𝚊 𝚏𝚞𝚐𝚊

77 11 50
                                    

𝟸𝟹 𝚍𝚎 𝚓𝚞𝚕𝚑𝚘 𝚍𝚎 𝟸0𝟷𝟼 

𝙷𝚘𝚛𝚊 0 𝚍𝚊 𝚟𝚒𝚊𝚐𝚎𝚖

𝚂𝙰𝙼𝙰𝙽𝚃𝙷𝙰 𝙷𝙰𝚁𝚅𝙸𝙲𝙺

Tudo começou com a minha mãe me tratando feito a Rapunzel a vida inteira.

Pra se ter uma ideia, eu jamais passei uma mísera noite fora de casa sem sua presença e, diferente de todo ser humano comum, sequer tinha um celular para chamar de meu até ano passado.

Depois de muita insistência, o que ganhei foi um tijolo horroroso, que nem imagino onde Gothel conseguiu, ainda sem conexão com a internet. Fui massacrada na escola e precisei me acostumar com os torpedos constantes de mamãe checando se eu estava viva.

Não tenho habilidades comunicativas, perfil em rede social ou permissão para sair de casa sem alguém de confiança — mas tenho dezesseis anos recém-completados e horário para ir pra cama.

A balança é apenas muito desigual.

No entanto, por incrível que pareça, não foi por isso que planejei fugir hoje. É claro que odeio ser a Rapunzel dos dias atuais, só que a minha rebeldia tem mais a ver com o desejo de entender melhor a minha história.

— Tchau, Sam-Sam! Feliz aniversário!

Eu viro no sofá para acenar para a minha tia, que carrega meu priminho no colo e a bolsa de bebê no ombro. Ela é uma das minhas parentes favoritas e sempre fala mal das doidices da irmã comigo.

Minha mãe se despede com um abraço e pede a Weston para abrir o portão.

O ferro pesado produz um ruído capaz de ser ouvido até da outra esquina. Somos as únicas tontas no bairro que possuem um maldito portão e MUROS em volta do terreno, apesar da região ser tão tranquila que nenhum dos nossos vizinhos segue o exemplo. Tenho certeza de que a maioria deles deve nos achar arrogantes ou suspeitas, e não julgo; eu também acharia. Jamais sou convidada para as confraternizações da minha faixa etária na rua e, mesmo se fosse, não é como se eu pudesse ficar fora até depois da meia noite — e, em dias de semana, o limite diminui para as dez.

Eu lanço uma olhada cuidadosa à Colin, afagando os cabelos da irmã gêmea dele em minhas pernas. O garoto retribui pelo canto do olho e finge prestar atenção no filme que termina na tevê.

Olho o relógio em meu pulso. É o artefato mais tecnológico que tenho, somente porque conta com um rastreador que manda a minha localização para mamãe vinte e quatro horas por dia, em tempo real.

Me pergunto se tanta perseguição não configura algum tipo de abuso do qual não estou inteirada.

Nove e cinquenta e um. Espio Colin mais uma vez e ele acena discretamente com a cabeça.

É hora do show.

— Mãe, podemos subir pro meu quarto um pouco? — Eu aumento o volume da voz para ser ouvida da cozinha.

Com meu grito, Amanda se assusta e ergue o corpo.

— Claro! — mamãe devolve, distante em meio à bagunça que sobrou da festa. — Querem que eu leve um pratinho de doces pra vocês?

Arregalo os olhos, travada. Sou horrível em me revoltar contra o sistema.

— Não precisa, Tara! — Colin assume o comando, sendo o meu completo oposto como sempre. No caso dele, o sistema não dá a mínima. Seus pais são os sujeitos mais negligentes que já conheci. — Vai ser bem rapidinho!

O Pior Segredo do AmorOnde histórias criam vida. Descubra agora