente.

— Não.

Ela sorriu, talvez num sorriso que considerasse "maternal" e disse na maior paciência como quem explica algo para uma criança de três anos:

— Tudo bem. Tudo ao seu tempo. Mas me conte um pouco sobre você. Precisamos estreitar as relações, não é mesmo? Quantos anos você tem?

— 27.

Ela iria jogar pelo lado didático. Ótimo, eu acho.

— Soube que trabalha no jornal Hora Certa. Qual coluna?

— Esportes.

— Tá brincando!? Você escreve o Sampa Esportes?

— Sim! Fico feliz que você conheça!

— Eu assino o Hora Certa há uns três anos, adoro a coluna de Ciência e Tecnologia — sorriu.

—Fico agradecido, não é querendo me gabar mas a edição recente tá incrível. — brinquei — a Fatos & Cliques é comandada pela Laura Coelho, ela arrebenta mesmo.

— Ah, muito legal! Você pratica algum esporte?

— Já joguei muito futebol, hoje em dia só sou um entusiasta mesmo...

Rimos.

— Tenho um sobrinho estudando jornalismo... Acho uma profissão muito interessante!

—Que legal, desejo sorte! É uma área maravilhosa... Qual o nome dele?

Um Lugar Para Você Onde histórias criam vida. Descubra agora