Mas ele deixou de olhar para mim. Só olha quando ela não está por perto. Quando o som dos beijos já se desvaneceu. Quando os passos deixam de se ouvir ao fundo do corredor e é seguro outra vez. Já não me pede os auriculares e deixou de se interessar pelo que eu estou a fazer. Do outro lado da sala, agarrado a ela, faz-me lembrar todos os rapazes que conheci na escola: distante, frio, convencido. Faz-me querer encolher-me e levantar-me da cadeira para lhe dar um murro, tudo ao mesmo tempo. Imagino a cena a acontecer e depois sinto vergonha de tudo: de querer estragar um relacionamento por causa de um capricho, de sonhar tantas vezes com os lábios dele nos meus, de sentir inveja dela... Sinto vergonha de ter saudades do toque dele no meu braço, quando me cumprimentou ontem. Sinto vergonha de ter saudades dos dedos dele a passearem na minha cintura e sinto pena de não ter retribuído. Sinto-me outra pessoa quando penso em mentir para chamar a atenção dele.
Sinto-me em chamas. Sinto-me cheia de frio. Sinto que uma chuva intensa está a cair sobre mim neste preciso momento.
_ O que é que tens?
Olho para o lado. A voz da minha amiga parece-me distante, mas depois lembro-me que ainda tenho de a ajudar e que não estou a fazer nada disso. Vejo-o com o braço por cima dos ombros dela e o meu mundo afunda-se novamente. Deixo de estar triste e começo a ficar furiosa.
_ Nada, estou bem.
Mas não estou. Quero dizer-lhe tudo o que tenho para dizer, quero colocar em prática todos os planos que me estão a surgir. Mas o braço dele continua nos ombros dela e eu tenho perfeito noção de que nunca vou conseguir o que quero, porque ela chegou primeiro e ele gosta é dela. Não de mim. Não de mais ninguém. Talvez nem goste dela. Talvez só lhe esteja a tocar porque é um rapaz e ela é uma rapariga e ele se sente atraído por raparigas. Talvez o facto de ele ter esperado comigo que a minha mãe chegasse, para eu não ficar sozinha, não tenha significado absolutamente nada.