CAPÍTULO II - O que você quer?

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Um barulho forte. A chuva tinha aumentado e, daquela vez, tinha trovões gritando. Bellini acordou com um susto e levantou a cabeça para avistar Micael. Ele dormiu com a cara no livro e uma lapiseira metálica em mãos. Estava descoberto apesar do frio, então Pilar se levantou e o cobriu até os ombros. Ele faria o mesmo, ela tinha certeza. Ela levou sua mão até o nariz e o coçou bruscamente, notando um dos motivos pelo qual tinha despertado. A maioria das vezes em que o tempo mudava ela espirrava sem parar e coçava o nariz. Seus pais já a tinham levado no hospital para saber do que se tratava quando menor, onde descobriram a existência de uma alergia.

Ela deu alguns passos antes de pôr uma das mãos sobre a maçaneta gelada e abriu a porta. O corredor estava totalmente escuro e deserto, exceto pela fraca luz da lua que ainda aparecia por causa das cortinas mal fechadas do fim do corredor. O banheiro ficava bem em frente ao quarto de Micael, mas ela não o alcançou.

Uma mão grosseira se fechou completamente em seu pulso e a puxou no meio da fumaça de escuridão.

Aqueles castanhos escuros eram inconfundíveis, além das sobrancelhas grossas. Era possível sentir em seu rosto a respiração de Vítor Tupã. Seu corpo estava quente, como se estivesse febril. Aquele era o seu normal. Ele se aproximou o suficiente para que sua discrição não acordasse seus irmãos nos quartos ao lado, afinal, aquilo não fazia parte do plano.

Seus olhos estavam cobertos por uma falsa serenidade. Tupã, na verdade, estava turbulento e sua própria respiração entregava aquilo. Ele exalava um cheiro agradável, fresco e forte difícil de identificar, como se beirasse flores e álcool.

— Você está transando com o meu irmão? — perguntou ele, franzindo a testa — Ficou maluca, porra?

— O que você pensa que está fazendo?! — ela rebateu, notando que seus movimentos não o afastavam — é claro que eu não estou... — dizer aquela palavra soava extremamente bizarro em voz alta — fazendo nada com o Micael.

Pilar estremeceu quando sentiu a manga do moletom cinza de Tupã roçar em uma de suas mãos. Aquilo fez seu coração acelerar e seus olhos piscarem ainda o dobro de vezes. Isso tirando o fato do seu perfume tirar sua atenção como uma espécie de hipnose. Ela não podia se tornar uma refém do mesmo homem novamente. Evitar aqueles lábios e os olhos carregados de confusão era perturbador e a fazia querer resistir aos pensamentos involuntários que cercavam a sua cabeça, como recordar as reclamações de Micael a respeito das pessoas da área de recursos humanos. Pense na burocracia, em como existem os protocolos chatos... Talvez fosse necessário ter prestado mais atenção para detalhar os documentos transcritos em sua imaginação.

— O que você veio fazer aqui? — perguntou, transferindo o peso de uma perna à outra. E cruzou os braços.

— Vim entregar o diário do seu avô — explicou, levantando novamente uma de suas mãos para coçar o nariz — Eu sei o quanto é importante para vocês e não queria que fosse jogado fora.

Ele observava seu nariz vermelho com a testa franzida.

— Mas começou a cair um temporal e o motorista me deixou a alguns quarteirões antes do campo porque a lama poderia acabar com o carro — murmurou, escondendo as mãos que se esfriaram dentro do moletom — nunca mais dispenso o meu motorista.

Vitor a encarou impiedosamente à espera de algo, reforçando os braços cruzados. A pressão lhe causou arrepios, como se seus olhos ganhassem mãos e martelassem suas condenações feito um juiz.

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⏰ Última atualização: Dec 13, 2023 ⏰

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