De novo dúvidas?! Ô porra!

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E aqui estou eu. Em uma aula de esgrima com o chalé de Ares. Bom, na verdade é uma luta, e não uma aula, mas também serve para aprender. Assim que derrubei Mark, seus irmãos aplaudiram e deram alguns gritos.
- bom, muito bom di Angelo! - disse Mark - mas me aguarde, haverá revanche!
- espero ansioso. - respondi provocativo. Mas, por um breve momento, meu sorriso virou uma careta de dor. Logo me recompús, não tinha vontade alguma de ouvir as piadas e o deboche das crias da guerra. Mark, assim como qualquer filho ou filha de Ares, não era exatamente o melhor em respeitar as regras do acampamento sobre não aleijar, Will certamente vai me olhar com aquela cara de "pare de se machucar seu merdinha!”, doce como sempre. Eu sabia que Will me tratava diferente das outras pessoas. Com os outros, Will era gentil, amigável, doce, sensível. Comigo ele era osso duro de roer, sarcástico, debochado, implicante, grosso, as vezes até irritado. Não estou dizendo que ele me trata mal, mas ele me trata como um amigo íntimo, que trocam implicâncias. A diferença é que as implicâncias dele eram um tanto quanto pesadas. Ou era apenas meu senso ruim para amizades, ou ainda o fato de eu ser emocionalmente frágil devido as minhas experiências passadas. Ou, ainda por cima, o amor que eu sinto por ele. Não é fraterno, é romântico. Eu procuro não criar expectativas com ele, mas não deixo de tentar captar alguma cantada ou flerte. Nunca aconteceu. Mas esquece!
Chego à enfermaria com uma perna sangrando, um ombro deslocado, algumas costelas quebradas e, possivelmente, com os pulsos inflamados. Até que não está tão ruim. Ledo engano, pelo menos, segundo a expressão de William A. Solace.
- meus parabéns - diz ele em um tom decepcionado - conseguiu piorar um dia que já está péssimo!
- desculpa, não foi a intenção. - respondi internamente magoado, mas evitando transparecer.
- é, mas fez! Acha que eu sou uma máquina eterna de cura?! Eu também me canso, di Angelo! E olha que não é nem meio-dia ainda! - bradou enraivecido - evite continuar se machucando hoje, pelo amor de Afrodite! Sabe como foi meu dia hoje?!
Will começou a tagarelar, esquecendo que eu meio que estava sangrando e todo machucado. Não me importei, ele precisa pôr pra fora às vezes também. Soube que teve que curar cinco filhos de Ares (me senti profundamente culpado por isso), mais três de Deméter, que haviam mexido com uma planta que não deviam, outros quatro indefinidos que chegaram hoje (feridos ou doentes devido à uma longa viajem até aqui), e que um dos principais remédios naturais para tratar feridas havia acabado, e ele teve que passar duas horas sendo comido por mosquitos para negociar com uma ninfa particularmente azeda do bosque para que fizesse o dito remédio para ele à um preço justo. Fiquei calado ouvindo e assentindo quando ele falava algo como "dá pra acreditar?” ou "isso foi desnecessário!”.
- enfim - falou ele - esse dia têm sido um completo drama! - Will foi à mini cozinha da enfermaria, encheu um copo com água e um pouco de açúcar e bebeu. Respirou fundo e voltou para o consultório. Foi aí que ele notou que eu ainda estava ferido.
- santos deuses, di Angelo! Por que não me lembrou que ainda estava machucado?! Venha cá, agora!
Obedeci prontamente, agradecendo por sua pergunta ter sido retórica. Eu sabia que Will precisava direcionar sua tensão e seu estresse para algum lugar, e era eu que desempenhava a função desse lugar. Em suma, eu era sim importante para Will, mesmo que como uma espécie de saco de pancadas verbais. É doído saber que essa era a minha serventia, mas eu não conseguia pensar em nada melhor para ajudá-lo. Minhas habilidades consistiam em lutar e ouvir (meus poderes não contam, nesse caso), então me contentava em usar a segunda com Will.
- da próxima vez, me lembre que está ferido. Eu tenho TDAH, esqueceu caralho? - ordenou, novamente. Will sempre me fala isso, e eu sempre digo que farei para logo depois ser hipócrita.
- ok - é só o que consigo responder. Uma enorme vontade de chorar me consome por dentro, mas me mantenho o mais firme possível. Penso que mesmo sendo grosso, ele se importa comigo.
- obrigado Will - falo após Will me deixar ir.
- sim sim, agora vaza! - nossa, que fofo.
Fui o mais rápido que pude para o 13. Entrei. Tranquei a porta. E desabei. Sem ombros amigos, sem consolo, sozinho de novo. Eu tento manter a esperança de que Will será um amigo duradouro, mas tenho momentos em que essa fé se esvai como água por um ralo. Me sinto cada vez mais cansado disso. Mas não sei o que fazer. Bom... Na realidade eu sei sim, mas isso destruirá o fato de que sou um herói:
Admitir o quão fraco eu realmente sou para alguém.

Descobertas inusitadas - solangeloOnde histórias criam vida. Descubra agora