PARTE I

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Flocos de neve caiam preguiçosamente do lado de fora da casa dos Morrison, cobrindo a extensão do que no verão foi um belo gramado verde.
O aroma doce de biscoitos recém assados e da deliciosa torta de maçã, receita secreta da vovó Judi, impregnava o ar da agitada casa, deixando as crianças eufóricas na esperança de roubar um ou dois pedaços.
A decoração colorida dava vida a casa, que na maior parte do ano era silenciosa e apagada. Os piscas-piscas no quintal iluminavam a noite gelada e coloriam os olhos de quem passava na rua, muitas vezes tremendo com o frio cortante do mês de dezembro.

— Vovó, o Luiz pegou minha boneca — choramingou Aninha, com os pequenos olhos ficando inundados de lágrimas. Suas bochechas coradas ficaram ainda mais vermelhas quando tentou conter o choro iminente.

— Venha, minha querida.

Judi se sentou em uma cadeira de madeira com estofado marrom avermelhado e bateu levemente a mão na coxa, indicando onde a pequena menina deveria se sentar.
Quando a criança estava acomodada, passou os bracinhos pelo pescoço da avó e a apertou com força.

— Ele sempre estraga minhas coisas, vovó.

Judi sorriu e passou as mãos pelos cabelos escuros da garotinha. Escuros como o do pai.

— Olhe para as meias — a senhora apontou seu fino e enrugado dedo para a lareira, onde cinco meias grandes e decoradas estavam penduradas — amanhã, quando acordamos, na sua meia terá uma linda boneca, como a que você pediu ao Papai Noel, já na meia do Luiz, apenas um pedaço de carvão.

— Um pedaço de carvão?

— Sim, minha querida, o Noel não vai presentear os meninos que se comportaram mau durante o ano. No lugar do que pediram em suas cartas, aparecerá apenas carvão.

Os olhinhos de Ana aumentaram de tamanho e em sua boca um pequeno sorriso apareceu.

— O Noel vai castigar o Luiz? Eu queria muito que ele fizesse isso, o papai e a mamãe dizem que ele é meu irmão mais velho e que eu tenho que o escutar...mas ele é tão chato, vovó.

— Você não pode desejar o mal a outras pessoas, meu bem, isso faz de você uma criança ruim. Deixe que o Noel decida se vai mandar sua Sombra para encontrar o Luiz ou não.

Os olhos de Ana piscaram com interesse. Brilhando contra as luzes coloridas que enfeitavam a grande árvore no centro da sala.

— A Sombra do Noel? 

— Nunca lhe contei a história?

A menina apenas balançou a cabeça em negação e voltou seu olhar para seu irmão que ainda segurava sua boneca entre as mãos, sorrindo com um dos primos mais velhos.
Judi passou as mãos pelos cabelos brilhantes da neta e sorriu.

— Chame as crianças. Contarei a história de Fouettard.

A sombra do Noel Onde histórias criam vida. Descubra agora