#𝗲𝘀𝗽𝗮𝗱𝗮𝘀 𝗲 𝘁𝗿𝗮𝗽𝗮𝗰̧𝗮𝘀 🧪

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NÃO ME ATREVI A MEXER UM MÚSCULO.

Tinha um tempo que estava ali, sentada com a cabeça dentre os joelhos, no centro da cidade, encolhida em meu moletom; a ventania estava forte.

As imagens de minha casa completamente vazia, sem nenhuma iluminação - porém ainda completamente arrumada, como se não tivesse sido sequer tocada - se repetia em minha mente, mais vezes do que poderia ser considerado normal.

Como previ, anoiteceu e a cidade se tornou um poço de escuridão após os postes de energia não ligarem; ainda sim, conseguia enxergar minimamente diante de todo breu.

Evitava pensar em qualquer coisa que não fosse onde eu passaria a noite ou o que comeria, porque a barrinha de cereal e o chá de mais cedo não estavam me sustentando a esse ponto.

Além do que, se eu cogitasse a ideia de pensar em Kazumi ou Elisa - Ren não fazia parte dessa lista, já que sempre foi um pé no saco, e nem o fim do mundo poderia mudar isso - pequenas lágrimas se formavam no canto do meu olho, e eu não suporto a ideia de chorar.

Suportava a pequena e irritante dor no meu peito, assim como também aguentava a respiração falha pelo nervosismo - digamos que a realização de ter perdido tudo não era uma das melhores - mas não suportava chorar.

Sempre foi assim, me lembro, e foi mesmo. Desde pequena, soltar as angústias em forma de lágrimas não era muito agradável com um irmão intimidador e mais velho por perto. Apanhar de Ren também não era um dos meus hobbies favoritos então, quando queria chorar, apenas fechava os olhos com força, até a sensação passar.

Podia durar um tempo, mas passava. Tanto faz se era um joelho ralado que estava muito feio, ou uma briga com uma amiga na escolinha, mas uma hora ou outra, acabava passando. Foi ai que aprendi que, nenhuma dor, nenhum machucado era para sempre.

Cresci assim, com essa ideologia, e por um tempo, ela durou. Até meus dezesseis anos para ser mais exata, onde vi meu pai sair com suas malas pela porta de frente de casa. A última imagem que tive dele foi um sorriso quebrado em seu rosto repleto de hematomas, mas na época e na minha mente, a cena estava muito mais bonita, e não havia sangue nenhum escorrendo de seu lábio cortado.

Eu esperei a dor passar. Eu não chorei. Eu fechei os olhos com força, até mesmo de baixo do chuveiro, onde não havia irmão mais velho para me encher de porrada. Mas por algum motivo, a dor não passou.

Continuou ali, como um buraco em meu coração, formando teia de aranhas e trepadeiras, mas nunca indo. Permanece aqui, até hoje, mesmo depois de malditos três anos.

— Tsc. É só um deslize para ficar toda emocional. — Murmuro, reclamando de todo o abalo moral em minhas ideias, a voz um pouco falha.

Balanço a cabeça, espantando qualquer pensamento e volto a enterrar a cabeça sobre meus joelhos. Por mania, pego meu celular, e bufo em frustração ao constatar - novamente -  que ele não estava funcionando.

É claro que não está, gênio.

Eu me levanto, esfregando a palma de minhas mãos contra o tecido grosso do jeans da calça afim de espantar o frio e olho ao redor. Se era somente eu e estava tudo vazio, não seria um problema pegar comida de alguma lojinha ou algo assim.

Eu não teria que pagar mesmo..

Porém, antes que pudesse começar a impulsionar o skate - que serviu de distração para mim durante esse meio tempo - uma luz branca invade meus olhos com tanta intensidade que tenho que piscar algumas vezes para enxergar melhor.

Me viro em direção ao clarão, confusa ao finalmente ver algum sinal de civilização somente agora, afinal, horas haviam se passado. Era um prédio, daqueles grandes e que faziam-se propagandas nas partes externas - exatamente como agora.

CHEATER:; alice in borderland - chishiyaOnde histórias criam vida. Descubra agora