Sem Brilho

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"O sol então perdeu seu brilho quase que completamente, o dia passava frio e escuro. Separado de sua amada lua, o sol já não via mais sentido em continuar a iluminar o mundo"

*

1985

O mar púrpura a sua frente era calmo, quase não se notava a correnteza. Não era fundo, a altura dava em sua canela.

O loiro olhou em volta por um tempo ainda sem entender como havia ido parar ali, mas quanto mais olhava mais daquele líquido roxo via. Não haviam ilhas, não haviam animais, nada.

Era o vazio, o nimbo, apenas ele, aquele mar roxo e o céu azulado.

Chishiya respirou fundo e começou a se mover, caminhava por horas, talvez dias, talvez não tenha passado nem um minuto. Caminhava, caminhava, caminhava e caminhava, mas não havia nada ali, era realmente só ele e o nada.

Um aperto fundo pairou sobre seu coração, dúvida, medo, angústia, confusão. Ele não sabia como havia chegado ali, teria morrido? Aquilo era o inferno?

Parecia bonito demais para ser o inferno, além do mais, onde está o diabo?

Voltou a caminhar, afinal não tinha muito o que fazer além disso.

*

Niragi corria desesperadamente subindo as vastas escadas até o quarto onde Chishiya estava, sua respiração desigual, o corpo clamava por descanso, suor escorrendo por sua testa e o cabelo bagunçado.

Ele queria gritar pelo loiro, queria abraçá-lo, ouvir seu desabafo, dar seu ombro para o mesmo chorar, ele queria, mais que tudo ele queria.

Prosseguiu quase sem forças a subir aquelas escadas até chegar no corredor do quarto, abriu a porta com tudo respirando ofegante.

Seu coração deu um pulo e quase parou quando viu o loiro, deitado naquela cama de hospital, de frente para uma grande janela de vidro, de onde o pôr do sol podia ser visto. Nem mesmo inconsciente perdia sua beleza, os longos fios loiros se espalhavam de forma artística pelo travesseiro em baixo de sua cabeça, os cílios belos bem a mostra. Um cobertor branco cobria seu corpo e em sua veia havia uma agulha, passando para o mesmo os nutrientes que perdeu em todo esse jejum doentio.

Ao lado dele estava sua mãe segurando com carinho a mão direita do filho, e bem do outro lado da sala, num canto escuro, estava Hiso, com os braços cruzados e cara fechada. Assim que viu o moreno na sala automaticamente o velho grisalho entrou em alerta. 

- Como ousa vir aqui garoto insolente! A culpa do meu filho estar assim pra começo de conversa é sua!

Exclamou com ódio, a mulher que antes segurava levemente a mão do filho agora apertava com força os dedos finos do mesmo.

Niragi permaneceu em silêncio, se confrontasse Hiso poderia diminuir o tempo que tinha ao lado de Chishiya.

O boato já havia se espalhado pelo lugar, todos sabiam do estado de Chishiya mas ninguém se ofereceu para ajudar, apenas falar pelas costas e aumentar algumas partes da história. Então foi fácil para Niragi saber o que estava acontecendo. Mas com a distancia entre os dois, não pode fazer muito para ajudar o loiro.

- Oi... Me desculpa por não estar lá...

Falou quase num sussurro porém em um tom delicado e doce, como sempre fazia, sorrindo melancólico enquanto tirava com cuidado os fios perdidos em seu rosto. 

Chishiya estava desacordado, de acordo com o médico, anêmico. A falta de nutrientes fez com que o corpo enfraquecesse e o esforço feito para caminhar até a igreja havia esgotado ele. 

O moreno continuou na sala por alguns minutos, acariciava o rosto pálido do loiro, mexia em seus cabelos, até chegou a deitar, com bastante cuidado, sobre Chishiya, abraçando seu corpo junto a si.

Imaginava se poderia ver o loiro de novo, se depois daquilo ainda iria poder olhar o rosto do outro, sentir o abraço quente dele, limpar seu rosto sujo de sorvete.

Ele queria voltar no tempo, pra época em que ambos jogavam juntos, riam e eram felizes. Parte da culpa daquilo tudo acontecer era realmente sua, como Hiso disse, se não tivesse o levado para a sorveteria, limpado seu rosto, talvez...

Agora era tarde demais, nada mudaria o estado atual de Chishiya, nada mudaria sua distância com o loiro, nada nem ninguém iria aparecer para salvar ambos daquele inferno na terra.

Com medo de nunca mais ver seu amado, Niragi olhou bem o rosto do mesmo, observou cada detalhe, na tentativa de não esquecer nunca a face daquele que amava.

Só então, se despediu da mãe de Chishiya, a mulher sorriu para o mesmo e murmurou algo que soou como "desculpe", e então o moreno saiu.

Desceu as escadas melancolicamente, atravessou a rua e fez seu caminho até sua casa.

*

O tempo não passava, Niragi observava o relógio de ponteiros emitir sons de tic tac em um looping sem fim.
Sentia seu estômago revirar de ansiedade, suava frio, queria chorar, o gosto amargo permanecia ali em sua boca. Ele disse para si mesmo que iria superar aquela distância e que era o melhor para ambos, mas não tinha notícia de Chishiya, não sabia se estava bem, se havia acordado, apenas sua mente o torturava criando imagens sem nexo quase reais onde o loiro estava morto.

Caminhava de um lado para o outro sem saber exatamente o que fazer, afinal nada podia mudar aquilo não é? Não havia nada que ele poderia fazer.

O loiro agora estava sentado sobre o mar roxo com os braços apoiados nos joelhos chorando...?

Ele não sabia chorar.

Ele tentava, tentava muito chorar, mas parecia que não tinha nada em seu corpo, sentia que era uma casca vazia.

Mas ele tinha sentimentos, ou melhor, apenas angústia. Não lembrava seu nome, nem quem era, nem quem conhecia, onde vivia, quem eram seus pais.

Apenas sentia que precisava voltar para algum lugar.

Para alguém.

I Told Sunset About YouOnde histórias criam vida. Descubra agora