Auroras and sad prose.

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Era uma manhã qualquer de primavera quando Gerard estacionou seu carro próximo à casa de campo, hoje abandonada, onde sua família costumava passar os fins de semanas ensolarados para aproveitar o tempo livre que possuíam. O rapaz de cabelos negros e longos à altura dos ombros demorou alguns minutos para ter a coragem de deixar o veículo, observando, ao longe, o lago cuja superfície brilhava ao ser beijada pelo sol.

"Era um dia parecido como esse", pensou Gerard com um leve sorriso desenhado nos lábios ao sair do carro. Não se importava em levar qualquer pertence consigo, ou em dar o mínimo de atenção que fosse para a casa construída no estilo cabana que outrora costumava ser o seu ponto de felicidade. Então, traçou o seu próprio caminho rumo ao lago, passando pela grama alta e levemente molhada pelo orvalho que ali ainda estava.

Seu corpo moveu-se quase que de forma automática, reconhecendo cada relevo do terreno desnivelado, até chegar ao banco que havia à sombra de um enorme carvalho branco e ali se sentou, inspirando o ar puro que o ambiente proporcionava. Olhou para o local ao seu lado no banco, onde havia espaço suficiente para outra pessoa se acomodar, e direcionou o olhar mais uma vez para o lago, permitindo que as memórias daquele lugar inundassem sua mente, o deixando quase em um transe.

"Eu deveria ter uns 8 anos", pensou. E como se fosse um filme, pôde ver o seu eu de 8 anos jogando pedras na água, com a intenção de fazer elas quicarem e irem o mais longe possível.

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— Assim você não vai conseguir nunca — disse um menino de pelo menos 10 centímetros a menos que Gerard, com parte do corpo escondida pelo carvalho. — Você precisa inclinar as pedras antes de jogar para fazer elas saltarem — continuou o garoto baixinho e de cabelos negros ondulados, com seus olhos castanho-esverdeados brilhando pela empolgação.

Ainda um tanto assustado e confuso com a presença repentina do outro garoto, o pequeno Gerard seguiu o conselho e atirou a próxima pedra, assim como o menino havia orientado. Ao ver a pedra ir longe, pulando sobre a superfície da água, abriu um enorme sorriso.

— Como você sabia? — Gerard virou animado para o menino que acabara de conhecer, sorrindo para aquele que iria se tornar o seu melhor amigo e companheiro inseparável a partir daquele dia.

◆◆◆

Desde então, Gerard e Frank, como mais tarde se identificou o menino baixinho de olhos esverdeados, passaram a encontrar-se sempre que o mais alto visitava a casa de campo de seus pais, tendo a sorte de ter Frank como o seu vizinho naquele local. Os finais de semana eram sagrados para os jovens amigos, que sempre estavam juntos brincando de alguma coisa sob a proteção do grande carvalho branco.

Um dia receberam um banco de madeira dos pais de Frank, que estavam cansados de ver o filho sempre voltar com a roupa suja da terra ao redor do lago. O banco foi colocado embaixo daquele mesmo carvalho; era onde onde o Gerard atual de 32 anos estava sentado, com os olhos fixos na água cintilante, rindo levemente com a lembrança.

Foram incontáveis encontros à beira daquele lago, que acompanhou todo tipo de brincadeira possível, discussões sobre o que iriam brincar naquele dia, e bronca dos pais dos garotos, que insistiam que estes voltassem para casa ao anoitecer, após passarem o dia todo juntos.

◆◆◆

Os anos se passaram e a amizade que existia entre Frank e Gerard se tornou inabalável. Os dois se entendiam sem precisar dizer sequer uma palavra, como se fossem capazes de manipular algum grau de telepatia. Eram basicamente almas gêmeas, como a avó de Gerard comentou certa vez. Almas gêmeas não precisam necessariamente ser de cunho romântico, certo? Certo, mas isso não se aplicava aos dois.

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