A paixão de 1985

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1985

Chishiya voltava para casa no final do dia, fazendo questão de assumir a postura de anjo.

- Boa tarde mamãe.

Proferiu entrando na casa e vendo sua mãe preparando os legumes do jantar na cozinha, a mesma o olhou e indicou que seu pai estava na sala.

Chishiya de início não entendeu muito bem o por quê de sua mãe parecer tão pálida ao vê-lo. Mas mesmo assim foi até a sala de encontro com seu pai. Shuntaro Hiso, pai de Chishiya estava sentado no sofá com a televisão ligada em algum programa religioso.

- Boa tarde papai.

Proferiu da mesma forma que fez com sua mãe, porém foi metralhado com um olhar de ódio de seu pai.

- Com quem você estava?

- Com o... Niragi.

O loiro odiava mentir para o pai, por isso achou melhor dizer a verdade, mesmo sabendo da opinião que seu pai tinha sobre o moreno.

- Já disse pra se afastar dele, é um pedaço de mau caminho, todo cheio daqueles piercings do diabo. Anda feito o próprio tinhoso.

Proferiu de forma rígida, Chishiya apenas assentiu e caminhou até as escadas, a caminho de seu quarto mas foi pego por seu pai.

- A conversa não acabou Shuntaro.

O velho tinha fogo nos olhos, o que causava muito medo no platinado. Poucas vezes via seu pai daquela forma.

- O pastor veio aqui hoje me contar que viu você de papinho com o tal Niragi e ainda por cima que estavam quase se beijando! que absurdo! Meu filho beijando um homem? Sabe o quão envergonhado fiquei?

O velho cuspia as palavras na cara de Chishiya com ódio, enfatizando algumas palavras, a mãe do platinado queria proteger o filho, mas não pode fazer muito.

- O senhor e ele estão imaginando coisas, o Niragi só estava limpando meu rosto quando me sujei de sorvete...

Acovardado, Chishiya proferiu tais palavras que só serviram para aumentar a ira de seu pai.

- Não defenda ele!

O grisalho não hesitou em estapear o rosto do filho, deixando uma marca vermelha.

- Querido já chega!

A doce mulher gritou da cozinha, voltando toda a atenção para si. Nesse momento Chishiya se soltou do pai e correu pelas escadas até seu quarto, trancando a porta atrás de si.

Sua respiração estava desajeitada, se apoiava na porta para não cair. Nunca havia sentido nada igual, a sensação era única. Afinal, como seu pai iria reagir soubesse do seu amor pelo moreno? Que almejava beijá-lo? Tocá-lo?

De repente, quando já havia se acalmado, ouviu algumas batidas na janela. De início se assustou, mas, uma coragem súbita lhe veio e, ainda que tremendo, se dirigiu até a janela e abriu a mesma em um ato quase instantâneo.

Rapidamente uma figura escura entrou para dentro do quarto. Chegando mais perto, Chishiya percebeu ser o assunto de antes, o ódio de seu pai.

Suguru Niragi.

- O que você tá fazendo aqui?!

- Eu tava passando pela rua e resolvi te fazer uma surpresa.

O mais alto sorriu, sentando-se na cama do loiro que sorriu pequeno de volta, mas, parecia apreensivo, talvez estivesse com medo, o tempo todo desviava o olhar para a porta.

- Tem alguma coisa acontecendo Chishiya?

A expressão de Niragi havia mudado, agora estava sério e preocupado com o platinado, o outro embora estivesse com medo, tentava sorrir para mostrar que estava tudo bem. Tudo mentira.

Após mais insistências do moreno, Chishiya finalmente lhe contou o que havia acontecido e o que seu pai lhe disse. Ao mesmo tempo que parecia confuso, estava levemente irritado com o velho.

Niragi bateu duas vezes em sua coxa indicando que queria que o platinado sentasse ali. Hesitante, o loiro consentiu, se sentou em seu colo timidamente, recebendo um abraço do moreno.

Surpreso, o platinado retribuiu o ato repentino, apoiando a cabeça no ombro do mais alto, sentindo as mãos grandes passearem por suas costas em uma forma de carinho. Niragi queria acalmar o outro de alguma forma, aquele toque tão amoroso fez o loiro querer chorar. Nunca havia sentido que realmente era amado, nem por seus pais, se aquilo fosse algum tipo de sonho ou alucinação, não desejava acordar.

Toda sua infância foi rodeada de bíblias e regras loucas que ele sinceramente nunca entendeu ou quis seguir, sempre pensou que devia amar quem quisesse, e não alguma menina qualquer. Queria alguém que o fizesse feliz, e se a pessoa fosse um garoto, não iria reclamar.

Assim que conheceu Niragi, seus padrões mudaram totalmente. O moreno era tão... Confiante. E isso fez Chishiya pensar, no início, que queria ser como ele, mas, com o tempo percebeu que não queria ser como ele, queria ele.

O loiro não se denominava exatamente gay, ele só queria amar e ser amado, independente da pessoa ou gênero.

Já Niragi cresceu sem uma figura materna, sua mãe havia morrido no parto. Cresceu com seu pai, que não era bem ruim, apenas quando bebia demais. Algumas cicatrizes o moreno tem até hoje e sabe contar perfeitamente como as conseguiu. Seu pai sempre fumou, bebeu, e quase todo fim de semana levava algumas mulheres para sua casa.

Desde pequeno Niragi foi incentivado a ser um mulherengo, porém o moreno adquiriu todos os vícios do pai, menos esse. Nunca sentiu nenhum tipo de vontade romântica ou sexual por alguma mulher. Não tinha certeza se era porque nunca tinha se relacionado com uma ou algo assim. Mas assim que conheceu Chishiya ele soube que não importa se fosse homem ou mulher, ele não queria ninguém além do loiro.

Querendo ou não, ambos eram o porto seguro um do outro, e não queriam se separar.

batidas fortes foram ouvidas, seguidas de alguns chutes na porta, o loiro, assustado, se levantou do colo do outro, sinalizando para o mesmo sair imediatamente, mas Niragi não o fez. Ambos ficaram em silêncio, quando a voz da mãe de Chishiya foi ouvida aparentemente acalmando o marido, por fim as batidas e chutes cessaram. Chishiya respirou fundo, se recuperando do susto.

- A gente podia ter se dado realmente mal! 

Chiou o platinado, indignado com o fato do outro estar rindo da situação.

- Mas não aconteceu nada.

Niragi sorriu, o platinado parecia mesmo zangado. O mais alto apenas deixou um rápido beijo na bochecha do outro, indo em direção a janela e pulando. Assustado, Chishiya nem deu atenção ao beijo, apenas correu para a janela para checar o outro, que acenava lá de baixo.

O moreno mostrou a língua de forma zombeteira e Chishiya logo fechou a janela. Foi ai que ele se deu conta do pequeno ato de Niragi antes de pular a janela. Passando a mão no lado que havia sido beijado de seu rosto, o platinado se deitou e adormeceu.


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I Told Sunset About YouOnde histórias criam vida. Descubra agora