Minha versão (em alguns capítulos) do início de Court of Silver Flames, até o momento em que Nestha e Cassian chegam aos acampamentos illyrianos.
O vazio deixado por Elain era uma reflexão perfeita de como Nestha se sentia por dentro. Ela podia jurar que uma parte de si fisicamente se protegeu das palavras de sua irmã - talvez alguma migalha de auto preservação que havia sobrevivido aos meses de maus tratos e negligência.
Nestha sempre fora negligente. Com todos ao seu redor e principalmente consigo mesma.
A sensação dos ossos próximos demais à pele eram prova disso. A pele pálida e retraída também. Elain não estava errada ao apontar seu estilo de vida destrutivo e sem propósito.
Ela mal lembrava a última vez que havia lido um livro.
Mas quem era Elain para julgar? Quem era qualquer um deles para julgar?
Todos ali haviam passado por situações devastadoras demais para colocar em palavras. Todos tinham suas cicatrizes. E a maioria havia tido séculos para se recuperar, para se entender. Por quê então ela era a única que precisava se recompor em meses? Por quê devia a sua família uma fachada perfeita e recuperada de horrores inimagináveis?
Sim, ela estava quebrada.
Mas não estava pronta para se reerguer - ela não sabia se um dia estaria. E isso não era problema de ninguém a não ser dela mesma.
E Nestha estava cansada. Tão, tão cansada.
E encarar a ferida aberta pelas palavras de Elain demandaria um esforço hercúleo que ela não estava disposta a ter.
Por isso pegou seu casaco - sem se importar muito com as roupas ou seu estômago roncando de fome - e rapidamente ajeitou seu cabelo.
Nestha fechou a porta atrás de si com força, e se dirigiu ao seu bar favorito.
---------
O som de risadas altas, canecas de cerveja batendo em mesas, e jogos de cartas atingiram os ouvidos de Nestha muito antes dela entrar no estabelecimento sujo e escuro onde passava a maioria das suas noites.
"O de sempre," ela pediu ao se sentar no balcão central que dominava a maior parte do ambiente. À sua direita, um feérico alto e musculoso - atraente, se ela fosse sincera consigo mesma - acenou por cima do seu copo.
Nestha não retribuiu, e virou para o outro lado, onde havia somente um banco vazio.
Enquanto sua bebida não chegava, ela tomou alguns minutos para observar os machos e fêmeas dispersos ao redor do balcão. Amigos discutindo planos futuros para o solstício. Grupos de jogadores apostando - e perdendo. Algumas almas solitárias como ela mesma, pensativas enquanto comiam um prato de comida quente. Casais aconchegados nas mesas dos cantos em níveis diferentes de intimidade, o cheiro de suor e sexo presente no ar.
E embora pudesse sentir aromas, sons e gostos, Nestha se sentia removida de tudo. Como se estivesse olhando através de uma fina membrana preta e branca.
De um lado, o abismo que a consumia.
Do outro... vida.
Era assim que seria o resto da eternidade? Ela passaria milênios como um receptáculo vazio, abrigando dentro de si um verme que a devorava pouco a pouco, até que não sobrasse mais nada?
Foi para isso que ela lutou?
Foi para isso que seu pai morreu?
A bebida de Nestha não fez nada para adocicar o gosto amargo que havia ficado em sua boca após a visita de Elain. E embora sua irmã já estivesse longe e provavelmente cuidando do seu jardim na enorme mansão à beira do Sidra, Nestha podia ouvir suas palavras como se estivesse ao seu lado.
YOU ARE READING
Silver and flames - uma coletânea Nessian
Roman d'amourHistórias curtas sobre Nestha e Cassian que se passam durante (ou após) A Court of Silver Flames. Arte da capa: emmilinne (tumblr)