O Baile (Capítulo 3)

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     Ele deu um passo para trás, esfregando a mão na altura do estômago. Mikasu tinha mais fibra moral do que imaginara.
     -Acho que mereci o comentário.
     -De fato, não estrague a visão bastante heróica que tenho de você.
     Heróica? Por que razão ele sentia aquele calor no peito. Que valor poderia ter a opinião de um ômega qualquer? Mas e aquela luz guerreira nos olhos dele?
     -Desculpe, jovem Azrael. - fez uma mesura. - Fui mesmo muito atrevido. Ao perceber que ele baixara a guarda, Hidley esboçou um sorriso cativante. - Onde fica essa tal de Drillps que produz homens tão belos e tão  guerreiros? Deve ser um lugar de gente com coragem.
      Mikasu sorriu, não conseguindo resistir ao charme dele.
      -Pelo contrário. Dizem que esse nome foi dado muito tempo atrás quando um Alfa, acompanhado por todos os seus servos ômegas, adentrou o vale em um dia de inverno e o achou tão insignificante que, num gesto de zombaria, naquele mesmo instante o deu ao ômega menos importante de seu séquito.
      -Wow!
      Mikasu sorriu.
      -Ah, mas essa história não é a história toda. Quando o tal ômega voltou ao vale na primavera, ele ficou deslumbrado com o encanto e o perfume do lugar, cercado por milhares de roseiras selvagens, de algum modo cultivadas pelo vento e por tempestades. Receando que o caprichoso Alfa lhe tomasse o vale de volta, ele batizou sua propriedade de Drillpshold e o vilarejo que fundou ali de Drillps, ou a Cidade dos Espinhos. O Alfa nunca mais voltou ao lugar, por isso nunca ficou sabendo que havia dado ao menos qualificado de seus ômegas um dos lugares mais lindos da França.
     A expressão dele se transformou ao falar; os olhos se tornaram meigos e o tom de voz suave. Hidley estava extremamente cativado.
     -Belíssima história - disse ele em voz baixa para não quebrar a magia daquele momento.
     O olhar de Mikasu continuou perdido na distância.
     -É, sim. Eu costumava imaginar que era o príncipe do castelo de Drillpshold e, sempre que olhava da torre pela janela para um mar de rosas, jurava para meu amado marido que manteria o segredo para sempre.
      Hidley soltou uma gargalhada.
     -E se você não voltar mais a Drillpshold, será que o mar de rosas de Drillps vai secar?
      Ele riu, e Hidley movido por impulso, pegou-o pela cintura e o colocou sobre um banco.
      Meio cambaleante, ele protestou.
      -Lorde Suks!
      Assim que Mikasu se reequilibrou, Hidley o soltou e se curvou em uma reverência.
      -Oh, Príncipe das Rosas, sou apenas um humilde beta, desprezado pelo grande Alfa. Mas tenho um vale de rara beleza e coisas maravilhosas que só eu conheço. Abro mão desse vale, que fica obscurecido dianta de sua beleza, se você me honrar com seu amor!
      Mikasu o fitou com olhos arregalados e então um sorriso começa a brincar em seus lábios.
      -Quem é o senhor, gentil beta, que oferece um pedaço de terra com espinhos por um jovem marido?
      -Não é uma terra com espinhos, belo príncipe, mas sim o próprio jardim do Éden.
      Ele ergueu o queixo em desdém.
      -E nesse vale de rosas, sua intenção é que eu seja um príncipe ou um servo? Poderia pensar por minha própria cabeça, ou seria castigado por ser eu mesmo? - O olhar de Mikasu se tornou distante. - Teria de me manter oculto sob uma máscara feitas pelos outros?
      As palavras de Mikasu ressoaram dentro de Hidley. "Oculto sob uma máscara feita pelos outros". Sim, ele sabia muito bem o que aquilo significava.
     - Não - Hidley sussurrou. - Lá, meu príncipe reinará de fato. - Fingiu tirar alguma coisa do bolso do casaco e continuou:
-Ofereço-lhe apenas uma rosa de meu vale, pois uma centena de qualquer outra não conseguiria se igualar ao seu eterno esplendor.
     Uma expressão sonhadora tomou conta do rosto de Mikasu e ele repetiu baixinho:
     - Eterno esplendor... - Estendeu a mão para "pegar" a flor. Quando seus dedos se tocaram, Hidley teve a impressão de que alguma coisa de fato brotava entre eles.
     besteira. Em um gesto brusco, Hidley tirou a mão, fazendo com que Mikasu perdesse o equilíbrio. A sola do sapato dele escorregou no banco molhado de sereno, e mikasu caiu nos braços dele.
     Hidley o segurou com facilidade, fazendo-o perder o fôlego com a presteza de seus braços musculosos. Por um minuto Mikasu teve a sensação de que acabaria embaraçosamente estatelado no piso do terraço; no minuto seguinte duas enormes e firmes mãos o agarraram pela cintura e o apertaram contra o peito, mantendo-o somente com a ponta do dedo no banco. Hidley sorriu diante do espanto dele. Hidley o segurara com a facilidade de quem levanta uma flor - embora ele nada tivesse da leveza de uma flor.
     Mikasu deu-se conta, então, de que seu corpo estava tomado de calor intenso, de que seus nervos tiniam... De que se apossava dele um maravilhoso sentimento - sonhador, perigoso - que ele havia pensado ter banido de sua jovem mente para sempre.
     Quero pecar de novo... de novo... e de novo..
     Mikasu o empurrou um pouco, afastando-se do peito dele. Não quero me deixar levar por esses instintos animais. Serei...

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Caça Ao AlfaOnde histórias criam vida. Descubra agora