Suspeitas

74 15 177
                                    

Capítulo 1

Manu

Calor.

Muito calor.

Aquela palavra já me fazia mal antes mesmo de ser pronunciada por meus lábios selados. Somente pensar nela já me fazia suar em bicas.

E não era somente aquilo que me atormentava. O barulho insano de conversas paralelas, a voz gritada da guia explicando cada quadro e seu significado me causavam um leve enjoo e dores de cabeça.
Realmente eu não estava bem, precisava ir para casa. Mas havia um impedimento. 

Eu estava no meu trabalho e não em um parque de diversões onde eu podia ir embora a hora que me desse vontade.

Eu tinha contas para pagar com Joaquim. A obra que fizemos no apartamento de minha avó custou caro, tanto eu como ele tivemos que abrir mão de muitas coisas para deixar o nosso lar com a nossa cara e aquele trabalho que me deu aquela oportunidade.

O senhor Mendes não iria aceitar minha desculpa de estar passando mal e me deixar ir embora.
Segundo ele estávamos em um dia muito especial, o de exposição. 
Era o dia em que a galeria mais lucrava, pois pessoas influentes e com dinheiro iriam lá para ver o que tinha de melhor e comprar deixando rios de dinheiro em cada canto daquele local pomposo.
Lembrar daquelas palavras me deixavam ainda mais nervosa pois estava a ponto de colocar para fora a metade do sanduíche que comi no almoço.
Era só o que me faltava ter alguma infecção ou problema estomacal justamente naquele dia.
Deveria amaldiçoar joaquim por ter colocado maionese no meu sanduíche? 
Com o calor que estava fazendo não iria me admirar que tivesse estragado e eu, a cobaia ambulante que se ferrou no fim das contas.

Levantei do chão de onde eu estava catando um papel de bala que uma criança deixou cair e tive que me apoiar na parede por conta de uma leve vertigem que me acometeu.

— Manu está bem? — Gabriel me questionou.

Olhei para o lado e tentei sorrir. Nem havia me dado conta de que ele havia chegado ali.

Gabriel tinha uma péssima mania de andar deslizando por todo o piso e sua chegada quase nunca era identificada por muitos colegas de trabalho. Somente Adélia o conseguia escutar o que era uma vergonha para os mais novos pois ela era uma senhora de setenta anos que pelo visto tinha uma audição muito melhor que a nossa.

— Não é nada Gabe. — Falei levantando meus longos cabelos cacheados e secando o suor de meu pescoço.

— Não é o que parece. Está com cara de quem comeu algo estragado. 

— Estou com uma aparência tão ruim assim? O senhor Mendes não irá gostar disso. — Falei tentando colocar humor em minhas palavras, mas pelo franzir na testa de Gabe vi que ele notou o tom preocupado que minhas últimas palavras enotaram.

— É linda Manu. Nem que se você quisesse ficaria feia. — Ele passou meu braço por seus ombros largos e me deu apoio me encaminhando para o banheiro feminino.

Agradeci com o olhar e tentei ignorar a expressão carinhosa que ele mantinha em seu belo rosto.
Gabe era um cara legal e de aparência bela. Parecia um anjo com seus cabelos loiros escuro, olhos cor de avelã que se você olhasse com mais atenção poderia ver alguns riscos verdes se sobressaindo pela íris. Sua altura era elevada em comparação a minha e estar ao seu lado era como estar ao lado de um poste. Ele somente perdia centímetros estando ao lado de Joaquim, que era ridiculamente alto chegando a quase 1,90.

Todos sabiam que Gabe nutria sentimentos por mim. Por mais que eu tentasse fingir que ali não havia nada era impossível. 
Gabe dava mais sinais de que um sinal de trânsito.
Parecia que ele ignorava que eu tinha Joaquim. 
E era óbvio que não contei para meu namorado ciumento o que ocorria na galeria. Era só um amigo apaixonado, inofensivo. 
Se eu contasse para Joaquim iria ser o fim para Gabe e um armagedon de proporções épicas.
 Como naquele momento em que seu hálito com odor de hortelã invadiu meus sentindos.

Amor PerfeitoOnde histórias criam vida. Descubra agora