Para que as boas apresentações se a contemplação carrega consigo a fatalidade de procurar a identidade do âmago? E ninguém aceitaria, de primeira, sangrar essa carne viva: o que - realmente - somos; pele demasiado sensível para estirar-se ao clarão fulgurante das inquisições. Aos bons frutos é dada a beleza de uma árvore; o deleite do sabor fica sagrado à singularidade de nosso paladar - e antes de doar-nos queremos já devorar, arrancar raízes inteiras.

Elo de confiança? Talvez; mas com isso, desconfiamos somente de nós mesmos (vultos estranhos do outro lado do espelho) - já que todos aceitamos figurar como exímios atores nesse imenso círculo universal; teatro de ensaios à cratera aberta no peito de nossas emoções. Uma deliciosa brincadeira de se esconder aceita por todos mas tomada como o mais sério dos silêncios interiores: somos esse grande paradoxo.

O que nossa razão busca invariavelmente saber do outro é justamente isso: quem de fato és, que lhe difere dos demais em essência; qual o teu segredo mais profundo, para que eu possa espelhar a face oculta dos meus próprios, como uma arte sutil, um jogo de mistérios sensuais inauditos - e com isso sentir-me vivo de novos sentidos e aprendizados -, nessa desvairada dança alquímica onde posso escorregar no abismo de tua intransponível unicidade. Para que eu saiba quem sou e saber se posso confiar-te um dia (o segredo) de minha história, que já é tua própria.

E eu sou todo âmago: desvendar-me em meras palavras é como me surrar delas próprias - o silêncio tem mais peso em mim que todas as vozes desse mesmo silêncio.

Meu nome está para a vida imprimido como a vida está para o meu nome imprimida: criatura-simbiose, criatura-mundo - essas eternas transmutações. Toda a beleza da borboleta, mas toda a transgressão da lagarta em antes se arrastar pela feiura do desconhecido - quão mais belo!

E essas tantas pessoas? Finalmente: são o impronunciável fascínio de sermos essas mesmas pessoas.
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